Brasil produz primeiros caprinos transgênicos da América Latina para gerar medicamentos

18/06/2008 - 19h10

Adriana Brendler
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Depois de nove anosde estudo, pesquisadores da Universidade Estadual do Ceará(Uece) conseguiram gerar os dois primeiros caprinos transgênicosda América Latina. Os animais foram geneticamente modificadospara produzir leite com uma proteína humana que estimula aimunidade e é utilizada em medicamentos para o tratamento depacientes com aids e câncer.O experimento faz parte do projeto CaprinosTransgênicos como Biorreatores para Produção deFármacos de Interesse em Saúde Humana, desenvolvidopelo Laboratório de Fisiologia e Controle da Reproduçãoda universidade cearense, em parceria com a Universidade Federal doRio de Janeiro (UFRJ).Segundo Vicente José Freitas, veterinárioresponsável pelo laboratório, com o isolamento daproteína hG-CSF (Fator de Estimulação deColônias de Granulócitos humano) a partir do leite decabras transgênicas, será possível produzir ummedicamento com custo pelo menos dez vezes mais baixo que o dosusados hoje para melhorar o sistema imunológico de pacientescom Aids ou que estejam sendo submetidos à quimioterapia eradioterapia para tratamento do câncer. De acordo com Freitas, além de mais barato,o novo remédio, que reproduz a proteína humana a partirde células animais, vai causar menos efeitos colaterais que oatual, obtido por meio de culturas de bactérias e fabricado noexterior, cujo custo é estimado em US$ 3 mil por tratamento.O pesquisador disse que a parte mais difícildo experimento brasileiro já foiconcluída com a obtenção dos animais quecarregam o gene humano e, dentro de nove a dez anos, serápossível ter o novo medicamento - inédito no mundo - no mercado. “Considero que fizemos a parte mais difícil:temos os animais transgênicos. Todas as outras etapas paraproduzir o medicamento já são dominadas. Então,é apenas uma questão de tempo e execuçãode protocolos já definidos. O que vai demorar agora sãoos testes clínicos e pré-clínicos para validarum medicamento em uso humano”, afirmou.Freitas informou que já há contatospara que o medicamento sintetizado a partir do leite de cabra sejaproduzido pelo laboratório de Biomanguinhos da FundaçãoOsvaldo Cruz, a fim de garantir o baixo custo do produto e facilitarseu acesso pela população.Além do uso em pacientes com câncer eaids, o medicamento poderá ser empregado para regeneraçãode tecidos cardíacos e nervosos em pessoas que passaram porinfartos e derrames (acidentes vasculares cerebrais).O pesquisador destacou que, dominada a tecnologiapara a transgênese, vários outros tipos de medicamentospoderão ser produzidos com a introdução noscaprinos de novos genes de interesse para a saúde humana. Éo caso, por exemplo, da proteína Fator 9 de Coagulação,próximo experimento a ser desenvolvido pela equipe cearense,para viabilizar o tratamento de hemofílicos. Os dois caprinos transgênicos, macho e fêmeada raça canindé, nativa da Região Nordeste,nasceram em março, entre 23 animais gerados pela experiênciado LFCR. Além deles, outro filhote expressava a mudançagenética introduzida pelos pesquisadores, mas nasceu morto. “Foi um resultado muito importante para oBrasil, porque, com um financiamento infinitamente inferior ao deinstitutos estrangeiros, conseguimos um índice de transgênese[número de animais transgênicos gerados em relaçãoao total gerado pela experiência] semelhante e atésuperior. A literatura internacional aponta um índice de 7% a10%, e nós obtivemos 13%.”Freitas explicou que as cabras são ummodelo escolhido mundialmente para trangênese e obtençãode proteínas por apresentar uma série de vantagens, porexemplo, em relação às vacas. Segundo ele, alémde ser muito mais difícil obter sucesso na trangênese debovinos, esse tipo de animal tem manutenção mais cara,maior tempo de gestação e menor número defilhotes por parto. A pesquisa brasileira tem financiamento de R$ 1,5milhão da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligadaao Ministério da Ciência e Tecnologia.