Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília - Em apenas quatro meses, o Ministério da Justiça anulou 133 anistias políticas concedidas a ex-cabos da Força Aérea Brasileira (FAB), desligados durante a ditadura militar (1964-1985). Ao todo, o grupo de trabalho interministerial criado para verificar se, de fato, os ex-praças licenciados foram alvo de perseguição política, deverá revisar 2.574 processos.
O atual processo de revisão dos benefícios concedidos desde 2001 pela Comissão Nacional de Anistia, ligada ao ministério, começou em 16 de fevereiro de 2011, com a publicação da Portaria Interministerial nº 134. O texto é assinado pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e pelo então advogado-geral da União substituto, Fernando Luiz Albuquerque Faria.
Perguntado pela Agência Brasil sobre por que a revisão não é feita pela própria Comissão de Anistia, o Ministério da Justiça respondeu que o objetivo é dar imparcialidade ao processo. A reportagem tentou, sem sucesso, ouvir a opinião do presidente da comissão, o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão Júnior.
Dos 154 processos já analisados, em apenas três casos o status de anistiado foi mantido. Dezoito processos acabaram sendo excluídos da revisão por não se enquadrarem nos objetivos do grupo de trabalho, criado para tratar exclusivamente dos efeitos da Portaria nº 1.104 GM3, de outubro de 1964.
Considerada pelo plenário da Comissão de Anistia como um “ato de exceção de natureza política” que visava a "renovar a corporação como estratégia militar, evitando que a homogênea mobilização de cabos eclodisse em movimentos considerados subversivos", conforme documento do Tribunal de Contas da União (TCU), a portaria do Ministério da Aeronáutica limitou a permanência dos cabos na ativa ao máximo de oito anos ininterruptos. Ao fim desse prazo, os que não haviam alcançado outra graduação passaram a ser automaticamente desligados, sem direito a remuneração.
Até a publicação da norma, aqueles que atingiam oito anos de serviço podiam pedir sucessivos reengajamentos. Embora não fosse um direito adquirido, a prática atendia às necessidades de mão de obra especializada da própria FAB. E o praça, por sua vez, conquistava estabilidade empregatícia quando completava dez anos de serviço, podendo progredir na carreira militar.
Em 2003, ao responder à consulta feita pelo Ministério da Justiça, a Advocacia-Geral da União (AGU) concluiu que a Portaria nº 1.104 "não configura, genericamente, um ato de exceção", especialmente para os militares que ingressaram na FAB após a sua edição, "devendo a motivação exclusivamente política do desligamento ser verificada pela análise de cada caso".
Mesmo assim, para o presidente da Associação dos Anistiados e Anistiandos do Nordeste (Asane), Marcos Sena, a publicação da portaria foi uma "retaliação tardia" à participação de alguns então militares em movimentos reivindicatórios que aconteceram antes do golpe de março de 1964. Principalmente por ter sido usada para justificar o desligamento de pessoas que haviam ingressado na FAB antes mesmo de a norma ter sido publicada, abortando a carreira de milhares de praças que, segundo Sena, não tiveram direito à defesa. De acordo com ele, é o caso dos 495 ex-cabos cuja anistia foi revogada em 2004 por uma portaria do então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sob a justificativa de que os ex-militares não podiam alegar terem sido prejudicados por uma norma que já estava em vigor quando ingressaram na força.
Desde a última terça-feira (12), a reportagem aguarda a resposta do Comando da Aeronáutica sobre o quanto a União deverá economizar com a suspensão do pagamento dos benefícios aos 133 anistiados cujos processos já foram anulados. No passado, a FAB chegou a dizer que a Portaria nº 1.104 teve mero caráter administrativo.
Já o Ministério da Defesa, por meio de sua assessoria, limitou-se a dizer que cumprirá as decisões do grupo interministerial, sem comentar as razões do processo de revisão. No Ministério da Justiça, além do presidente da Comissão Nacional de Anistia, Paulo Abrão, a Agência Brasil também não teve resposta para o pedido de entrevista com Rayanna Lemes Werneck Rodrigues, servidora do gabinete do ministro que preside os trabalhos do grupo interministerial.
Edição: Juliana Andrade