Monica Yanakiew
Correspondente da EBC na Argentina
Buenos Aires – A Justiça argentina divulgou os resultados parciais da investigação sobre a origem de Marcela e Felipe Noble, filhos adotivos da empresaria Ernestina Noble – dona do Grupo Clarin e uma das mulheres mais ricas da Argentina. O DNA de ambos não coincide com as amostras de material genético de 57 famílias de desaparecidos durante a ditadura militar argentina (1976-1982).
Neste sábado, os advogados dos Noble deram o caso por encerrado, mas o debate – que mobiliza a sociedade e a classe política - continua. “As provas não são suficientes para descartar a suspeita de que Marcela e Felipe sejam filhos de desaparecidos e a investigação continuará”, disse, à Agência Brasil, Augustin Chit, advogado da organização de direitos humanos Avós da Praça de Maio.
A batalha das Avós da Praça de Maio para investigar quem são os pais de Marcela e Felipe já dura dez anos, mas recentemente adquiriu importância política. A presidenta Cristina Kirchner, que nas eleições de outubro disputará um segundo mandato, tem enfrentado abertamente o Grupo Clarin – o maior conglomerado de comunicações da Argentina. Seu governo não só aprovou, em 2009, uma lei limitando o numero de licenças de radio e televisão que um mesmo meio pode ter, como acusou diretamente o Grupo Clarin de ter apoiado a ditadura para defender seus interesses. Em mais de um discurso, ela acusou indiretamente Ernestina Noble de estar utilizando todos os meios a seu alcance para esconder a verdadeira identidade de Marcela e Felipe, suspeitos de serem filhos de desaparecidos.
Durante a ditadura, muitas mulheres foram presas grávidas e deram à luz em cativeiro. Foram mortas e seus filhos (calcula-se que 500) foram entregues para adoção – muitas vezes a famílias com vínculos com o regime militar. Desde a década de 70, as Avós da Praça de Maio estão buscando essas crianças, que hoje têm mais de 30 anos. Já encontraram 103.
Há dez anos, as Avós tentam averiguar se Marcela e Felipe são filhos de desaparecidos. Ernestina Noble nunca ocultou que seus filhos foram adotados. Ela contou que encontrou uma criança no jardim e recebeu outra de uma família pobre que não tinha os meios para criá-la. Se fosse provado que as crianças tinham sido roubadas de prisioneiras políticas, a empresaria seria presa.
Este ano, a Justiça determinou que – mesmo sendo maiores de idade e não querendo saber de quem eram filhos – Marcela e Felipe fossem obrigados a dar sangue para comparar seu DNA com as amostras genéticas de todas as famílias que buscam filhos de parentes desaparecidos. A Justiça acaba de divulgar que o DNA de Marcela e Felipe não coincide com as amostras de famílias que buscam crianças nascidas em 1975 e 1976. Como os dois foram adotados em 1976 e vistos a partir daí, os advogados dos Noble estão dando o caso por encerrado.
Candidatos da oposição às eleições presidenciais criticaram, neste sábado (17), o que consideram ser uma “utilização política”, por parte do governo, do drama das vitimas da ditadura. Tanto Cristina quanto seu marido e antecessor, Nestor Kirchner, adotaram a bandeira dos direitos humanos como própria, quando chegaram ao poder.
Mas, segundo Chit, a investigação continuará. As amostras de DNA de quatro famílias não foram suficientes para provar ou descartar o parentesco delas com Marcela e Felipe. Nesses casos, as famílias tentam coletar mais amostras de parentes vivos ou exumam corpos de parentes mortos para obter mais material genético, explicou Chit. Por isso o caso não foi encerrado.
Edição: Fernando Fraga