Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - O Tribunal de Justiçade São Paulo extinguiu hoje (23) o processo movido pelafamília do jornalista Luiz Eduardo Merlino contra o coronelreformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra,ex-comandante do Destacamento de Operações deInformações do Centro de Operação deDefesa Interna (Doi-Codi), do 2º Exército, em SãoPaulo. Por dois votos a um, osdesembargadores acataram o recurso – denominado agravamento derecurso - apresentado pelos advogados de Ustra, que pedia a suspensãodo processo. O julgamento ocorreu no início da tarde de hoje.A votaçãoestava empatada. Em junho, o relator desembargador Luiz AntônioGodoy havia votado pelo acolhimento do recurso e o desembargadorCarlos Augusto de Santi Ribeiro, em agosto, votou contra. Hoje (23),o relator e o desembargador mantiveram seus votos, cabendo odesempate ao desembargador Hamilton Eliot Akel, que tambémvotou favorável ao agravamento de recurso, julgando o processoextinto, sem julgamento de mérito. Agora, cabe aos familiaresde Merlino recorrerem ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). De acordo com oprocesso, o jornalista Merlino militava no Partido OperárioComunista (POC) em 1971, quando foi detido. Levado ao Doi-Codi, entãocomandado por Brilhante Ustra, foi torturado e assassinado aos 23anos. A açãomovida pela família de Merlino é uma açãocivil declaratória, que responsabiliza o militar pela morte,sem no entanto condená-lo a multa ou prisão. Segundo o advogadoFábio Konder Comparato, que representa os familiares deMerlino, os desembargadores declararam a ação extintaalegando “que não cabia a ação declaratória”.“É uma açãotécnica. Na ação declaratória deve-severificar ou não apenas a existência de uma relaçãojurídica. E o tribunal considerou que, no caso, não setratava de uma relação jurídica, tratava-seapenas de reconhecimento de fato. É uma pena que o Tribunaltenha seguido essa via, porque já há váriasdecisões deste e de outros tribunais no sentido de que arelação de responsabilidade pode ser objeto de açãodeclaratória mesmo que não se queira cobrar nenhumaindenização”, afirmou.Comparato disse quepretende recorrer ao STJ, questionando também a existênciade um documento que foi juntado pela defesa do coronel, “cujooriginal não foi encontrado”. “Vamos fazer umarepresentação, provavelmente ao MinistérioPúblico, para que se verifique se a cópia apresentada éautêntica ou não. Se não for autêntica,terá havido um crime de falsidade”, disse, acrescentando quea família vai continuar lutando. “Lutar sempre, venceràs vezes, e desistir jamais”, afirmou. Na frente do Palácioda Justiça, parentes do jornalista fizeram uma manifestaçãocom faixas pedindo a abertura dos arquivos da ditadura. Tambémforam espalhadas pelo chão fotos de mortos e desaparecidos naépoca da ditadura. Angela Mendes de Almeida,ex-companheira de Merlino, lamentou a decisão de hoje eafirmou que a família pode até recorrer à CorteInteramericana de Direitos Humanos. “Os desembargadoressuscitaram problemas técnicos, uma interpretaçãotécnica, dizendo que eles não estavam julgando omérito, ou seja, não estavam apoiando os crimes doUstra, mas recusaram a continuidade da ação”, disse. Para ela, o argumentoutilizado pelos desembargadores para “barrar a sentença”pode significar que “eles são favoráveis, de umamaneira ou de outra, para que continue a impunidade dostorturadores”.Ainda bastante abaladacom a decisão, a irmã de Merlino, Regina Merlino Diasde Almeida, disse que a decisão de hoje foi “infinitamenteinjusta”. “A coisa realmenteaconteceu, tem testemunhas. Esse coronel realmente torturou, foiresponsável pelas torturas e torturou o meu irmão atéa morte. E de repente terminou assim, hoje está encerrado. Masnós não vamos desistir, não. Vamos continuar anossa luta”, afirmou.