Lula defende mudança no perfil das desigualdades econômicas e sociais na América Latina

03/12/2002 - 17h30

Santiago, 3/12/2002 (Agência Brasil - ABr) - O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva afirmou hoje, em pronunciamento no Palácio de La Moneda, onde se encontrou com o presidente do Chile, Ricardo Lagos, que é preciso mudar o perfil de desigualdades econômicas e sociais no Brasil e em todo o continente americano. "A miséria, que faz de dezenas de milhões de homens e mulheres verdadeiros párias, não pode ser tolerada", disse Lula, ressaltando que não há democracia política que resista a tão dramáticas diferenças sociais.

Lula reafirmou no discurso que preservará a estabilidade econômica e honrará contratos e que cumprirá o compromisso assumido com os pobres e excluídos. Com reformas institucionais e mudanças na política econômica, disse ele, o governo vai construir, "passo a passo", uma sociedade que dará prioridade ao desenvolvimento com distribuição de renda, enfatizando a produção, e não a especulação.

Ele lembrou que Chile e Brasil viveram dolorosos processos políticos no passado, que privaram seus povos de liberdades fundamentais durante longo período, bem como apresentaram gravíssimas violações dos direitos humanos, mas destacou que o problema foi superado por meio de eleições e lutas sociais que permitiram a reconstrução da democracia. Segundo ele, "os governos chilenos que se sucederam nestes últimos anos foram fruto de uma coalizão de forças que, na sua diversidade política e ideológica, fez uma aposta na democracia e conseguiu avanços substantivos nesta direção".

Em agradecimento especial ao povo chileno, Lula ressaltou que estará sempre na memória do povo brasileiro a acolhida que o Chile deu a milhares de refugiados brasileiros durante os governos Eduardo Frei e Salvador Allende. "Aqui em Santiago, em Concepción, e por todo o país, milhares de brasileiros, muitos dos quais são hoje militantes e dirigentes do meu partido, puderam compreender perfeitamente o verso do Hino Nacional que apresenta o Chile como "asilo contra a opressão", afirmou o futuro presidente. A essa gratidão histórica que os brasileiros têm com o Chile acrescenta-se agora o carinho com que sua comitiva foi recebida, acrescentou Lula, que está seguro de que a cooperação, cada vez mais estreita, entre o Chile e o Brasil será fecunda para todo o continente.

O presidente eleito fez também um retrospecto da trajetória do Partido dos Trabalhadores, fundado há 22 anos, e destacou que outras forças políticas brasileiras, além do PT, foram elementos fundamentais do processo de redemocratização brasileira. Ele ressaltou que os 52 mihões de votos que obteve nas eleições presidenciais de 2002 e o grande movimento de apoio que se observa hoje no Brasil devem-se a uma aliança liderada pela esquerda, que foi capaz de reunir diversos setores políticos e ideológicos.

Na opinião do futuro presidente, o PT compreendeu, "nesse longo e intenso período de lutas", que o fortalecimento da democracia política precisa ser acompanhado necessariamente de uma ampliação da democracia econômica e social. Neste sentido, a mensagem que veio das urnas é inequívoca: "Não podemos continuar sendo uma das maiores economias do mundo e, ao mesmo tempo, termos dezenas de milhões de brasileiros passando fome, excluídos da produção e de condições básicas de bem-estar inerentes à dignidade humana".

Para implementar o novo modelo de desenvolvimento que pretende, o governo do presidente eleito terá que reduzir a vulnerabilidade externa da economia brasileira, disse ele. De acordo com Lula, não haverá pleno exercício da soberania popular se o novo governo não tiver a capacidade de controlar as principais decisões econômicas. "Isso não deve ser confundido com um voluntarismo ingênuo, que desconhece a existência de constrangimentos internacionais e a interdependência que caracteriza o mundo de hoje", afirmou.

O futuro governo está consciente das vantagens e dos riscos que a globalização representa e, para enfrentá-la corretamente, considera fundamental que o país tenha claros os interesses nacionais. "É necessário, igualmente, propor política de regionalização que permita articular o país com problemas comuns, de modo a garantir melhor inserção no mundo", disse Lula. Ele ressaltou que um dos instrumentos é o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e defendeu uma cooperação mais estreita entre os países da região.
Marcos Chagas