Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – Campanha do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) pretende reunir 1,7 milhão de assinaturas para propor, por meio de projeto de lei de iniciativa popular, limites às propagandas de cerveja. A petição pública foi apresentada hoje (13) em audiência na sede do MP na capital paulista. As assinaturas também serão recolhidas pela internet.
O documento propõe alterações na Lei 9.294/96, que só restringe publicidade de bebidas com teor alcoólico acima de 13 graus Gay-Lussac (ºGL), a exemplo do uísque e da cachaça. O limite passaria a 0,5 ºGL. De acordo com a Constituição, a apresentação de projeto de lei de iniciativa popular deve ser subscrito por, no mínimo, 1% do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco estados, entre outros requisitos.
Caso a proposta seja aprovada, assim como ocorre com bebidas de concentração alcoólica mais forte, não poderá haver propaganda de cervejas e vinhos nas emissoras de rádio e TV fora do horário das 21h às 6h. Além disso, não será possível associar esses produtos, por exemplo, ao esporte olímpico ou de competição, ao desempenho saudável de qualquer atividade e à condução de veículos.
“Não tem sentido a lei deixar de fora a cerveja que é a bebida mais consumida no país. Já está na hora de a sociedade se mobilizar para equiparar a cerveja a todas as bebidas que já sofrem restrição. Nossa proposta é uma ampla mobilização no país para sensibilizar o Congresso Nacional a modificar a lei”, explicou Jairo Edward de Luca, promotor de Justiça da Infância e Juventude de São Bernardo do Campo (SP).
De Luca, que encabeça a iniciativa, informou que várias entidades já aderiram à campanha, como Conselho Federal de Medicina, Conselho Federal de Farmácia, Fundação Criança de São Bernardo do Campo, Instituto Alana, Aliança de Controle ao Tabagismo, Pastoral da Sobriedade e Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. “Vamos fazer novas reuniões e batalhar por novos parceiros. A gente acredita que vai ter resistência no Congresso Nacional, mas com a mobilização devemos conseguir”, avaliou.
A proposta tem como objetivo desestimular o consumo do produto por crianças e adolescentes. De acordo com o professor Ronaldo Laranjeira, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), 46% de toda a bebida vendida no país são consumidos por jovens de até 29 anos. Cerca de 6% desse total são consumidos por menores de 18 anos, segundo levantamento nacional domiciliar coordenado pelo pesquisador.
“O álcool é a droga mais utilizada pelos jovens, mais do que cocaína e maconha. É a droga de começo, é a que tem mais oferta, mais propaganda e mais facilidades”, avalia. Ele informou ainda que 90% dos adolescentes conseguem comprar bebidas alcoólicas sem problemas.
A professora Ilana Pinsky, também da Unifesp, aponta que a exposição à publicidade de álcool, especialmente quando se trata de crianças e adolescentes, cria conceitos distorcidos sobre o uso da bebida. Ela cita como exemplos a construção de uma visão positiva do típico consumidor de álcool, a difusão de atitudes positivas relacionadas ao beber, a construção da ideia do beber como onipresente na sociedade e a ampliação da predisposição de menores a beber antes da idade legal, com o recrutamento de gerações de potenciais bebedores.
Usando dados de pesquisa nacional sobre consumo de álcool feita em 2012, a professora diz que 80% dos adolescentes com idade entre 14 e 17 anos foram expostos a publicidade de bebida nos últimos 30 dias. O percentual sobe para 86% na faixa etária de 18 a 25 anos. “A publicidade é indireta, sutil e cumulativa. São anos e anos em que crianças e adolescentes têm a propaganda como instrumento de informação sobre o álcool”, criticou.
O jurista Dalmo de Abreu Dallari, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), destacou que a proposição de leis de iniciativa popular são importantes não só pelo resultado que geram, mas também pelo processo de discussão e debate que desencadeiam. “São entidades que já desenvolvem algum trabalho nesse sentido, mas que vão intensificar sua atuação para conseguir o envolvimento da população em torno do tema”, apontou.
O professor destacou também que, caso seja aprovada, a proposta será a quinta lei criada por meio da iniciativa popular. “A primeira, em 1994, definiu como crime hediondo a chacina por esquadrão da morte. Em seguida, tivemos aprovada a cassação de mandato quando comprovada compra de votos. Tivemos ainda a criação do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social, em 2005. E a quarta foi a Lei da Ficha Limpa”, enumerou.
Edição: Davi Oliveira