Marli Moreira
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - Intelectuais, artistas, políticos e representantes de movimentos sociais - integrantes do Tribunal Popular - condenaram hoje (6) o Estado brasileiro a pena máxima por considerá-lo responsável pela violência que atinge a população pobre, principalmente, os negros e índios e omisso na promoção de ações contra a desigualdade social.Aberto na última quinta-feira (4), o fórum teve três sessões com julgamento final encerrado por volta das 15h. O resultado foi uma forma simbólica de mostrar a sociedade a gravidade da situação, segundo explicou uma das coordenadoras do projeto, Angela Mendes de Almeida, historiadora do Observatório das Violências Policiais, vinculado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Segundo Angela, a condenação é contra os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e os agentes do Estado nas três esferas: municipal, estadual e federal. “As execuções sumárias que acontecem nas ruas é um fenômeno observado em vários estados. Por isso trouxemos aqui pessoas do Rio de Janeiro, da Bahia e de São Paulo”, justificou.De acordo com a historiadora, “ a idéia do Tribunal é dar visibilidade a esses crimes que, com pequena diferença, são cometidos usualmente contra as populações pobres, sobretudo negras e indígenas, em vários estados do Brasil”. Ela destacou entre os presentes Wagner Santos, músico sobrevivente da chacina da Candelária e que “hoje vive na Suíça porque se vivesse hoje no Rio, provavelmente, seria vítima de vingança dos policiais”.Almeida relatou ainda que o Tribunal foi criado por influência de ações sociais do gênero em Nova Orleans, nos Estados Unidos, quando, em 2005, ocorreu o furacão Katrina, um dos mais devastadores dos últimos tempos. "Lá, os negros pobres foram completamente marginalizados no processo de reconstrução e apenas os ricos mereceram a atenção do Estado”, contou. Para ela, o “ Estado democrático de direito só serve para a classe média e para os ricos, os pobres são violentamente reprimidos dos seus direitos fundamentais, sobretudo do direito à vida. São violentados cotidianamente." Um dos interlocutores do movimento norte-americano, em torno desse episódio em Nova Orleans, compareceu ao encontro. Kawame Kalimari, do grupo Malcon X Grass Roots Movement ,aproveitou a participação para defender a retirada das tropas brasileiras do Haiti. Durante o ato, foi feita uma homenagem ao garoto de 8 anos, Matheus Rodrigues, morto com um tiro que, segundo testemunhas, teria sido disparado por policiais militares, na Baixa do Sapateiro, Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.O promotor do Tribunal, Plínio de Arruda Sampaio, presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) e diretor do Correio da Cidadania, concluiu que “o Estado precisa ser condenado por não ser um estado justo, ele criminaliza o pobre, é imparcial, ficando apenas de um lado da sociedade e precisa ser de todos. Esta é a razão da condenação: o comportamento do Estado por omissão, impondo sofrimentos desnecessários à gente pobre”, disse Sampaio.Na análise do jurista, para que a sociedade venha a ter direitos iguais há que se percorrer um longo caminho que passa, fundamentalmente, por uma mudança no regime de governo, passando do capitalismo para o socialismo. Ele, no entanto, admite que não há menor chance de uma mudança nesse sentido, no curto prazo."Mas, se for desenvolvido um trabalho, ao longo de décadas, o povo brasileiro pode se convencer de que é melhor viver em uma sociedade de iguais.”O único representante de nível estadual foi o promotor Roberto Tardelli, do Tribunal do Júri de São Paulo, que reconheceu existir crimes contra a humanidade, mas pediu pena atenuante contra o Estado. Participaram do corpo de jurados:- Cecília Coimbra, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de janeiro- José Guajajara, militante do movimento indígena, membro do Centro Étnico Conhecimento Sócio-Ambiental Cauiré- Ivan Seixas, diretor do Fórum Permanente de Ex-Presos e Perseguidos Políticos de São Paulo- José Arbex Jr., jornalista e escritor- Marcelo Freixo, deputado estadual P-SOL/RJ- Marcelo Yuka , músico e compositor- Maria Rita Kehl, psicanalista e escritora- Paulo Arantes, professor de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP)- Wagner Santos, músico sobrevivente da chacina da Candelária- Waldemar Rossi, militante da Pastoral Operária e do Movimento de Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo- Adriana Fernandes, presidente da Associação de Familiares e Amigos de Presos da Bahia (Asfap/BA)- Dom Tomás Balduíno, bispo emérito da cidade de Goiás e conselheiro permanente da Comissão Pastoral da Terra (CPT)