Liésio Pereira
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – Os primeiros dekasseguis – brasileiros descendentes que foram para o Japão a partir da década de 1980 – pensavam apenas em estudar ou juntar dinheiro e voltar para o Brasil.
Segundo pesquisa do Centro de Estudos Japoneses, dos brasileiros que migraram para o Japão em 1993, 20% eram estudantes, 8% comerciantes, 6% bancários e 4% agricultores. A maioria tinha formação superior: 62% exerciam, no Brasil, profissões como as de médico ou engenheiro. Atualmente, só há mais coreanos e chineses no Japão do que brasileiros.
Sandra Ayumi Iamamura, brasileira de nascimento, morou nove anos no Japão. Primeiro, passou uma temporada no país como estudante e, só depois, retornou para trabalhar. "Ganhei uma bolsa de estudo do governo japonês e fui como estudante bolsista. Retornei ao Brasil justamente na época em que o fenômeno dekassegui estava começando, em 88, 89", conta. "Tempos depois, como uns familiares iam (para o Japão), resolvi ir também. Como já tinha conhecimento da língua japonesa, pensei que, para mim, não teria tanto problema. Embarquei com sete pessoas e já fui (trabalhar) diretamente para uma fábrica de relógios".
De imediato, Sandra sofreu dificuldade na integração com os japoneses nativos. Ela revela que os dekasseguis têm mais problemas que os outros imigrantes. "É complicado, porque eles não consideram a gente nem como japonês, nem como estrangeiro. Vêem que a gente tem cara de japonês, então teria obrigação de falar japonês. Não era o meu caso, mas com a maioria dos meus amigos era assim", diz.
No trabalho, ela conta que não teve problemas com direitos trabalhistas, no início. Sandra não foi para o Japão por meio empreiteira (empresa especializada em levar mão-de-obra terceirizada), mas por um intermediário (cidadão japonês que negociava as contratações de estrangeiros para empresas japonesas). "Na empresa em que trabalhei era bem organizado. O contrato era direto, não era através de empreiteira. (ao chegar). A gente já foi inscrito no seguro social. Tínhamos que pagar o seguro social e os impostos municipais. Era descontado diretamente no holerite. As horas extras também eram pagas direitinho. Tinha assistência médica, enfermeira, na empresa – e a gente pagava o seguro médico, que já estava incluído no seguro social", lembra.
Cinco anos depois, a mudança administrativa na empresa foi um dos motivos de sua decisão em retornar para o Brasil. "Os salários estavam ficando baixos, as horas extras foram ficando escassas. A empresa onde eu estava ‘terceirizou’, começou a passar o trabalho para empreiteiras. Terminou o contrato direto e eu preferi sair", explica.
Keiko Bailone, jornalista, viveu a experiência de mudar para o Japão por intermédio de uma empreiteira. Em 1993, curiosa pela ida de vários descendentes e incentivada por irmãos, primos e outros parentes, decidiu contratar os serviços de uma empreiteira. Ao chegar, em meio a um inverno rigoroso, foi encaminhada para uma província de Nagano, onde trabalhou em uma fábrica de autopeças e outra de produtos eletrônicos. Segundo ela, foi uma "experiência traumática".
"Quem manda no Japão são os japoneses. Nós somos os de fora, os que chegaram para fazer um trabalho que eles chamam de três K: kiken (perigoso), kitanai (sujo) e kitsui (pesado)", observa.
A jornalista só decidiu permanecer no Japão porque conseguiu, por conta própria, um emprego no jornal International Press. No período de dois anos em que viveu no país, ela recorda que, ao contrário do que se poderia esperar, a geração que fez o caminho contrário ao de seus pais e avós não tem expectativa de permanecer no Japão. "Pelas entrevistas que eu fazia, todos – principalmente os mais jovens – tinham a idéia de ganhar um dinheirinho e voltar para o Brasil, porque achavam que lá levavam uma vida sem lazer, muito difícil", ressalta.