Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília – Nove dos 11 moradores de rua detidos esta madrugada (18), em Brasília, acusados de poluição, ocupação de terra pública e crime contra o ordenamento urbano não tem antecedentes criminais, informou à Agência Brasil o defensor público Eduardo Bechepeche. Segundo o defensor, o juiz que analisar a prisão pode determinar que os nove homens e duas mulheres sejam soltos. Caso não o faça, Bechepeche irá protocolar um pedido de habeas corpus em favor do grupo. “Eles estão sendo criminalizados por serem pobres”, criticou o defensor.
O defensor fez a consulta no site do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Por falta de dados precisos, o defensor não sabe a situação de dois moradores de rua detidos.
Sobre a detenção dos moradores, o delegado da 2ª Delegacia de Polícia Civil, Waldek Fachinelli, disse que os policiais constataram poluição no local, em razão do acúmulo de detritos, identificaram risco de aumento de casos de dengue e circulação de ratos na região. A maioria das pessoas levadas para a delegacia se declara ser catadora de latas e de outros materiais recicláveis.
Diretora do Departamento de Atividade Psicossocial da Defensoria Pública, a psicóloga Ingrid Quintão conhece todas as pessoas que vivem no terreno próximo à Universidade de Brasília (UnB), com quem tinha contato quase que semanal, devido um projeto que o órgão desenvolve desde o ano passado com moradores de rua de mais de 30 localidades do Distrito Federal. Para ela, o episódio desta madrugada representa um “processo de higienização em virtude dos grandes eventos que irão acontecer na cidade, em breve”.
“Há mais de 2,5 mil moradores de rua no Distrito Federal. Em vez de nos articularmos para possibilitar que estas pessoas superem esta situação, estamos as criminalizando”, ponderou a psicóloga, garantindo que algumas pessoas vivem no local há mais de 12 anos. Procurada, a UnB informou que o terreno não lhe pertence.
Entre os ocupantes mais antigos da área está Luiz Monteiro da Silva, de 52 anos. Dos 30 anos passados nas ruas, quase 13 anos se passaram sob o barraco em que o catador de material reciclável se abriga com a esposa, duas filhas (uma delas grávida) e um neto. Na semana passada, Luiz recebeu de Bechepeche cópia da sua certidão de nascimento, conforme noticiado pela Agência Brasil.
De acordo com o catador, o documento original foi queimado há mais de 22 anos, durante uma abordagem policial. “Eles pediram meus documentos e eu os apresentei. Veio um policial, tocou fogo e disse que morador de rua não precisava de identidade. Daí por diante, fiquei sem documentos”, declarou Luiz, antes de expressar a expectativa de tirar a carteira de identidade e a Carteira de Trabalho e tentar uma vida nova. “Este é o primeiro passo. Agora eu vou procurar emprego e buscar conseguir a minha casa”.
“Estas pessoas não são criminosos”, acrescentou a psicóloga Ingrid Quintão, criticando a operação de retirada das pessoas do local sem a comunicação a orgãos públicos de atendimento social, como a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do Distrito Federal (Sedest), a Defensoria Pública ou representantes dos movimentos em defesa da moradia.
“Esta é uma questão social que tem que ser vista como uma questão de moradia e não ser criminalizada. Os direitos humanos destas pessoas não estão sendo respeitados. E agora, quando deixarem a delegacia, estas pessoas não vão ter mais sequer os barracos onde viviam precariamente, já que eles foram derrubados. O que já era uma situação crítica, agora ficará pior”, apontou a psicóloga.
Procurada pela Agência Brasil, a Sedest não se manifestou sobre o tema até a publicação da reportagem.
Edição: Carolina Pimentel