Embaixador paraguaio defende fim da assimetria nas relações do Mercosul

08/04/2008 - 17h57

Ana Luiza Zenker
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Nesta quarta e últimaparte da entrevista à Agência Brasil, oembaixador do Paraguai no país, Luis Gonzalez Arias, falasobre o Mercosul, a integração entre os paísesda América do Sul e as reivindicações de apoioao desenvolvimento econômico do Paraguai e do Uruguai,apresentadas ao Brasil e à Argentina. “O que o Paraguai e oUruguai reclamam são medidas específicas para permitirque os países menores fiquem em melhores condiçõesde se integrar no Mercosul”, diz.No próximodia 20, os paraguaios escolherão quem vai substituir NicanorDuarte na Presidência do país nos próximos cincoanos. Mais de 2,8 milhões de eleitores irão àsurnas, segundo dados da Justiça Eleitoral da Repúblicado Paraguai. A previsão é que o resultado oficial sejadivulgado no dia 23 de maio. A posse do novo presidente seráem agosto.Agência Brasil: O Paraguai e o Uruguaisempre reclamaram que havia muita assimetria na questão docomércio no Mercosul. As reivindicações paramudar isso continuam?Gonzalez Arias: Sim, continuam. E nãoé uma questão só de comércio. Éassimetria mesmo, no desenvolvimento dos países e nas áreasindustrial, de produção, de transporte da mercadoria ede financiamento. O que o Paraguai e o Uruguai reclamam sãomedidas específicas para permitir que os países menoresfiquem em melhores condições de se integrar noMercosul, de ser sócios. Não buscamos só aintegração econômica, mas também políticae cultural. Então se criaram algumas mecanismos, como o Focen(Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul). Ele tem algumasmedidas sociais interessantes, de infra-estrutura, mas é umprograma pequeno. As necessidades dos países são muitomaiores. E o que vai melhorar e, conseqüentemente, diminuir aassimetria é a facilidade do comércio, o livre trânsitode mercadorias. Falamos de mercadorias da nossa região, émuito difícil neste momento, porque temos os mesmos produtos,competimos em mercados aqui dentro do Mercosul. O erro principal atéagora é que o Mercosul buscou negociar entre si, e nãopara um mercado externo. Nós precisamos trabalhar juntos paraum mercado externo, fora do Mercosul. Produzimos quase as mesmascoisas e acabamos competindo entre nós.ABr: Aidéia é negociar como bloco com outros mercados?Arias:Sim. Aliás, é o que estamos fazendo neste momento nasnegociações com a Rússia, com outros grupos deintegração, com a Comunidade Andina de Nações,Israel, grupos árabes. Está começando, temos umasérie de reuniões com a Índia, África doSul e outros países para melhorar o nosso comércio, maspara isso precisamos ter uma política macroeconômicacomum. E trabalhar juntos, sobretudo, nos setores industriaiscompetitivos para exportar um produto Mercosul.ABr: Seria ocaso de estabelecer uma política industrial regional paradesenvolver alguns setores? Por exemplo, Brasil e Argentina produzemcarros. O que mais falta produzir?Arias: Umapolítica automotiva comum. O Uruguai produz autopeças.O Paraguai também quer entrar na produção deautopeças para a indústria brasileira, sistemas defreios, baterias, partes plásticas do veículo. Entrosaressas indústrias. O Uruguai vende autopeças ao Brasil.O Paraguai quer colocar motos, até certa capacidade, de 100,125 cilindradas, e o resto fica para o Brasil. Estamos negociando. Adelegação paraguaia viajou na semana passada a Manaus.Precisamos homologar os sistemas para poluição,segurança etc. Estamos trabalhando, mas isso não se fazem um ano, dois. Devemos ter políticas de longo prazo,financiamento e regras claras e fixas.ABr: Agreve dos fiscais da Receita Federal brasileira está causandoproblemas ao Paraguai?Arias: Sim.Nós estamos