Brasília, 28/4/2003 (Agência Brasil - ABr) - A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, fez pronunciamento hoje, na 11ª Sessão Anual da Comissão de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, em Nova Iorque (EUA). Segue a íntegra.
"A Delegação do Brasil associa-se ao pronunciamento do Ministro do Meio Ambiente do Marrocos, em nome do Grupo dos 77 e China. Gostaríamos, também, de agradecer ao Secretariado pela preparação do relatório sobre a organização e programa de trabalho da Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável.
Senhor Presidente,
É grande a responsabilidade com que nos encontramos hoje. A primeira reunião da
Comissão de Desenvolvimento Sustentável após a Cúpula de Joanesburgo nos coloca
frente ao enorme desafio de efetivamente reduzir o substantivo déficit de implementação
dos compromissos que os Estados-Membros das Nações Unidas assumiram nos últimos
anos. É passada a hora da retórica com que temos nos comportado em relação a acordos,
convenções e demais compromissos internacionais. É a hora de respondermos às
críticas aos resultados da Cúpula de Joanesburgo. A comunidade internacional nos pede ação.
Trata-se de um momento de forte inflexão na historia da CSD. Desde a sua criação, houve
poucos progressos nas respostas que a Comissão deu a suas atribuições de assegurar
um efetivo seguimento da Rio-92 e examinar o progresso na implementação da Agenda-21.
Da mesma maneira, a Comissão não evoluiu muito em seu papel de promover o
aperfeiçoamento do processo decisório intergovernamental.
Vivemos um momento de crise sem precedentes do sistema multilateral, quando o papel das Nações Unidas tem sido questionado e os rumos do multilateralismo para o futuro não parecem claros. Fortalecer a CSD e definir formas e instrumentos para que cumpra bem a
sua missão é uma maneira inteligente não só de evoluir em direção ao desenvolvimento
sustentável como, também, de prestigiar e reforçar a importância do sistema das Nações
Unidas.
Do ponto de vista do Brasil, sede da Confererência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992, a Cúpula sobre Desenvolvimento Sustentável realizada em Joanesburgo, no ano passado, teve inegáveis resultados positivos. A consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável, lançado na Conferência do Rio há mais de dez anos, e hoje reconhecido e abraçado como objetivo comum da comunidade internacional, terá sido talvez um
dos resultados mais significativos. Joanesburgo teve o mérito, também, de reafirmar a validade dos princípios e das conquistas da Rio 92 e de renovar uma parceria internacional baseada em objetivos comuns, que aproximam países desenvolvidos e em desenvolvimento na promoção do
desenvolvimento sustentável em todos os níveis " local, nacional, regional e global.
Não são poucas, no entanto, as críticas, especialmente por parte da sociedade civil organizada, de que avançamos pouco em Joanesburgo. É certo que avançamos tanto quanto poderíamos justificar em vista da complexidade dos temas e da enorme variedade social, econômica, cultural,
ambiental dos países. Contudo, em alguns pontos, usamos nossa energia apenas para garantir a permanência de avanços já alcançados na Rio-92, mais do que para promover novos avanços significativos. Por isso, entre muitos, resta ainda a sensação de que pouco se realizou em Joanesburgo. Por esse mesmo motivo, chamo a atenção para a particular importância de que se reveste esta nossa reunião.
Para o Brasil, a Cúpula de Joanesburgo pode, se efetivamente conseguirmos avançar na
implementação dos compromissos ali aprovados, representar a renovação do compromisso com a cooperação, com a troca de experiências e lições aprendidas, e com a apoio internacional à capacitação dos países menos favorecidos de forma a integrá-los à economia internacional. Joanesburgo testemunhou o lançamento de novas parcerias para o desenvolvimento de projetos de cooperação que contribuam para um futuro em que a conservação e o uso sustentável dos
recursos naturais sejam a regra, em que os padrões de consumo e produção sejam
sustentáveis e em que a pobreza tenha sido reduzida de forma drástica em escala global.
Joanesburgo propiciou, além disso, um grande estímulo à participação de atores não-
governamentais, representantes de diversos segmentos " ONGs, setor privado, comunidades acadêmica e científica, entre outros -, num reconhecimento explícito da importância e necessidade de contar com o envolvimento e esforços de todos os atores
sociais para alcançar as metas do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza. Contudo, sem abdicarmos do papel irrenunciável que cabe aos Estados no âmbito do sistema multilateral, é fundamental perseguir formas e instrumentos para que esses atores possam, de fato, estar incluídos no processo decisório em que estamos envolvidos, e não sejam utilizados apenas para legitimar as decisões que tomarmos em nome da população do planeta.
Hoje, transcorridos mais de dez anos da Conferência do Rio e consolidado o arcabouço
conceitual originado em 92, trata-se de dirigir o debate para a implementação das ações,
compromissos e objetivos acordados na Agenda 21 e no Plano de Implementação de Joanesburgo. O centro das deliberações da nova CDS deve ser propostas concretas que
envolvam projetos, programas e mecanismos que promovam a implementação do
desenvolvimento sustentável. Não se trata apenas de dar ênfase à implementação no nível
retórico, mas - sim - de trabalhar e pensar de uma maneira mais criativa e, sobretudo,
pragmática, que leve a resultados concretos e tangíveis.
Senhor Presidente,
O programa de trabalho da CDS deverá ser abrangente e incluir a revisão da implementação do conjunto de ações e objetivos previstos nos documentos-base: a Agenda 21 e o Plano de Implementação de Joanesburgo. O foco das deliberações deve ser, sem dúvida, a mplementação. Será preciso identificar para cada ação e objetivo as responsabilidades respectivas e os meios que possibilitem a execução dos compromissos.
Há muito o que evoluir nessa direção. É fundamental que as discussões que se iniciam
hoje possam ir além da esfera ambiental. Gostaria que, juntamente com a grande maioria de elegados aqui presentes ligados à área de meio ambiente, tivéssemos aqui também um maior número de representantes, no mais alto nível, de setores governamentais sem os quais não se podem aprofundar mudanças substantivas nos modelos de desenvolvimento. Como bem disse o Secretário-Geral em seu relatório, um contínuo engajamento político de alto nível na CSD é essencial se se pretende que as mudanças que aqui discutimos gerem os resultados desejados.
Não podemos esperar pela Rio+20 para lidarmos com os sérios problemas sociais e ambientais causados por um modelo de desenvolvimento que tem-se revelado injusto e excludente. A máxima a nos guiar deve ser a de que, dentro de dez anos, tenhamos um saldo bem mais positivo do que temos hoje em termos da consecução de nossos objetivos comuns: um modelo de esenvolvimento que seja econômica, social, cultural e ambientalmente sustentável e um futuro mais promissor para todos os habitantes do Planeta".