Índios dizem não esperar avanços na proteção do saber tradicional

27/03/2006 - 13h53

Thaís Brianezi
Repórter da Agência Brasil

Pinhais (PR) – A proteção aos conhecimentos tradicionais é um dos principais temas em debate na 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-8). A partir de hoje (27), metade dos 3,6 mil representantes de 173 países se dedicam ao estudo do assunto.

No entanto, o Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual (Inbrapi) declara não acreditar que as discussões avancem para a construção do regime internacional de acesso a recursos genéticos e benefícios compartilhados.

"O texto está completamente entre colchetes, o que significa discordância entre os países, especialmente o grupo desenvolvido em oposição aos megadiversos", revela a secretária executiva do Inbrapi, Fernanda Kaingang. "As novas regras só se tornarão válidas se houver consenso. Nossas expectativas são baixas. E daqui para frente serão cada vez menores."

A COP-8 tem o desafio de aprovar um programa de trabalho para a construção desse regime internacional. São esperadas decisões sobre o poder vinculante ou não do regime (ou seja, se será obrigatório ou apenas sugestivo). Também está em discussão o acesso exclusivo aos recursos genéticos e a repartição de benefícios, além do acesso aos processos e produtos derivados.

"O Brasil costuma se posicionar favoravelmente a que o regime internacional regule apenas a repartição de benefícios", lembra a secretária-executiva da Inbrapi, advogada e mestranda em Direito da Universidade de Brasília (UnB). "A repartição precisa ser um sistema internacional, porque não temos como obrigar uma empresa que produza no Japão a dividir seus lucros".

Apenas 14 dos 187 países signatários da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) possuem legislação nacional que regula o acesso aos recursos genéticos e ao conhecimento tradicional associado.

Entre eles está o Brasil, onde desde 2001 o tema é objeto de uma medida provisória, criticada pela Inbrapi por não reconhecer a titularidade dos povos sobre os recursos e permitir que o governo catalogue o saber indígena, sem consulta às comunidades.

Na semana passada, a ministra Marina Silva anunciou um projeto de lei que prevê a criação de um fundo para repartir os recursos resultantes do acesso aos conhecimentos tradicionais. O fundo também é visto com ressalva pela Inbrapi, que não reconhece nenhuma entidade nacional capaz de gerir o fundo.

Criada em 2003 como organização não-governamental, o Inbrapi trabalha na capacitação das lideranças indígenas no setor legislativo e jurídico.