Causas da fome mudaram desde os primeiros estudos de Josué de Castro

05/09/2008 - 6h55

Sabrina Craide*
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Quando o médicoe intelectual brasileiro Josué de Castro, que completaria100anos hoje (5), iniciou os estudos sobre a fome no Brasil eno mundo, na década de 40, a principal causa era a falta dealimentos, especialmente nos países que haviam perdido a 2ªGuerra Mundial. Hoje, existem alimentos disponíveis, mas apopulação mais pobre não consegue ter acesso aeles por falta de recursos financeiros.“Hoje, a fome tem acara da falta de dinheiro e não da falta de produtos. Faltambons empregos, uma melhor distribuição de renda, maiorpoder aquisitivo para as pessoas conseguirem consumir o quenecessitam”, explica o o diretor para América Latina eCaribe da Organização das Nações Unidaspara Agricultura e Alimentação (FAO), JoséGraziano.A filha de Josué de Castro, a socióloga Anna Maria Castro, lembra que ageografia da fome mudou porque o país se industrializou e apopulação deixou de ser majoritariamente rural. Paraela, isso piorou a situação. “Antes, você tinhaalguma forma de sobrevivência da pequena propriedade, que foisendo eliminada. A grande denúncia dele [de Josué]era contra o latifúndio e a monocultura e por uma reformaagrária para que todos pudessem ter a terra para poder sealimentar”, afirma.De acordo com Graziano,que foi o primeiro coordenador do programa Fome Zero, a FAO estimaque hoje existam cerca de 60 milhões de subnutridos na AméricaLatina e 880 milhões no mundo, o que representa quase 15% dapopulação mundial. O conceito de subnutrido éaplicado às pessoas que não consomem, no mínimo,2,2 mil calorias por dia. Graziano explica que o númeroaumentou nos dois últimos anos por causa da alta dos preçosdos alimentos.Ele diz que a AméricaLatina sofreu bastante com o aumento do preço dos alimentos,porque as pessoas trocaram carne, verduras, legumes e frutas poraçúcares e farinhas. “Na América Latina hoje,a fome tem a cara do obeso, porque as pessoas comem mal por falta decondições financeiras ou por falta de conhecimentonutricional”, afirma.Anna Maria conta que opai “descobriu” o problema fome, que estava oculto primeiramenteno Nordeste, depois no Brasil e no mundo. “Até então,se admitia que a fome era um problema do meio ambiente, da raça,da indolência da população. E ele tentou mostrarque não, que o problema não era a produçãode alimentos, mas sim de poder distribuir porque uma grande parcela dapopulação não tinha acesso”, explica.Anna Maria lamenta quehoje em dia muitos países ainda sofram com as conseqüênciasda fome. “Acho que ele [Josué] nunca esperaria quechegaríamos ao século 21 dessa forma, ele acreditavaque, pela ciência e pela técnica, o homem ia poderdistribuir melhor a riqueza do país para que todos pudessemparticipar do alimento”.Segundo Graziano, agrande contribuição de Josué de Castro para aspolíticas governamentais adotadas atualmente é acompreensão de que a erradicação da fome nãodeve partir apenas de uma proposta de governo, mas de toda asociedade. “Hoje, há estudos que dizem que é maisbarato erradicar a fome do que conviver com ela. A fome causa um talnúmero de efeitos que se torna um negócioantieconômico”, avalia.Em 2004, a PesquisaNacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada peloInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),apontava que aproximadamente 72 milhões de brasileiros viviamem situação de insegurança alimentar. Dessetotal, 14 milhões em situação grave.