Flávio Dieguez
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Professor na Universidade de Campinas (Unicamp), o pernambucano Ricardo Carneiro comanda o Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon), vinculado à instituição. Nessa função, vem analisando o desenrolar da economia brasileira ao longo dos primeiros quatro anos de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Antes, já havia analisado a conjuntura econômica brasileira, na função de coordenador do programa econômico do então candidato Lula, em 2002.O trabalho na Unicamp permitiu a Carneiro reunir artigos de diferentes pesquisadores no livro A supremacia dos mercados e a política econômica do governo Lula, publicado pela Edunesp. Por telefone, Carneiro concedeu esta entrevista à Agência Brasil para comentar as perspectivas para os próximos quatro anos de governo Lula. Carneiro considera que em sua campanha à reeleição, Lula voltou a selar um pacto social pelo desenvolvimento. Mas vê um cenário externo pior para que o Brasil realize a promessa de crescimento. Para enfrentar esse novo desafio, o economista acredita que será necessário que o governo federal aposte no fortalecimento do mercado interno.Agência Brasil: Que impacto você espera que esse livro tenha?Ricardo Carneiro: O livro levanta um conjunto de questões substantivas, faz uma avaliação do governo Lula na área econômica, e, até certo ponto, faz uma contraposição entre o governo do presidente Lula e o segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O livro aponta alguns avanços, várias limitações e, sobretudo, discute quais são as condições de sustentabilidade desses avanços.ABr: Os autores dos livro, você inclusive, já diziam que havia limitações, e elas são bastante aceitas. Foi uma vitória?Carneiro: Eu acho que a vitória dessas idéias – que são mais desenvolvimentistas, propunham melhor distribuição de renda e crescimento mais rápido – essas idéias, na verdade, são vitoriosas desde a primeira eleição do Lula. Mas não foram postas em prática por dificuldades políticas. Então eu acho que do ponto de vista político, como ficou manifesto nessas eleições, essas idéias têm sido vitoriosas. Mas eu vejo uma dificuldade muito grande para que elas sejam implementadas.ABr: E essa dificuldade persiste?Carneiro: Talvez até o próprio presidente tenha se comprometido mais explicitamente com essas idéias, agora. Agora, eu acho que vai ter que mudar a política do Banco Central, a política de juros. Essa mudança pressupõe um rearranjo na diretoria do banco, não necessariamente na presidência do banco. O problema é até onde o governo aceita esse rearranjo.ABr: A ativação do mercado interno parece ser importante. Você acha que ela está assegurada?Carneiro: Ela é importante e será até mais importante no segundo mandato do governo Lula. Porque é muito provável que não se reproduza o cenário internacional positivo que nós tivemos no primeiro mandato. A taxa de crescimento do comércio entre as principais economias deve ser muito menor agora do que foi nos três últimos anos. Isso significa que, para crescer, vai ter que contar mais com o setor interno e menos com o externo.ABr: Você está pessimista?Carneiro: Eu não sou pessimista, porque a renda per capita média no Brasil é mais alta que a de vários países asiáticos, do que a da Índia, do que a da China. É bem mais alta. O problema é que ela é muito mal distribuída. E (para mudar isso) depende de ter uma política de crescimento, de infra-estrutura urbana, de infra-estrutura social, de ampliação do salário mínimo e da reforma agrária, do conjunto dos programas sociais. Você tem que acelerar a taxa de crescimento. Se o Brasil crescer 5% nos próximos 4 anos, com esse perfil de política social, eu acho que nós faremos um crescimento com a distribuição de renda muito interessante.ABr: O fato de a inflação estar muito baixa é defeito ou virtude?Carneiro: Eu acho que é claro que foi mais um defeito. Essa inflação muito baixa é o resultado de você ter abortado o crescimento (no final de 2004) quando a economia estava crescendo na faixa dos 4,5% a 5% ao ano. Foi um excesso de zelo, um equivoco do Banco Central. Em relação a uma eventual subida da inflação, o que ele fez? Subiu de uma forma absolutamente despropositada a taxa de juros.