Decisão da Bolívia pode prejudicar relações com o Brasil, avalia professor da UnB

02/05/2006 - 13h57

Keite Camacho
Repórter da Agência Brasil

Brasília - A nacionalização das refinarias de petróleo e gás na Bolívia podem gerar um prejuízo nas relações entre o Brasil e aquele país. A opinião é do professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Antônio Carlos Lessa. "Essa situação é extremamente grave e muito delicada. Não acredito que o governo boliviano volte atrás na sua decisão, inclusive porque foi marcada por gestos de violência. Se o governo estivesse realmente disposto a negociar, isso teria sido feito antes", disse.

Segundo ele, a questão está agora no plano diplomático. "O governo brasileiro deve se manifestar sobre as decisões que vai tomar e, eventualmente, chamar o embaixador brasileiro em La Paz [capital boliviana] para consultas", afirmou. "No caso da Petrobras, se socorrer das instâncias legais que, tanto o sistema boliviano permitem quanto se essa questão for tratada pelo governo brasileiro, agir com base no previsto nos contratos e acordos de proteção de investimentos. Isso para que o Estado boliviano seja acionado nas cortes internacionais, a fim de garantir a proteção dos interesses brasileiros na Bolívia", observou.

Eleito sob uma plataforma de cunho nacionalista, o presidente boliviano, Evo Morales, pontuou, em sua proposta de governo, um tratamento diferente em relação aos recursos naturais do país. Na avaliação do professor, com a nacionalização das refinarias, ele concretiza a "promessa que fez em sua eleição".

Para Lessa, a surpresa foi a forma como ela foi feita. "Uma nacionalização sempre é um ato de muita violência, de grande hostilidade no tratamento com o capital estrangeiro. O caso da Bolívia é um caso que nos afeta diretamente. A grande surpresa é o modo como isso foi feito", destacou.

Ele acredita que manifestações dessa natureza traduzem repúdio à presença brasileira no país. "A maior presença estrangeira na Bolívia é a brasileira. A hostilidade que existe ao capital estrangeiro na Bolívia é ao capital brasileiro", afirmou, acrescentando que a situação deve ser acompanhada com cautela, "tanto pelo interesse brasileiro na Bolívia quanto por seu significado na política internacional na América do Sul, especialmente, nas relações do Brasil com seus vizinhos".

A medida foi anunciada ontem (1º) por Morales. O decreto que nacionaliza as refinarias está baseado em um referendo de julho de 2004, quando a população votou a favor de que a Bolívia recuperasse a propriedade de suas reservas. Na década de 1990, as reservas foram privatizadas pelo então presidente Hugo Banzer. Três empresas venceram a privatização: a britânica BP, a espanhola Repsol e a estatal brasileira Petrobras. Com a decisão, os campos de produção das empresas estrangeiras na Bolívia, dentre eles, o da Petrobras, foram nacionalizados e estão sendo ocupados pelo Exército.