Mylena Fiori*
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - O Plano Plurianual (PPA) do governo federal, atualmente em trâmite no Congresso, e a nova política industrial brasileira, lançada este ano, foram apontados como exemplo de estratégias alternativas para o desenvolvimento econômico dos países latino-americanos. "Do ponto de vista do vazio que existe na América Latina em termos de estratégias, os documentos devem ser lidos", afirmou o representante da CEPAL (Comissão Econômica das Nações Unidas para América Latina e Caribe), Ricardo Bielchowsky, em debate realizado na tarde deste sábado, na Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento - Unctad XI.
Como exemplo de estratégia, Bielchowsky mencionou a formação de um mercado de consumo de massas, constante do PPA. A necessidade de atenção ao mercado interno apareceu como consenso entre os debatedores. Segundo o ex-ministro da Fazenda Luis Carlos Bresser Pereira, o caminho para alcançar essa meta passa pela exportação. "O único jeito de fazer crescer o mercado interno é exportar", afirmou.
A Oficina sobre Estratégias Econômicas Alternativas para a América Latina reuniu especialistas de todo o mundo para debater o tema. "Na década de 80, o Norte nos disse que, para crescermos, deveríamos ajustar nossas contas e fazer reformas. Depois, naquilo que poderia se chamar de o Segundo Consenso de Washignton, disseram que a abertura de capital para a formação de poupança externa era a solução para todos os nossos problemas. A idéia foi comprada pela elite latino-americana como verdade", explicou Bresser,em apresentação que abriu os debates deste sábado.
Bresser lembrou que, dos anos 30 aos anos 80, empurrado pelo nacionalismo, o desenvolvimento da América Latina foi "surpreendente". "As circunstâncias mudaram e o modelo se extinguiu, não é mais tempo de proteção da indústria e do comércio e, sim, de negociações. O governo brasileiro está fazendo um excelente trabalho neste sentido", avaliou Bresser. No entanto, ele enfatizou que, em um aspecto, a economia brasileira ainda necessita de certa proteção: "É preciso proteger o Brasil dos fluxos de capital, extremamente perigosos para qualquer país em desenvolvimento".
O único país latino-americano que conseguiu crescer nos anos 90 foi o Chile, pois impôs controle à entrada de capital estrangeiro, enfatizou Bresser. Da mesma forma, os países asiáticos, que tampouco aceitaram a estratégia de Washington. "Crescer com poupança estrangeira é ter déficit em conta corrente e aumentar a dívida", afirmou. "É impossível crescer assim", concluiu Bresser Pereira.
Apesar do elogio ao Chile, na opinião do ex-ministro, o movimento brasileiro de aumentar as reservas em dólar, iniciado pelo Banco Central em julho do ano passado, é também um caminho correto e o mais indicado para o Brasil no momento para resolver o problema da vulnerabilidade externa.
Ridículo
Por outro lado, para Bresser, movimentos como a proposta de Taxa Tobin, que incidiria sobre o fluxo internacional de capitais, são "ridículos". A descrença do ex-ministro na capacidade de influir sobre o mercado financeiro mundial não foi consensual. "Não é razoável esperar que América Latina e Caribe influenciem a arquitetura financeira externa, mas alguma coisa tem que ser feita para afetar as regras internacionais nas relações financeiras", afirmou Renato Baumann, também da CEPAL.
Os efeitos negativos da abertura de capital também foram mencionados por Ricardo Bielchowsky. "Há uma semelhança entre os diagnósticos da CEPAL e da UNCTAD para a América Latina. Ambas concordam que as reformas impactaram de forma negativa na estrutura produtiva. Também concordam que o clima de incerteza gerado pela abertura de capital inibe os investimentos", disse. "Em muitos momentos, a microeconomia pode ser beneficiada com a abertura de mercado e a privatização, mas isso pode ter efeitos prejudiciais à macroeconomia", explicou.
Bielchowsky também lembrou que o Chile foi o único país a adotar estratégia alternativa ao Consenso de Washington. Foi então que sugeriu a leitura do PPA e da nova política industrial brasileira. "No papel, o Brasil tem dois documentos importantes para um plano nacional de
desenvolvimento. Pelo menos do ponto de visto conceitual, isto está instrumentalizado", enfatizou.
Ignacy Sachs, professor da Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales de Paris, sugeriu a criação de um novo modelo para a América Latina, uma vez que os modelos implementados em outros países "não são inspiradores". Sachs propõe um modelo fundamentado no mercado interno, que simultaneamente leve em conta a inclusão social, a manutenção dos recursos naturais e o desenvolvimento sustentável.
Segundo Sachs, estes são os pontos cruciais na discussão do desenvolvimento. "A Ásia não é um bom exemplo. A Índia, por exemplo, teve industrialização e modernização rápida, mas com muita exclusão social e concentração de riqueza. Não é o tipo de crescimento que quermos ter", avaliou. Segundo Sachs, serviços, construção civil e políticas de financoamento mais flexíveis são áreas que mereciam um ollhar atento do governo. Sem esquecer, claro, áreas apontadas por ele como prioritárias: moradia, educação e saneamento.
* colaborou Spensy Pimentel