Organizações pedem extinção de unidade que mantém internação de adolescentes infratores

28/05/2013 - 17h14

Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil

São Paulo - Organizações de defesa dos direitos de crianças e adolescentes, reunidas hoje (28) na capital paulista, pediram a extinção da Unidade Experimental de Saúde (UES), criada em 2008 pelo Decreto Estadual nº 53.427. O órgão foi criado para possibilitar que adolescentes autores de infrações graves, avaliados como "portadores de distúrbios de personalidade e de alta periculosidade", sejam mantidos em internação, mesmo após o período máximo de três anos, definido pelo Estatuto da Criança e do Adolescentes (ECA). Isso é feito por meio da interdição civil desses jovens.

As entidades, que formam a Associação Nacional de Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Anced), avaliam que a unidade não tem previsão legal e que, quando constatados distúrbios psicológicos, os jovens deveriam ser tratados no âmbito do Sistema Único de Saúde. "Em 2013, o primeiro interno que lá chegou completa dez anos de internação", disse a advogada Tatiane Cardoso, do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) Interlagos, uma das entidades que organiza o Seminário Latino-Americano de Saúde Mental e Justiça Juvenil.

O interno mais antigo da unidade é Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha, assassino confesso do casal Liana Friedenbach, de 16 anos, e Felipe Caffé, de 19 anos, mortos em 2003 na Grande São Paulo. Segundo a advogada do Cedeca, atualmente, seis jovens estão internados na UES, localizada na zona norte da capital. Inicialmente, a unidade estava vinculada à Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação Casa), órgão responsável pelas medidas socioeducativas e, posteriormente, foi transferida para a Secretaria de Saúde.

No último 22 de abril, o Ministério Público Federal em São Paulo, junto com outras entidades, incluído a Anced, ingressou com uma ação civil ´pública pedindo a desativação da unidade. Cardoso destacou que esses adolescentes já cumpriram as medidas socioeducativas pelos crimes que cometeram e continuam encarcerados. "É como uma pena perpétua", declarou a advogada.

A unidade experimental também é questionada pelo Subcomitê de Prevenção da Tortura (SPT) do Alto Comissionado das Nações Unidades para Direitos Humanos. Em relatório feito a partir de visitas feitas em 2012 a locais de encarceramento no país, o comitê recomenda ao Estado brasileiro a extinção da UES. "Eles [os adolescentes] permaneceram, entretanto, detidos por um período de tempo ilimitado devido a sua suposta periculosidade. O SPT expressa grande preocupação com a situação legal dos detidos nesse centro e com o sofrimento mental que uma detenção sem prazo definido pode causar", ressalta o documento.

Cláudio Vieira da Silva, coordenador-geral do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que também participou do seminário, destacou que, embora a secretaria seja contrária à unidade experimental instalada em São Paulo, o governo estadual tem autonomia para execução do sistema socioeducativo. "Somos contra. Manifestamos essa posição ao governo do estado e estamos em diálogo. No nosso entendimento, não há previsão legal para esse tipo de unidade", declarou.

Silva avalia que a possibilidade de interdição dos adolescentes prevista no Artigo 65 da Lei nº 12.594 de 2012, que institui o Sinase, não torna legal a criação de unidades similares a manicômios judiciais para adolescentes. "A interdição é possível, mas não que essas pessoas possam ser recolhidas em uma unidade, senão nós vamos ter o retorno a um sistema manicomial", apontou. Ele informou que esse sistema é único no país e que outros estados tentaram adotá-lo, mas sofreram resistência por parte da sociedade civil.

Ao ser indagada sobre as críticas apresentadas durante o evento, a Secretaria Saúde respondeu que ainda não foi notificada da ação civil pública que solicita o fechamento da Unidade Experimental de Saúde. Informou, ainda, que está oferecendo assistência terapêutica, médica e psicológica aos internos da unidade.

 

Edição: Aécio Amado

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