Lúcia Nórcio e Danilo Macedo
Repórteres da Agência Brasil
Curitiba e Brasília – Após a aprovação, na noite de ontem (24), do projeto de lei do novo Código Florestal pela Câmara dos Deputados, que altera a lei ambiental em vigor desde 1965, os debates e discussões em torno do assunto prosseguem, já que o texto passará, agora, para votação no Senado e seguirá para sanção ou veto presidencial. Um dos setores que foram destacados e que pede um tratamento diferenciado na nova legislação é o da agricultura familiar.
No Paraná, um dos estados com o maior número de agricultores familiares do país, eles alegam que não há necessidade de mudanças significativas na lei ambiental, mas de adequações que aproximem a legislação da realidade da produção agrícola e do fortalecimento de políticas para o setor.
Segundo o secretário-geral da Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf-Sul), Diego Kohwald, os agricultores, principalmente os pequenos e os familiares, correm o risco de ter suas propriedades inviabilizadas se preservarem 20% das terras (reserva legal), além das áreas de preservação permanente (mata ciliar e nascentes).
“Esses agricultores representam 90% das propriedades no estado”, enfatizou Diego, que tem 23 anos e vive com sua família numa pequena propriedade rural de Marmeleiro, no sudoeste do Paraná, onde eles cultivam hortaliças, morangos e plantam cana-de-açúcar. Ele conta que são 18 hectares de terra com rio, fontes e nascentes preservadas, em um espaço que ultrapassa 25% da propriedade.
O código atual exige reserva legal mínima em todas as propriedades, variando de 80% na Amazônia, 35% no Cerrado a 20% nas outras regiões. O novo texto aprovado dispensa as propriedades de até quatro módulos fiscais (medida que varia de 20 a 400 hectares) de recompor a área de reserva legal desmatada. Para esses casos, não haverá obrigatoriedade de percentual mínimo de preservação, valendo a manutenção da área de vegetação nativa existente em julho de 2008.
O agricultor José Bertolino, de 44 anos, diz que mais de 20% de sua propriedade de 16 hectares, plantados com feijão e milho, no município de São Mateus do Sul, são reservados às áreas de proteção ambiental. "Mudanças no Código Florestal vão favorecer grandes agricultores. Se forem beneficiados com isenções de multas e anistia pelo que já desmataram, será um atraso na lei”, argumentou. Bertolino disse que sua expectativa, agora, é que o agricultor que mantiver áreas protegidas acima do que prevê a legislação seja compensado com pagamento pelos serviços ambientais.
Para Maria Salete Escheer, que pratica a agricultura orgânica em 12 hectares de terra em Campo Magro, região metropolitana de Curitiba, 10% de uma propriedade seriam suficientes para serem destinados à preservação ambiental, se complementados com alternativas como adubação verde, não usar agrotóxicos nos leitos dos rios e uso de práticas de contenção de terras e cordões vegetais. “É preciso adequar a legislação à produção, à sobrevivência do agricultor”, ressalta.
Segundo a agricultora, preservar a terra é uma questão cultural entre os pequenos agricultores. “Muitas vezes, somos obrigados a plantar em encostas por necessidade, por questões de sobrevivência”.
A vice-presidente do Bloco Parlamentar da Agricultura Familiar, na Assembleia Legislativa do Paraná, deputada Luciana Rafagnin, disse que tem acompanhado a luta do pequeno agricultor paranaense e reconhece que são eles os que mais preservam, “pois sobrevivem da sua pequena propriedade”.
A Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Paraná (Fetaep), que representa cerca de 1,2 milhão de trabalhadores rurais no estado, defende que áreas consolidadas em topo de morro e em várzeas continuem atuando da mesma maneira, como prevê o projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados. Há concordância quanto à proibição de novos desmatamentos dentro dessas reservas. “É importante inserir o conceito de agricultura familiar e rever questões em torno da reserva legal”, disse o diretor de Política de Meio Ambiente a Fetaep, Aristeu Ribeiro.
Ele citou uma série de exemplos de atividades agrícolas desenvolvidas no Sul do país que estão, há séculos, ocupando estas áreas. “Em topos de morro, no Paraná, nós temos os cafezais e as poncãs no Vale do Ribeira. Em Santa Catarina, temos as macieiras e, no Rio Grande do Sul, os parreirais. Além disso, o estado gaúcho também é muito conhecido por suas plantações de arroz nas áreas de várzea”.
Edição: Lana Cristina