Renata Giraldi
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Há pouco mais de uma semana, 36,7 milhões de iranianos foram às urnas e escolheram o clérigo moderado Hassan Rouhani como novo presidente da República. Ele assume o governo em agosto, em substituição a Mahmoud Ahmadinejad. Em sua campanha, Rouhani prometeu aproximar o Irã do Ocidente, atenuar as diferenças e buscar a conciliação. Em Brasília há um ano, o embaixador do Irã no Brasil, Mohammad Ali Ghanezadeh, reiterou que a personalidade “moderada” do presidente eleito dará novos rumos ao país e indicou que o programa nuclear será mantido.
Dizendo-se impressionado com o dinamismo e a relevância do Brasil no cenário mundial, Ghanezadeh, em sua primeira entrevista à imprensa nacional, demonstrou que acompanha de perto todos os acontecimentos no país. Ao ser perguntado sobre as manifestações nas ruas, inclusive com atos de violência e vandalismo, ele optou por elogiar o ambiente democrático.
“É preciso olhar para as manifestações de forma positiva [como ressaltou a presidenta Dilma Rousseff] e não negativamente”, disse o diplomata. “A presença da população nas ruas demonstra o dinamismo democrático que existe no Brasil, é a oportunidade de o governo ouvir a população sobre suas demandas, de modo geral. Considero as manifestações algo positivo. [Mas] não é bom nenhum tipo de violência.” A seguir, os principais trechos da entrevista exclusiva do embaixador do Irã à Agência Brasil.
Agência Brasil (ABr) – Há cerca de um ano, o senhor está no Brasil, quais são suas impressões? O senhor está impressionado com essas manifestações nas ruas de várias cidades, com alguns casos de violência e vandalismo? Isso repercute negativamente a imagem do Brasil no exterior?
Mohammad Ali Ghanezadeh – A presidenta Dilma Rousseff enfatizou que essas manifestações são a evidência do dinamismo da democracia que há em seu país. A presença da população nas ruas demonstra o dinamismo democrático que existe no Brasil, que é a oportunidade de o governo ouvir a população sobre suas demandas, considero as manifestações algo positivo. [Mas] não é bom nenhum tipo de violência. É preciso olhar para as manifestações de forma positiva [com a presidenta Dilma disse] e não negativamente. É uma questão da política interna brasileira. O Brasil é um país de economia dinâmica e variada, com um futuro cada vez mais relevante no mundo e um papel de destaque na ordem mundial. Para mim, é uma grande honra estar aqui.
ABr - Depois de dois mandatos seguidos do presidente Mahmoud Ahmanejad, o Irã escolhe um novo presidente. Qual o significado dessas eleições?
Ghanezadeh – Não foram apenas eleições, foi uma forma de o povo iraniano demonstrar sua confiança e responder à propaganda negativa da imprensa estrangeira contra o Irã. Mais de 72% dos eleitores participaram [de um total de 50 milhões de eleitores]. É uma oportunidade de interagir com o mundo e de demonstrar o contentamento da sociedade iraniana.
ABr – A expectativa é que o presidente eleito Hassan Rouhani adote uma nova forma de lidar com o Ocidente. É possível acreditar nisso?
Ghanezadeh – O presidente Rouhani desempenhou por 16 anos vários cargos importantes, é uma pessoa instruída, com doutorado na Universidade de Glasgow (Escócia) e muito respeitado pelas autoridades ocidentais. O modo moderado como se comunica é observado pelo Ocidente. A campanha presidencial dele tinha como slogan “Esperança e prudência”, o que conquistou a população. Com esse conjunto de características, oxalá ajude na interação com o Ocidente.
ABr – Em relação ao programa nuclear iraniano, alvo de sanções e suspeitas por parte de um grupo da comunidade internacional, o que pode mudar?
Ghanezadeh – Certamente, o presidente Rouhani aproveitará sua experiência para chegar a um entendimento, no passado ele conseguiu um acordo com o então presidente da França Jacques Chirac [1995-2007]. Unindo sua experiência pessoal com o modo moderado como lida com as questões, isso certamente contribuirá e eu estou otimista. Mas o Irã não pretende ignorar seu direito de desenvolver um programa nuclear próprio para fins pacíficos. Certamente serão apresentadas todas as garantias [para a comunidade internacional] sobre os fins pacíficos do nosso programa.
ABr – O senhor também está otimista sobre o fim das sanções internacionais, impostas, sobretudo, devido ao programa nuclear iraniano?
Ghanezadeh – Essa é uma questão muito complexa, que levará algum tempo, não será decidida rapidamente, pois alguns países ocidentais têm uma posição de arrogância em relação ao Irã. [Infelizmente], o objetivo das sanções é atingir principalmente o povo iraniano. O Irã é um poder regional, que tem uma relação positiva com os 15 países da região, um PIB [Produto Interno Bruto] superior a US$ 1 bilhão e capacidade própria de desenvolvimento. No Irã, viveram povos das antigas civilizações. Ninguém pode ignorar isso. [As sanções] mostram que até o momento conseguimos enfrentá-las. Há resistência do povo iraniano em relação ao embargo [como os iranianos chamam os efeitos das sanções]. Mas tudo isso não ocorrerá da noite para o dia, levará tempo.
ABr – O presidente Mahmoud Ahmadinejad viajou algumas vezes para a América Latina e visitou o Brasil também. O presidente eleito Rouhani pretende vir ao Brasil nos próximos meses?
Ghanezadeh – O Brasil é um líder econômico não apenas na sua região. O presidente eleito [Rouhani] disse, em entrevista coletiva, que pretende desenvolver as relações com a América Latina, apesar da propaganda explícita dos Estados Unidos de forçar cada vez mais o isolamento do Irã. O Brasil, a Venezuela e vários países da região [América Latina] ignoram isso. A realidade mostra que a América Latina conseguiu sobrepor essa vontade imposta pelos Estados Unidos, conquistando suas próprias aspirações e objetivos. Nesse sentido, as relações do Irã com a América Latina devem continuar. Por enquanto, não há planos de ele [Rouhani] visitar o Brasil, mas certamente no futuro serão programadas visitas.
ABr – Há uma curiosidade sobre o futuro do presidente Ahmadinejad: ele deixará a vida política?
Ghanezadeh – O presidente Ahmadinejad é um professor universitário e indicou que pretende retornar à universidade. Mas isso não quer dizer que ele pretenda abandonar a vida política.
Edição: Graça Adjuto
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