Alana Gandra
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - A crise provocada pelas hipotecas imobiliárias de alto risco nos Estados Unidos (subprime) terá reflexos no Brasil em curto e médio prazo, tanto pelo lado financeiro como pelo comercial. A análise foi feita hoje (18) à Agência Brasil pelo professor Luiz Filgueiras, da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Filgueiras, que também é doutor em Economia pela Universidade de Campinas (Unicamp), participará nesta noite de debate sobre a crise norte-americana no Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro (Corecon/RJ). Ele apostou que a repercussão dessa crise nos chamados países periféricos, ou em desenvolvimento, como o Brasil, “é uma questão só de tempo".
O maior ou menor impacto vai depender da reação da China, acrescentou: “Está ficando claro que haverá uma desaceleração dura nos Estados Unidos, provavelmente uma recessão profunda. E é óbvio que isso vai afetar o mundo inteiro, o Brasil também."
O professor descartou o argumento otimista do governo federal, ao analisar que o fato de o Brasil possuir reservas em torno de US$ 200 bilhões não é suficiente para ampliar a capacidade de responder à fuga de capitais. E contestou a tese de que o crescimento econômico brasileiro não depende da movimentação internacional, porque estaria sendo puxado pelo mercado interno.
“Acho fracos os dois argumentos, porque na realidade o nível de expansão do mercado interno está dado pela vulnerabilidade externa da economia brasileira. Ou seja, está dado pelo balanço de pagamento. Se o balanço de pagamento enfraquece, então há um rebatimento imediato na economia brasileira”, afirmou.
Ele citou dois caminhos para a crise entrar na economia brasileira – um deles, de curto prazo, via bolsa de valores. Ontem (17), a Bovespa registrou queda de 3,9%. “É um caminho que você percebe logo. A bolsa flutua, o Risco Brasil flutua, o dólar flutua. É coisa do curto prazo. Mas se a crise se aprofunda, tem-se a fuga de capitais. E isso vai rebater diretamente nas reservas brasileiras. Começa a reduzir as reservas em função da fuga de capitais, se a coisa se agravar”.
A fuga de capitais acabaria impactando a inflação e, nesse contexto, Filgueiras disse que a resposta do Banco Central seria a elevação da taxa de juros, a fim de trazer os capitais estrangeiros de volta e equilibrar o balanço de pagamento. "Quando o Banco Central eleva a taxa, desacelera a economia e, ao mesmo tempo, leva ao aumento rápido da dívida do setor público. Então, desarruma todo o quadro macro-econômico pelo caminho do curto prazo, se a crise se aprofundar mais”, analisou.
No médio e no longo prazo, o efeito será sentido se houver impacto no preço das commodities (produtos agrícolas e minerais), segundo Filgueiras. “Aí a entrada da crise não é pelo lado financeiro, mas é pelo lado do comércio internacional, com uma queda nas exportações brasileiras. Nos últimos dois meses, com a valorização da nossa moeda, o superávit já caiu muito em relação ao ano passado, porque as importações crescem em ritmo mais acelerado que as vendas", disse.
Na avaliação do professor, "os dois impactos implicam aumento da vulnerabilidade externa da economia brasileira e isso rebate no mercado doméstico, com desaceleração econômica e desemprego – vai depender da profundidade e do tempo de duração da crise".
Filgueiras disse não ver grande impacto nas medidas adotadas pelo governo na semana passada, a fim de tentar frear a desvalorização do dólar e aumentar as exportações. "O impacto é irrisório na balança comercial e no processo de valorização do real”, afirmou, e alertou: "Se a crise se aprofundar, o impacto vai ser pesado nos países emergentes e no Brasil, em particular. Porque a nossa pauta de exportação está centrada em commodities e em produtos de baixa intensidade tecnológica, cujos preços estão ligados ao desempenho da economia mundial, que está ameaçada pela crise.”A crise, concluiu, estaria relacionada "à desregulamentação e à liberdade de ação do mercado financeiro nos últimos anos, quando atuou de maneira não muito previsível ou clara".