Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – O Ministério Público Federal (MPF) em Guarulhos (SP) quer obrigar a União a criar uma ouvidoria federal de combate à tortura em São Paulo. De acordo com o órgão, uma ação civil pública propondo a criação da ouvidoria foi protocolada na Justiça Federal na última quinta-feira (21).
O pedido foi feito pelo procurador Matheus Baraldi Magnani, que considera a criação da ouvidoria “o mínimo” para que o Brasil cumpra a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, integrada ao ordenamento jurídico brasileiro desde 1991. Na ação, o procurador sugere que seja estipulado um prazo de 180 dias para que a ouvidoria seja instalada pela União. Também sugere que seja aplicada multa diária por descumprimento da decisão, o que pode ser modificado pela Justiça Federal. A ação refere-se somente ao estado de São Paulo mas, segundo o procurador, pode ser adotada pelos demais estados.
“A Convenção Internacional de Combate à Tortura estabelece que a União tem a obrigação de criar mecanismos administrativos de combate à tortura e quase 30 anos após a ratificação desse tratado, a União não fez nada nesse sentido. Peço que pelo menos seja criado um órgão no qual a vítima de tortura consiga ao menos declarar que foi vítima dessa atrocidade. É o mínimo que se espera da União no cumprimento dessa convenção”, disse o procurador, em entrevista à Agência Brasil.
Segundo Magnani, desde a ratificação da convenção, nenhuma ação foi tomada pela União com relação ao combate à tortura. “Os mecanismos administrativos não existem até hoje. Não existe nenhum”, disse.
Para o procurador, caso a União não demonstre interesse em criar a ouvidoria, no qual a vítima de tortura possa denunciar a sua prática, o melhor seria eliminar o tratado internacional do ordenamento jurídico. Segundo ele, o Artigo 2º da Convenção contra a Tortura determina a criação de mecanismos administrativos de combate à tortura.
Para Magnani, se o Brasil tivesse cumprido as obrigações assumidas perante as organizações internacionais, muitas vidas teriam sido salvas. “É desejável e eu espero que a União se antecipe e não aguarde uma decisão judicial que a obrigue. O ideal seria que a União voluntariamente implantasse esse mecanismo tão importante de combate à tortura no estado de São Paulo”, disse.
Magnani tem acompanhado diversos casos de violência que foram registrados recentemente em São Paulo, principalmente os de abusos e excessos cometidos por policiais militares. Em julho do ano passado, ele pediu a federalização da apuração do homicídio de dois jovens em São Bernardo do Campo, vítimas de violência policial.
“Vivemos, no segundo semestre de 2012, uma enxurrada de assassinatos. A tortura foi praticada durante a manhã, a tarde e a noite aqui na região metropolitana de São Paulo. E por mais essa razão se justifica a criação de um mecanismo de repressão à tortura em São Paulo”, disse o procurador.
De acordo com Magnani, a tortura ainda é um mecanismo muito utilizado no país. “Assustaria uma estatística [sobre a existência de tortura no Brasil nos dias de hoje] porque ficaria demonstrado que, na democracia, se tortura tanto quanto se torturou na ditadura militar, mas de forma diferente. Os grupos de extermínio continuam existindo”, disse.
Entre outras ações que, em sua visão, também deveriam ser implantados pela União com relação ao combate à tortura, o procurador destacou o aperfeiçoamento da formação de profissionais de segurança pública e o incentivo às polícias pacificadoras.
Uma cópia da ação civil pública foi enviada ao Comitê de Combate à Tortura da Organização das Nações Unidas (ONU). Procurados pela Agência Brasil, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e o Ministério da Justiça não comentaram, até o momento, o pedido feito pelo Ministério Público.
Edição: Fábio Massalli
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