Luiz Antônio Alves
Correspondente da Agência Brasil na Argentina
Buenos Aires – Uma semana após a morte do ex-presidente Néstor Kirchner, o Senado e a Câmara dos Deputados da Argentina reuniram-se em sessão conjunta ao longo da tarde de hoje (3) para homenagear aquele que era considerado um dos mais poderosos líderes políticos do país.
Passados os momentos de comoção popular com o súbito desaparecimento do deputado federal, líder do Partido Justicialista e secretário-geral da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), cargos que o ex-presidente acumulava, as principais forças políticas, empresariais e sindicais da Argentina sinalizam a disposição de criar e manter as condições que garantam a normalidade da vida cotidiana no país. O futuro próximo da política e da economia ainda são motivo de dúvidas, incertezas e especulações, mas um primeiro passo para demonstrar sua disposição de esclarecê-las foi dado pela presidenta Cristina Kirchner na última segunda-feira (1º).
Surpreendendo quem esperava por um período de luto mais extenso após a morte do marido, considerado o verdadeiro poder instalado na Casa Rosada, sede do governo argentino, a presidenta voltou ao trabalho na segunda-feira logo cedo e à noite, em rede nacional de rádio e televisão, fez um emocionado agradecimento pelas manifestações de pesar e apoio que recebeu ao longo dos três dias do velório de Kirchner.
O súbito reaparecimento da presidenta foi encarado por analistas políticos e jornalistas como uma forma de demonstrar que, apesar do momento doloroso que vive, Cristina Kirchner também está ciente de suas responsabilidades constitucionais e do imenso desafio que tem pela frente, traduzido em duas situações: manter a governabilidade sem o amparo do marido e assumir o comando do Partido Justicialista, que era liderado por Kirchner. Os analistas acreditam que, a partir de agora, todo e qualquer gesto e atitude política da governante deve ser examinado “sob o microscópio”, na busca de interpretações sobre o seu real significado.
Um detalhe no pronunciamento de Cristina Kirchner, na segunda-feira, tem chamado a atenção. Ela se dirigiu especialmente aos jovens argentinos, agradecendo aos milhares que marcharam pelas ruas de Buenos Aires durante os três dias que durou o velório do ex-presidente e que também entraram na Casa Rosada, onde o caixão ficou exposto à visitação pública.
Em setembro, Kirchner foi submetido a uma cirurgia cardíaca de emergência e recebeu orientações de seus médicos para manter repouso e diminuir sua agenda política. Não foram atendidos. Pouco mais de uma semana após receber alta do hospital, Kirchner compareceu ao Luna Park, tradicional ponto de encontro para comícios políticos e shows musicais, onde milhares de jovens filiados ao Partido Justicialista haviam preparado uma manifestação de apoio ao ex-presidente.
O encontro no Luna Park foi interpretado como o primeiro sinal público da disposição de Kirchner de novamente concorrer à Presidência, em agosto de 2011. Agora, a presidenta Cristina Kirchner transforma-se em virtual candidata à reeleição.
De acordo com o analista político Manuel Mora y Araujo, da consultoria Ipsos-Mora y Araujo, a lógica indica que a presidenta será mesmo candidata, pois neste momento não existem nomes alternativos. O analista assegura que mesmo antes da morte de Néstor Kirchner, Cristina Kirchner já estava cotada para a reeleição. Concorrer novamente ao cargo, segundo Manuel Mora, depende exclusivamente dela e não da análise de pesquisas de opinião pública que detectem a vontade da população argentina.
No último fim de semana, numa sinalização de boa vontade política em relação ao governo de Cristina Kirchner, o secretário da União Industrial Argentina (UIA), José Ignacio de Mendiguren, assegurou que “a governabilidade da economia está assegurada”. Mendiguren se reuniu com o dirigente da Confederação Geral do Trabalho, Hugo Moyano, para retomar as discussões sobre a concessão de aumentos salariais para os trabalhadores e a divisão de lucro das empresas, temas que, recentemente, provocaram atritos, distanciamento e quebra do diálogo entre as duas categorias. Agora, segundo declarações de Mendiguren a uma emissora de rádio, empresários e sindicalistas retomarão as conversas, resultantes do convite feito por Hugo Moyano logo após o velório de Kirchner.
Segundo o secretário da UIA, “faremos uma reunião para analisar nosso relacionamento e voltar à nossa história de diálogo, tentando consensos e transmitindo a ideia de que eles são importantes, neste momento, para que as incertezas desapareçam”. José Ignacio de Mendiguren classificou esta futura reunião como um momento histórico na relação entre empresários e trabalhadores argentinos.
Edição: Aécio Amado