com problemas na fronteira com o Brasil, porque osinspetores da Receita Federal estão em greve e temos filas decaminhões com mercadorias em ambos os lados. O Paraguai compramuito do Brasil, a maior parte dos produtos vendidos nossupermercados paraguaios é brasileira. Temos tambémargentinos, mas o Brasil é o principal fornecedor de alimentosindustrializados para o Paraguai. Com exceção de carne,lácteos e algum outro produto, a indústria paraguaianão tem capacidade de atender todo o mercado. Por isso,compramos do Brasil.ABr: Já está havendodesabastecimento?Arias: Ainda não, porque oParaguai tem a facilidade de importar também da Argentina, masos produtos brasileiros estão começando a acabar nasprateleiras.ABr: E o bloqueio das estradasargentinas?Arias: Não afeta o Paraguai, porque nãousamos as estradas, utilizamos o Rio Paraguai. Mas estamos com esseproblema e ninguém resolve. Não é a Receita,não. É o Ministério do Trabalho, mas o problemaestá aí, as pessoas estão perdendo dinheiro, amercadoria está apodrecendo.ABr: Em relaçãoà integração sul-americana, há algunsproblemas no continente, especialmente entre Colômbia eEquador. Qual é a visão do Paraguai em relaçãoà possível integração entre os paísesdo continente?Arias: O trabalho da Unasul (União deNações Sul-Americanas) é para isso. Estamosneste momento trabalhando as regras para a Unasul e depois temos queaprofundar. Ou vamos continuar o aprofundamento do Mercosul ou aUnasul vai substituí-lo. O problema é que alguns dospaíses do grupo andino têm acordos especiais, têmacordo de livre comércio, como a Colômbia, que estáquerendo aprovar um acordo com os Estados Unidos. O Chile tem acordode livre comércio com quase todo mundo, tem a tarifa externacomum muito mais baixa do que o resto dos países. Paraintegrar em um mercado comum não é tão fácil.Mas a idéia é unificar e criar Unasul, uma unidade dosdez países da América do Sul.ABr: Masesses problemas diplomáticos que têm ocorrido nãopodem dificultar a integração?Arias: Podemdificultar, mas Colômbia e Equador é um incidente, nãoé uma coisa permanente. A Venezuela tem um comércioenorme com a Colômbia, um depende muito do outro. O Equadortambém tem [um comércio intenso] com aColômbia, com países vizinhos. Eu acho que essesincidentes políticos são situaçõestransitórias. Vamos encontrar soluções com oandamento das negociações e o aprofundamento dacooperação entre os países. E nisso o Brasil temum papel muito importante, por sua liderança. É ummercado grande. A Argentina também, a Venezuela idem. Isso éo importante.ABr: E em relaçãoespecificamente às eleições de daqui a duassemanas? Existe uma possibilidade de o Partido Colorado nãoeleger o presidente.Arias: Depende. Hoje, de acordo com aspesquisas, quem tem maioria é Lugo [Fernando, candidatopela Aliança Patriótica para a Mudança], maseleição se ganha com votos. E o Partido Colorado ébem organizado, é um partido que tem 60 anos no poder, temexperiência. O grupo de Lugo é um grupo de um partidoque é organizado, que é o Liberal, mas não seise tem possibilidade real de vencer as eleições. Mas dequalquer jeito, se ganhar o Lugo, ou o Partido Colorado ou a Unace(União Nacional dos Cidadãos Éticos, docandidato Lino Oviedo) será preciso fazer uma aliançapara poder ter governabilidade. Sem aliança, não haverágovernabilidade, porque ninguém vai chegar aos 50% do votos.No máximo, 35%, 40%.ABr: Qual é aimportância dessa eleição especificamente, comessa campanha mais acirrada?Arias: A campanha estámais acirrada porque é a primeira vez que há apossibilidade real de o Partido Coloradoperder a Presidência da República. Isso seria umanovidade. Mas, por enquanto, temos que esperar o dia 20 de abril paraver quem vai conseguir mais votos. Essa é a realidade.