Entrevista 2 - Optar entre soja e dendê para biodiesel faz diferença "colossal", alerta Sachs

28/10/2007 - 18h51

Luana Lourenço
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - No segundo trecho daentrevista à Agência Brasil, o economista IgnacySachs defende que no Brasil, como nos outros países, ocrescimento econômico tem de ser aliado da sustentabilidadesocial e ambiental.Sachs se afirma favorável àprodução dos biocombustíveis a partir daagricultura familiar e avalia que há “diferençascolossais” entre o modelo que opte pelo dendê e o que sebaseie na soja, por exemplo. Para ele, o Estado precisa definircritérios e políticas que empurrem a atividade no rumo“virtuoso” e não no “perverso”.AgênciaBrasil: Em países em desenvolvimento, como o Brasil, ocrescimento econômico pode ser aliado de medidas socialmentesustentáveis? Ignacy Sachs: Tem que ser. Nãoé possível continuar crescendo aqui de maneira amarginalizar ainda mais os agricultores familiares, por exemplo. Nóstemos que nos dar conta que há dois grandes desafios aenfrentar: as mudanças climáticas e o déficitcrônico de oportunidades de trabalho recente. E nãopodemos nos dar o luxo de sacrificar um no altar do outro.ABr: Comoenfrentar esses desafios no caso brasileiro?Sachs: Porexemplo, sou muito favorável à produçãodos biocombustíveis a partir da agricultura familiar, mas nãoposso perder de vista o fato de que é bem possível queisso caminhe pelo caminho oposto, via produção a partirda soja, e não de dendê, por exemplo. As diferençassociais seriam colossais. Portanto, no momento de definir planos, detomar decisões, cabe ao Estado definir critérios eadequar instrumentos de políticas públicas que empurrema coisa no caminho virtuoso em vez de deixar que se façam nocaminho perverso.ABr: Como ogoverno brasileiro está se saindo nesse contexto?Sachs: A posiçãodo governo me parece positiva, mas é preciso botar o bloco narua. A mensagem é essa: já que se quer realmentecaminhar no bom caminho, é preciso não perder tempodemais, porque os outros, aqueles que preferem o caminho perverso,estão atrás de uma oportunidade econômica enorme.O problema vai se definir nos próximos anos.ABr: Oempresariado vem demonstrando um empenho cada vez maior nodesenvolvimento sustentável. Há outros tipos deinteresse por trás?Sachs: Primeiro, há umacerta distância entre o discurso e a realidade. Segundo,empresas que pensam em longo prazo deveriam considerar seriamentetanto a dimensão ambiental quanto social porque o seu negóciopode, da noite para o dia, periclitar [estar em perigo] tantopor uma quanto por outra causa.Para as empresas quedependem, por exemplo, de abastecimento de madeira, a existênciade um poderoso movimento dos sem-terra não pode nãomudar a maneira de pensar deles; e não é por acaso que,quase todas as companhias de papel e celulose no Brasil estãohoje se abrindo à idéia de contratos de fomento aospequenos agricultores familiares. Mesmo que não sejamais barato, a questão é ponderar os riscos de umaexclusão social, por exemplo. Portanto, uma empresa que quertrabalhar no longo prazo tem que cuidar de evitar riscos ambientais esociais que podem comprometer seu trabalho. Há um raciocíniode compromissos. Fora isso, pode haver certo compromisso como futuro do país, com o futuro da nação; nãovamos simplificar os problemas tratando as empresas como "feras".É óbvio que no Brasil a gente tem que abrir a discussãocom as empresas e testar até onde elas estão dispostasa ir na boa direção. É preciso utilizar as trêsferramentas: incentivos fiscais, medidas administrativas e o diálogo.ABr: Épossível falar em perspectivas para concretizaçãodessa proposta de desenvolvimento que contemple as trêsdimensões – social, ambiental e econômica?Sachs: Em algunslugares, em alguns momentos, isso já está acontecendo;não é uma visão puramente abstrata. Nãodá para ter esse nível de generalidade e dizer:acontece ou não acontece. São diretrizes a partir dasquais a gente deve analisar situações concretas e quasesempre se chega à conclusão que não existe pretonem branco, existem inúmeras quantidade de matizes cinzentas. Essa é a realidade.Leia o primeiro trecho da entrevista.