Luciana Vasconcelos e Aloísio Milani
Repórter da Agência Brasil
Brasília – A violência policial no país está fora de qualquer padrão aceitável, de acordo com a coordenadora de Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, Sílvia Ramos. Em texto publicado no Relatório Direitos Humanos Brasil 2005, ela analisa a violência policial em três estados: Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.
Segundo a pesquisadora, as polícias desses três estados mataram quase cinco vezes mais civis do que todas as polícias de todos os estados norte-americanos juntos. "Comparando com padrões de polícias reconhecidamente violentas (como África do Sul e Estados Unidos), revela-se um padrão de uso de força letal fora de qualquer proporção aceitável", destaca.
De acordo com Sílvia, o Rio de Janeiro representa um caso grave dentro deste panorama. Dados do relatório mostram que mais de 10% dos homicídios dolosos no estado são provocados pela polícia, tendo as ocorrências chegado a 900 assassinatos em 2002, 1.195 em 2003 e 983 em 2004.
A estudiosa disse que as características dessas mortes são importantes para compreender sua dinâmica. "Um estudo minucioso realizado, tomando os autos de resistência dos anos 1993 a 1996, na cidade do Rio de Janeiro, revelou que as vítimas são majoritariamente jovens do sexo masculino (de 15 a 29 anos, com ênfase na faixa de 20 a 24) e que 64% são negros, contrastando com a presença de 39% de negros na população carioca".
Segundo ela, o estudo também mostrou que a ação de polícia dentro das favelas é mais letal do que em outros locais. Além disso, a análise apontou que quase a metade dos corpos recebeu quatro disparos ou mais e a maioria dos cadáveres apresentava pelo menos um tiro nas costas ou na cabeça, configurando casos evidentes de execuções sumárias entre as "mortes em confronto".
Para Sílvia, a ausência de investimentos e de políticas públicas racionais, fez com que a maioria das polícias do país se degradasse e muitas acabaram tornando-se violentas e ineficientes. Afirma ainda que o crime organizado corrompeu amplos segmentos das corporações policiais, em alguns casos atingiu não só as bases, mas também as chefias. "Em alguns estados, a violência policial transformou-se em um problema maior e afeta diretamente as populações pobres das favelas e das periferias, que se vêem encurraladas entre a violência dos grupos armados de traficantes e a violência e a corrupção policiais", analisa.
Para Mário Mamede, ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, o relatório faz análise de uma situação já conhecida pela sociedade brasileira. "Não há novidade na afirmativa que a polícia brasileira detém um alto índice de letalidade e violência desmedida, que precisa ser modernizada, que precisa ser democratizada, que precisa ser melhor aparelhada, instrumentalizada, precisa desenvolver melhor seus aspectos da investigação científica, trabalhar com metodologias mais modernas", afirma.
Mamede também critica o relatório que, na opinião dele, "parece procurar propositadamente desconhecer" o esforço do governo para implementação do Programa Nacional de Segurança Pública. "O que é necessário, além do reconhecimento, é que se trabalhe cada vez mais em parceria e que se reconheça o papel da sociedade e esforço de governo. É impossível tratar no relatório sobre violência policial sem tecer comentários ou estar atento ao esforço do governo. Eu acho que isso procurou ser desconhecido", conclui.