Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – Em outubro do ano passado, a comerciante Maria Tatiana Oliveira foi morta após um assalto em sua farmácia, em Guarulhos (SP). Duas pessoas entraram na farmácia fingindo-se de clientes e, então, anunciaram o assalto. Pouco depois de deixarem o local com o dinheiro do assalto, um deles, menor de idade, retornou à farmácia e matou a comerciante com um tiro à queima-roupa.
Na tarde de hoje (24), seu cunhado, Francisco Oliveira Carneiro, vestia uma camiseta estampada com uma foto de Maria Tatiana para participar da primeira audiência pública para discutir mudanças no Código Penal, lei de 1940. A audiência, coordenada por uma comissão de juristas que está elaborando o anteprojeto de reforma do Código, ocorreu no Salão dos Passos Perdidos do Tribunal de Justiça de São Paulo, no centro da capital, e foi acompanhada por cerca de 500 pessoas.
“O cara que matou a Maria Tatiana era menor e, quando ele completar 18 anos, vai sair [da prisão]. Por isso, queremos que a Justiça mude. Ele tem que pagar pelo que fez”, defendeu Carneiro, que foi à audiência para pedir a redução da maioridade penal.
A Comissão de Reforma do Código Penal foi proposta pelo senador Pedro Taques (PDT-MT) e instalada em outubro de 2011. A comissão é presidida pelo ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e composta por 13 pessoas, entre eles o procurador regional da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, relator do anteprojeto. Na audiência desta sexta-feira, esteve em debate os crimes contra a vida, entre eles o aborto e o homicídio.
“O objetivo é atualizar o Código Penal, que é de 1940, tem uma série de distorções e não é compatível com a sociedade brasileira dos dias de hoje. O que queremos é adaptar o Código Penal à Constituição de 1988, aos tratados e convenções internacionais celebrados pelo Brasil e também fazer do Código Penal o centro do sistema penal brasileiro, ou seja, que a parte penal traga os tipos penais mais importantes inclusive daquelas leis chamadas especiais ou extravagantes, como a Lei do Colarinho Branco”, disse o ministro Gilson Dipp.
A procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo Luiza Nagib Eluf, que integra a comissão, diz que a intenção é incluir “toda a legislação extravagante que foi sendo elaborada e que ficou de fora do código nos últimos anos”. Ela disse que outro objetivo é adequar a legislação, classificando delitos não entendidos hoje como crime, tirando a classificação de crime de outros delitos, além de tratar com mais rigor crimes de grande potencial ofensivo ou muito violentos. “E aplicar penas alternativas para os crimes que não envolvem violência contra a pessoa”, observou.
O senador Pedro Taques defende um enxugamento do Código Penal, “retirando dali condutas que melhor estariam no direito civil ou no direito administrativo sancionador, deixando o direito penal para as condutas graves”. Para ele, o Código Penal tem que ser atualizado, criminalizando condutas como o terrorismo e os crimes praticados na internet.
"Entre as propostas que estão sendo discutidas no âmbito da comissão da reforma da lei penal, está o aumento da pena para estupro e também a da pena máxima, que passaria dos atuais 30 anos para 40. “O teto de 30 anos fica aquém da necessidade para delitos graves”, constata Luiz Eluf.
A questão da maioridade penal também foi tratada por outras famílias de vítimas de violência, como a de Rodrigo Balsalobre Damus, assassinado em 1999 por um menor durante um assalto. Seu pai, Jorge Damus Filho, membro do Movimento de Resistência ao Crime, foi à audiência com um documento a ser entregue aos integrantes da comissão em que defende a redução da maioridade, hoje estabelecida em 18 anos. A entidade quer que seja realizado um plebiscito para perguntar à população sua opinião sobre o assunto. “Se não conseguirmos mobilizar a população para cobrar um Código Penal que seja eficaz no cumprimento e agilidade da pena, todos estarão sujeitos a ter em sua casa um ente querido morto pela impunidade e pelo crime”, disse Damus Filho.
“Hoje é um momento histórico para as famílias vítimas de violência que tanto clamam por justiça e que veem tanta impunidade no país”, disse a deputada federal e presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Vítimas de Violência, Keiko Ota. A deputada é mãe do garoto Ives Ota, que foi sequestrado e morto em 1997 por um segurança de uma loja da família.
Segundo Pedro Taques, serão realizadas várias audiências públicas para discutir a reforma do Código Penal. O prazo para a comissão concluir os trabalhos é 31 de maio, quando o texto será entregue ao presidente do Senado, José Sarney, dando, então, início aos debates entre os parlamentares.
Edição: Lana Cristina//Matéria alterada às 10h20 do dia 25/02/2012 para correção de informação