Brasília - Toda segunda-feira pela manhã os leitores da Agência Brasil encontram, sem falta, duas matérias sobre os resultados da pesquisa semanal Focus do Banco Central, baseados em informações levantadas na sexta-feira anterior pelo Departamento de Relacionamento com Investidores e Estudos Especiais (Gerin) junto ao mercado financeiro. As informações consistem nas projeções feitas pelos 100 analistas entrevistados referentes ao desempenho esperado de um conjunto de variáveis econômicas no fim do ano corrente e do próximo, dentre eles, a taxa de inflação (medida por diversos índices), o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), o crescimento na produção industrial, a taxa básica de juros (Selic), a taxa de câmbio (R$/US$), o superávit ou déficit na conta-corrente do país, a balança comercial dentre outras. Para as taxas de inflação e de câmbio, projeções de curto prazo para o fim do mês atual também entram na pesquisa.
Os dados estão disponíveis no site do Banco Central na forma de tabelas e gráficos [1], mas a Agência presta um serviço jornalístico, na medida em que resume algumas destas informações nas matérias publicadas nas segundas-feiras. Até o ano passado as matérias seguiam uma fórmula praticamente invariável na qual constavam as projeções mais recentes em comparação às da semana anterior, com observações sobre há quantas semanas se sustentam as tendências de alta ou baixa ou de estabilidade em algumas projeções. De uma semana para outra a matéria não mudava; só mudavam os valores e na grande maioria dos casos as mudanças nos valores de uma semana para outra são ínfimas, como, por exemplo, na seguinte informação tirada de uma das matérias sobre os resultados mais recentes (06/05): “A expectativa para o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) foi ajustada de 4,80% para 4,81%, este ano” [2].
Desde o ano passado, porém, houve mudanças positivas na forma de fazer esta cobertura. A abordagem padronizada continua, mas nas matérias mais recentes, só para citar alguns exemplos, encontram-se discussões sobre a Selic, inclusive com infográficos, comentários sobre medidas governamentais e tendências econômicas que contextualizam ou se contrapõem às previsões dos analistas, links de outras matérias e a integração de dados do boletim Focus em outras matérias [3]. Nota-se também que as projeções de curto prazo (mensais) foram eliminadas.
Aproveitando essa iniciativa da Agência Brasil, levantam-se algumas questões sobre a pesquisa, como a forma de relatar os resultados e a utilização deles, que poderiam chamar a atenção dos repórteres:
1. Quem são os 100 analistas entrevistados? São sempre os mesmos 100? A escolha é aleatória? Para quais instituições ou tipos de instituições – privadas, públicas – eles trabalham? Existem vieses nas previsões em função dos interesses profissionais dos entrevistados? Pequenas mudanças nas projeções têm pouco significado para o público leigo, mas elas produzem efeitos nas decisões dos operadores financeiros cuja atividade depende em parte do deslocamento de capitais entre as diversas aplicações.
2. Qual é a causa das mudanças maiores em algumas projeções (produção industrial, conta-corrente e balança comercial)? Isto reflete a divulgação de novos dados por órgãos do governo? Até que ponto as projeções dos analistas se alteram em função da disponibilidade dos dados oficiais, atualizados em intervalos diferentes, mas sempre defasados, alguns mais que outros. Na medida em que esse for o algoritmo adotado, com ajustes nas projeções apenas para incorporar os novos dados oficiais, seria interessante que os leitores tivessem conhecimento disso, pois desse modo os analistas estariam apenas corrigindo os desvios das suas projeções anteriores, ao invés de respeitar a ressalva que eles próprios fazem de que os resultados do passado não oferecem nenhuma garantia das tendências no futuro.
3. Se existe uma influência dos dados oficiais sobre as projeções dos analistas, a recíproca é também verdadeira. As atas das reuniões do Copom revelam que as decisões sobre a taxa básica de juros da economia – a Selic – levam em conta não apenas os dados macroeconômicos monitorados pelo Banco Central, mas também as previsões dos analistas do mercado financeiro sondados nas pesquisas do boletim Focus.
Qual é o significado dessa influência? Há outros países onde os bancos centrais adotam metodologias semelhantes? Na revista Carta Capital de 21/01/09 (páginas 26 e 27), o então diretor de Estudos Macroeconômicos do Ipea, João Xicus, fez a seguinte observação: “O BC do regime de metas possui uma proximidade ao mercado financeiro que é inaceitável. As previsões de inflação utilizadas e divulgadas pelo BC são previsões de um conjunto composto quase exclusivamente por instituições financeiras [...] Ademais é conhecido o movimento de profissionais do mercado financeiro que ocuparam importantes diretorias no BC e depois retornaram para diretorias de grandes instituições financeiras”.
Boa leitura!
[1] http://www.bcb.gov.br/?FOCUSRELMERC
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-04-15/focus-taxa-basica-de-juros-deve-ser-mantida-em-725-ao-ano
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-03-25/expectativa-de-alta-dos-juros-basicos-da-economia-aumenta-taxas-de-titulos-publicos
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-01-14/mercado-financeiro-volta-reduzir-projecao-de-crescimento-economico-para-este-ano
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-03-18/projecao-de-analistas-para-taxa-basica-de-juros-sobe-pela-segunda-semana-seguida