Feministas criticam revisão de trecho sobre aborto em programa de direitos humanos

28/01/2010 - 18h44

Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A rede de entidades da sociedade civil que manifestou apoio àterceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3)poderá sofrer fissura se o governo alterar as propostas que defendemdescriminalização do aborto no programa. Ontem (27), em debate noFórum Social Mundial, o ministro da Secretaria Especialdos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, admitiu que “a maneira como o aborto está colocadadeve ser reformulada”. Vannuchi avaliou que o apoio à descriminalizaçãoseria menos polêmico se retirasse o trecho “tendo em vista a autonomiadas mulheres para decidir sobre o seu próprio corpo”.O ministroafirmou que o trecho “corresponde a um ponto de vista que é bandeira domovimento feminista” e admite um “saudável” recuo: "temos humildadepara reconhecer erros”. Segundo Vannuchi, “o próprio presidente Lula,não tem essa visão. Se o presidente não tem, isso evidentemente tem queser mudado”, defendeu.A socióloga e jornalista Angela Freitas,da Articulação de Mulheres Brasileiras, considerou “muito estranhas” asafirmações do ministro. Em sua opinião “se o governo quer retrocedertem que explicar à sociedade”.Para a feminista, a “ameaça deretrocesso não é nova”, lembrando da rejeição na Câmara dosDeputados do Projeto de Lei nº 1135 que retirava o aborto do Código PenalBrasileiro. Segundo Angela Freitas, “não havia naquele momento [2008]ambiente para o debate”; e agora, em ano eleitoral, podem ser restabelecidos “compromissos com o fundamentalismo religioso”.Para a representante do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFMEA) KauaraRodrigues, “as pressões conservadoras são oportunistas”. Ela defende aintegralidade das propostas incluídas no PNDH 3. “O recuo é um contrassenso. Essas propostas são resultado de umprocesso amplo e democrático de consulta e discussão, que não incluiapenas as mulheres.”A integrante do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, Jacqueline Pitanguy, salienta que épreciso verificar como seria a nova redação das propostas sobre oaborto. Ela assinala que o PNDH 3 “é inaugural” ao incluir adescriminalização e que é importante que a temática permaneça, mesmo quehaja uma “acomodação da linguagem".“O que tem acontecido é umprocesso de negociação no contexto de pressões. Os direitos humanos seescrevem com a tinta da luta política”, disse Jacqueline.Emnota publicada este mês de apoio ao PNDH 3, o Conselho Nacional dosDireitos da Mulher manifestou apoio "à justa e corajosa iniciativa deinclusão do tema dos direitos sexuais e reprodutivos no programaexplicitado nos seguintes termos: apoiar a aprovação do projeto de leique descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres paradecidir sobre seus corpos”.Estudo divulgado no ano passadopelo CFEMEA estima que o Brasil registre por ano 250 mil internações demulheres por complicações decorrentes de abortos ilegais. Segundo apesquisa, cerca de 1 milhão de abortos são realizados no paísanualmente.