Embaixador iraniano desaprova Khadafi e condena intervenção na Líbia

18/03/2011 - 19h52

Carolina Pimentel e Ivanir José Bortot
Repórteres da Agência Brasil

Brasília - A um dia da chegada do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ao Brasil, o embaixador do Irã no Brasil, Mohsen Shaterzadeh, minimiza a importância da visita e disse que a política externa brasileira tem dado provas de ser soberana e independente. Segundo ele, a posição do governo da presidenta Dilma Rousseff de se abster ontem (17) na votação, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, da resolução que cria uma zona de exclusão aérea na Líbia e autoriza adoção de medidas contra ataques do regime do presidente Muammar Khadafi, é a demonstração da continuidade da política externa do Brasil. Mohsen Shaterzadeh condena qualquer tipo de intervenção dos Estados Unidos na Líbia por provocar "violência e sofrimento ao povo líbio". O Irã promete apoio ao povo daquele país e condena a atuação do governo de Khadafi por falta de legitimidade e por representar o poder econômico do Ocidente, entre eles dos Estados Unidos. Confira abaixo a íntegra da entrevista concedida à Agência Brasil.

Agência Brasil (ABr) - Qual avaliação o senhor faz da visita do presidente Obama ao Brasil?
Mohsen Shaterzadeh - As relações bilaterais sempre estão baseadas em cooperação. Não existe uma cooperação baseada na inimizade, como a união de dois países contra um país terceiro. Pelo conhecimento que temos dos nossos amigos brasileiros e do governo brasileiro, achamos que qualquer cooperação do Brasil com qualquer país é, certamente, no sentido de desenvolver suas relações bilaterais com esses países e nunca será para aproximação contra um país terceiro. Temos uma relação muito vasta, muito ampla com o Brasil. Nossas relações com o Brasil nunca serão contra um país.

ABr - O senhor teme que uma aproximação do Brasil com os Estados Unidos signifique um afastamento em relação ao Irã?
Shaterzadeh - O ministro Patriota [Antonio Patriota, ministro das Relações Exteriores] afirmou em várias situações em dar seguimento à política externa do presidente Lula. Estamos confiantes que a política externa brasileira será a continuação da política anterior. Acreditamos que a política externa brasileira é realista, baseada em inteligência e de acordo com o interesse nacional brasileiro e não será influenciada pelo poder externo. Acreditamos que o Brasil foi, de certa forma, muito corajoso por ter votado pela abstenção [votação nas Nações Unidas para criar uma zona de exclusão aérea na Líbia.

ABr - A posição brasileira foi acertada?
Shaterzadeh - Isso demonstra que é uma política soberana e independente. Nós também temos interesses comuns com o governo brasileiro. Acreditamos que as relações com o Irã vão melhorar ainda mais. O Irã, como um grande país do Oriente Médio, chama atenção do Brasil. Do outro lado, o Brasil é um país importante para nós na América do Sul, nesse sentido existe uma convergência de interesses dos governos.

ABr - Qual a avaliação sobre a possibilidade de uma intervenção armada na Líbia?
Shaterzadeh - Acreditamos que tem de ser respeitadas a opinião, as aspirações e o desejo do povo. O grande problema na região é a existência dos governos ditatoriais apoiados pelos Estados Unidos. Acho que o melhor trabalho que os Estados Unidos poderiam fazer é não interferir em assuntos internos. Os Estados Unidos e os países ocidentais nunca defenderam os direitos dos povos dessa região, mas sempre seus interesses. Para qualquer pessoa que tem interesse em ajudar o povo da Líbia, a melhor solução é impedir a intervenção dos Estados Unidos e dos países do Ocidente. A melhor forma é ajudar o povo a resolver os problemas com os governos locais.

ABr - Ajudar o povo com ou sem Khadafi no governo?
Shaterzadeh - Temos de deixar o povo decidir sobre o seu destino. Acho que nesse sentido o povo tem maturidade para poder decidir. O povo compreende que o comportamento dos Estados Unidos e dos países do Ocidente é uma atitude para enganar, é falso. Eles falam de apoio ao povo, mas é mentira, pois todo esforço é para conservar seus interesses.  

ABr - Como o senhor vê o papel do presidente Obama em uma solução para os conflitos na Líbia?
Shaterzadeh - O que achamos é que o presidente Obama tem que respeitar os direitos do povo e não interferir em outros países. Uma invasão ou um ataque militar contra a Líbia, certamente aumenta a violência e o sofrimento desta população. O povo de uma forma soberana é independente e deve decidir seu destino. Os Estados Unidos da América nunca respeitaram os direitos dos povos.

ABr - Caso haja uma intervenção na Líbia por parte dos países do Ocidente, o Irã ficará ao lado do governo da Líbia e que tipo de ajuda poder dar?
Shaterzadeh - Nós apoiaremos o povo da Líbia.
         
ABr - Com que medidas apoiará o povo?
Shaterzadeh - Temos que ter paciência e esperar mais um pouco para ver os acontecimentos.

ABr - Isso significa que o Irã não apoiará Khadafi?
Shaterzadeh - Nós não apoiamos o governo de Khadafi.

ABr - Então, o Irã não apóia Khadafi e é contra a intervenção?
Shaterzadeh - É da nossa visão que a soberania pertence ao povo. Todos os nossos esforços e as iniciativas neste sentido são para ajudar o povo a conquistar estes direitos. Um governo, um Estado que mata seu povo, não tem legitimidade. Este governo de Khadafi de certa forma é apoiado pelo Ocidente e pelos Estados Unidos. O motivo deste apoio do Ocidente é a existência do petróleo na Líbia. O Ocidente e os Estados Unidos têm cerca de US$ 200 bilhões em investimentos na Líbia. Esta estratégia de atacar o governo da Líbia para defender o povo é uma grande mentira. Eles estão defendendo os seus interesses neste país. Vocês podem estar seguros de que se o Ocidente retirar o apoio ao governo de Khadafi, o povo vencerá.       

ABr - Diante destas considerações sobre o papel dos Estados Unidos, qual o significado da visita do presidente Obama ao Brasil?
Shaterzadeh - Nós achamos que o povo brasileiro é muito maior do que uma visita do presidente dos Estados Unidos. Sobretudo, um presidente estrangeiro que visita o Brasil em um sábado e domingo, que não é um dia de trabalho. Se você for perguntar ao povo brasileiro vai ver que a visita não é tão importante para eles.  
 

 

Edição: Rivadavia Severo