Brasil está atrás de muitos países da região quanto a abolir a Lei da Anistia, diz Anistia Internacional

12/05/2011 - 21h01

Daniella Jinkings
Repórter da Agência Brasil

Brasília – Duas semanas após a visita do secretário-geral da Anistia Internacional, Salil Shetty, ao Brasil, a organização divulgou hoje (12) o Informe 2011: O Estado dos Direitos Humanos no Mundo. O  documento mostra um panorama dos direitos humanos em diversos países, inclusive no Brasil. Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, o especialista da Anistia Internacional Patrick Wilcken afirmou que o país ainda apresenta inconsistências em relação aos direitos humanos e é um dos mais atrasados da região a respeito da abolição e reinterpretação da Lei da Anistia.

Agência Brasil – O senhor visitou o Brasil em outubro para saber como está a situação dos direitos humanos no país. Como foi a visita? O senhor conversou com representantes do governo, movimentos sociais, associações de moradores e dos povos indígenas?
Patrick Wilcken - A Anistia Internacional visitou o Brasil em outubro do ano passado, quando nos encontramos com várias autoridades estaduais, representantes de organizações não governamentais (ONGs) e movimentos sociais. Também visitamos várias comunidades sob ameaça de despejo. Uma delegação de alto nível, chefiada pelo secretário-geral Salil Shetty, também visitou o Brasil há duas semanas, no fim de abril. Durante a visita, Salil Shetty ouviu denúncias de violência policial e acusações de despejos forçados na comunidade de Cidade Alta, na Ilha do Governador, perto do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro. O senhor Shetty também se reuniu com ministro Antonio Patriota [das Relações Exteriores] para discutir os planos da Anistia para abrir um escritório no Brasil.

ABr – A presidenta Dilma Rousseff tem ressaltado os direitos humanos como uma das prioridades de governo. Como o senhor avalia a questão dos direitos humanos no país?
Wilcken – O que a Anistia Internacional tem visto até agora é que há algumas inconsistências sobre o assunto. No lado positivo, o governo pareceu mudar sua posição sobre o Irã, apoiando o envio de um relator especial sobre os direitos humanos ao país. O governo também apoiou a criação de um mecanismo de prevenção contra a tortura, em conformidade com o Protocolo Facultativo da Organização das Nações Unidas. Mas o governo reagiu de forma muito negativa em relação as medidas cautelares emitidas pela Comissão Interamericana da Organização dos Estados Americanos (OEA) de pedir a suspensão do licenciamento do projeto da Hidrelétrica de Belo Monte até que as consultas com os potencialmente afetados pelo projeto sejam feitas. A resposta do governo ameaça minar a autoridade do sistema interamericano, que continua a ser o mais importante fórum dos direitos humanos na região.

ABr - As comunidades indígenas são uma das que mais sofrem no país. Eles reclamam constantemente da falta diálogo com o governo. A situação também é grave no estado de Mato Grosso do Sul, onde as comunidades Guarani-Kaiowá sofrem perseguições constantes por pistoleiros contratados por fazendeiros locais. O que os povos indígenas disseram à organização?
Wilcken - A Anistia Internacional visitou comunidades Guarani-Kaiowá em várias ocasiões ao longo dos últimos anos. Eles disseram que, acima de tudo, o que querem é que seus direitos constitucionais sejam respeitados em relação às suas terras ancestrais. Eles também querem justiça, incluindo a investigação aprofundada e independente em todos os casos de violência contra suas comunidades e de segurança para eles e suas famílias contra ataques futuros.

ABr - A criação da Comissão Verdade é outra questão que vem sendo discutida há quase um ano. O senhor acredita que esta comissão será instalada sem conflitos entre a sociedade, o governo e os militares?
Wilcken – O Brasil está atrás do resto da região como um dos poucos países que não aboliram ou pelo menos não reinterpretaram a sua Lei de Anistia. A Anistia Internacional opõe-se às anistias, pois, segundo o direito internacional, elas não são válidas para crimes contra a humanidade, como tortura e desaparecimento. Mesmo que essa ideia dos movimentos para criar uma Comissão da Verdade seja bem-vinda, a Anistia Internacional exige não apenas a investigação sobre o que aconteceu, como a divulgação completa dos arquivos militares e reparação integral às vítimas, parentes, mais a abertura de processos contra agentes do Estado por tortura e desaparecimentos.

A Secretaria Nacional de Direitos Humanos informou que só vai se pronunciar sobre o documento da Anistia Internacional amanhã (13).

 

 

Edição: Aécio Amado