Roberto Maltchik
Repórter da TV Brasil
Brasília - O presidente do Equador, Rafael Correa, teve parte de suas reivindicações atendidas pela resolução da Organização dos Estados Americanos (OEA) que decidiu enviar uma comissão de embaixadores à fronteira da Colômbia com o Equador, após uma semana de tensão na América Latina. No entanto, Correa ainda espera a condenação do país vizinho por ter invadido seu território para atacar membros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).Em entrevista exclusiva à TV Brasil, o mandatário equatoriano acusou o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, de se beneficiar economicamente do conflito com as Farc e disse que o Equador está preparado para a guerra, caso tenha seu território invadido.TV Brasil: O senhor afirmou nos últimos dias que o governo da Colômbia não busca a paz na região e que o presidente Álvaro Uribe é contra esforços humanitários feitos pelos países vizinhos. Por quê?Rafael Correa: Estou convencido disso. O governo de Uribe vive política e economicamente da guerra. Politicamente porque ganha apoio da população que sofre. E economicamente porque recebe milhares de dólares por ano dos americanos por causa da guerra. Em dezembro, dissemos a Uribe que iríamos interceder para tentar solucionar os problemas; começamos a fazer os contatos para tratar da liberação de Reyes [Raúl Reyes, número dois das Farc, morto durante a ação colombiana].Em março iam ser liberados um total de 12 reféns, não todos de uma vez. Entre eles, Ingrid Betancourt. Parece que o Uribe ficou sabendo. Eles teriam interceptado o telefone de Raúl Reyes faz muito tempo. Sabiam das conversas e que estava adiantado o processo de libertação dos reféns.O próprio marido de Ingrid Betancourt disse isso. E o que fez Uribe? Quando já está adiantado o processo, [os soldados] vão e massacram Reyes para parar qualquer resgate humanitário. Ingrid Betancourt era uma potencial candidata às eleições presidenciais, sendo rival de Uribe. O que ele menos quer é libertar reféns.TV Brasil:Qual a relação entre as Farc e o governo do Equador?Correa: Nenhuma. Mas temos um problema: os quinhentos quilômetros que temos de fronteira na selva. Nós não limitamos com a Colômbia, nós limitamos com as Farc. Da mesma forma que nos acusam infantilmente de ter uma base das Farc no nosso território podemos perguntar: como é possível que entrem e saiam guerrilheiros do solo colombiano? Por que Uribe não tem soldados aí. Não mobiliza seu Exército não porque não quer, mas porque não pode. O massacram na fronteira sul se a ação for dominada pelas Farc. A gente faz o que pode para conter a infiltração.Não fazemos fronteira com a Colômbia, mas com as Farc. E temos feito o possível para impedir que qualquer força regular ou irregular pise no Equador, mas com os meios que temos hoje, isso é impossível.TV Brasil: A Colômbia apresentou documentos como prova da relação entre o Equador e as Farc...Correa: Uribe sabe que mente. Todo o escândalo se baseia em documentos sem assinatura, supostamente resgatados de computadores que, milagrosamente, resistiram ao bombardeio. Quem pode acreditar? Fazem isso com base na máquina de propaganda que eles têm com o apoio de agências de inteligência bem conhecidas.TV Brasil: A que agências de inteligência o senhor se refere?Correa: Não quero especificar, mas vocês já conhecem o pronunciamento de Bush [presidente dos Estados Unidos], que disse que apóia totalmente o bombardeio da Colômbia...TV Brasil: O Equador está preparado para uma guerra?Correa: Para defender nosso território, sim. Neste momento, novas fumegações na fronteira vão ser interpretadas como atos de guerra. Assim como eles falam que os guerrilheiros estavam no nosso território, se eles fizerem fumegações e elas caírem em nosso território vamos considerar um ato de guerra. Regular ou irregular, quem entrar armado em solo equatoriano será capturado.TV Brasil: Como o senhor avalia o papel da OEA e do governo brasileiro na solução desse episódio?Correa: A OEA tem um papel fundamental determinante e reafirmou o princípio da inviolabilidade do território. Em relação ao Brasil, quero expressar meu agradecimento ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao chanceler Celso Amorim. Sem pedir explicações sobre o documento tirado do computador, sabem que nada justifica a agressão a um país e condenaram a incursão e o bombardeio colombiano ao solo equatoriano. Eu pergunto a todos os brasileiros: o que aconteceria se mais tarde Uribe falasse que que há guerrilheiros das Farc no Brasil e bombardeassem o país? O que fariam? Isso é um perigo para a região. Uribe é um fator de desestabilização para a região. Temos que pará-lo agora. Precisamos de uma condenação forte pela OEA para criar mecanismos reais de coerção porque o Uribe, com o apoio dos Estados Unidos, não vai parar só com sanções morais.