José Carlos Mattedi*
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O apelo a organismos internacionais por parte das comunidades indígenas, para chamar a atenção para problemas com o Estado brasileiro, é um recurso “legítimo”, na avaliação do ativista Ailton Krenak. “É uma pena que o governo brasileiro ainda fica na dependência de pressões internacionais para se manifestar em favor dos povos indígenas”, diz ele.
Ailton Krenak ficou conhecido nacionalmente durante a Assembléia Constituinte que elaborou a Carta Magna de 1988. Ele foi um dos principais articuladores em torno das propostas que ampliaram os direitos indígenas. O ativista cita os casos das lideranças indígenas da terra Raposa Serra do Sol, em Roraima, cujas lideranças buscaram a Organização dos Estados Americanos (OEA), os fóruns da Organização das Nações Unidas (ONU) e as entidades civis internacional para “denunciar a falta de cumprimento dos acordos internacionais e até da legislação brasileira”.
A liderança indígena diz, na verdade, lamentar que o recurso a autoridades externas seja necessário. “É triste ter que recorrer a organismos fora Brasil, quando a solução está aqui”, diz ele. Ao mesmo tempo, Krenak critica os que acreditam que essa abertura internacional favoreça a intromissão de estrangeiros nos assuntos internos do país. “Essa idéia é pura maldade. O povo indígena tem alertado a brasileiros e estrangeiros que a terra tem limites, e que os brancos precisam aprender a respeitá-la. O dano ambiental, social e cultural vai colocar todos ao lado da dor e do sofrimento.”Ailton critica o atual governo, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Diz que espera um tratamento melhor aos povos nativos no segundo mandato. “Não temos uma palavra do Lula sobre o que o Estado brasileiro quer fazer com as comunidades e territórios indígenas, que tipo de apoio o governo vai dar e como desenvolver essas regiões sustentavelmente.”
Ele denuncia, também, a falta de empenho do Congresso na defesa dos interesses indígenas. As comunidades dependem de “relações de simpatia do parlamentar com alguma demanda regional” para resolver seus problemas, o que acaba impossibilitando trabalhar a questão indígena de forma nacional. “O assunto é sempre muito regionalizado”, pontua.
Krenak reclama, ainda, que o projeto do Estatuto das Sociedades Indígenas está parado no Congresso desde o início dos anos 90. Segundo ele, nem o Legislativo nem o Executivo tiveram a “sensibilidade” para regulamentar essa lei, que busca melhorar a participação indígena na proposição e na execução das políticas públicas. “Como nada foi feito, continuamos excluídos dos processos de decisão sobre o desenvolvimento do país.”
Para o presidente da FundaçãoNacional do Índio (Funai), Márcio Meira, não há problema na busca dos índios porapoio internacional. “Os povos indígenas, como qualquer setorda sociedade civil, têm o direito de procurar todos os meios paragarantir seus direitos. Dentro da lei, não há problema nenhum", diz ele. "Numasociedade democrática, o movimento social tem autonomia para buscarapoio e reconhecimento com vários parceiros, inclusive internacionais.A Funai, como órgão do estado, deverá dialogar com esses povosrespeitando sua autonomia.”
Segundo Meira, a regulamentação do Estatuto das Sociedades Indígenas também é uma preocupação do órgão. Ele diz que pretende trabalhar junto com as lideranças indígenas para que o documento seja aprovado no Congresso. “A regulamentação é necessária. A Constituição de 88 avançou muito em relação aos direitos indígenas, mas nós precisamos da regulamentação. A Funai está atenta.”
*a partir de entrevista a Beth Begonha e Spensy Pimentel, no programa Amazônia Brasileira, da Rádio Nacional da Amazônia