Relatório mostra história de viúva que mantém luta do marido pela posse da terra

28/11/2005 - 19h11

Lana Cristina
Repórter da Agência Brasil

Brasília - A história da trabalhadora rural e hoje sindicalista Maria Joel da Costa é um dos casos mostrados no relatório "Violação dos Direitos Humanos na Amazônia: Conflito e Violência na Fronteira Paraense", divulgado hoje (28) pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e as organizações não-governamentais (ONGs) Justiça Global e Terra de Direitos. Ela é viúva de José Dutra da Costa, o Dezinho, assassinado na porta de sua casa em novembro de 2000.

Dezinho era presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, uma das cidades onde a situação do conflito agrário é relatada no documento. "Como ele ajudava os trabalhadores, investigando a questão da titularidade das terras, para cobrar do governo federal a utilização de terras improdutivas para a reforma agrária, Dezinho ameaçava os interesses de muita gente", conta Maria Joel.

Em 2003, Maria Joel se candidatou à presidência do sindicato que, depois da morte do marido, perdeu a força como entidade representativa dos trabalhadores. "Hoje, temos mais de cinco mil afiliados. Mas Rondon do Pará tem uns 45 mil moradores e 90% deles trabalham na terra", relata a presidente do STR.

Maria Joel anda protegida por dois policiais do estado, um militar e civil, há cerca de um ano. Ela sofre ameaças desde que assumiu a presidência do sindicato. Mãe de quatro filhos, a mais nova com 16 anos de idade, ela diz que não desiste, justamente para deixar um meio de vida justo e digno para as gerações futuras. "Sempre me perguntam porque eu não desisti, mesmo depois de perder meu marido e de estar sofrendo ameaças de morte. Toda vez que eu falo publicamente, sei que posso estar anunciando minha própria morte. Mas eu estou aqui justamente porque eu não quero que aconteçam mais mortes. Chega de impunidade. Tenho quatro filhos e, hoje, sou a única responsável por eles. Mas me sinto na obrigação de contribuir para que os trabalhadores dali tenham uma vida digna na terra", disse Maria Joel, no lançamento do relatório sobre a violência agrária no Pará.

A ocupação de terras por famílias de trabalhadores rurais em Rondon do Pará começou na década de 70, quando algumas delas ali chegaram e formaram roçados. Depois de 10 anos de ocupação, começaram a aparecer fazendeiros se dizendo donos da terra e perseguindo os trabalhadores rurais. Segundo o relatório, os fazendeiros faziam ameaças e impediam as famílias de trabalhar. A situação foi se agravando, até a morte de Dezinho, que entrou para o sindicato em 1993 e permaneceu ali por dois mandatos.

Ainda hoje, segundo o relato de Maria Joel, a situação da terra em Rondon do Pará é delicada. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) criou vários assentamentos em áreas públicas retomadas de fazendeiros e grileiros que não produziam nas propriedades. Mas há vários casos, conforme conta o coordenador nacional da CPT, José Batista Afonso, em que a Justiça concedeu liminar de reintegração de posse aos supostos proprietários, impedindo a regularização desses projetos.