Sabrina Craide
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A técnica em enfermagem Maria (nome fictício), de 61 anos, passou um ano e meio na Penitenciária Feminina do Distrito Federal. Ela foi presa por tráfico de drogas, mas garante que é inocente, e que foi vítima de um mal-entendido. Na cadeia, ou sistema, como ela prefere chamar, fez curso de bijuterias, informática e cursinho pré-vestibular. Também trabalhou na enfermaria da penitenciária e teve um emprego fora da prisão. Além de ocupar o tempo, as atividades serviram para reduzir em nove meses o período que ficou atrás das grades.Maria acredita que, sem qualificação, fica ainda mais difícil para o ex-presidiário conseguir sua recolocação na sociedade. “Só assim o egresso vai melhorar. Se uma pessoa vai para o sistema penitenciário, cumpre uma pena, aí chega aqui fora ele encontra todas as dificuldades do mundo de novo, ele vai ficar doente, com fome, vai ver a família com fome, o que ele vai fazer se ninguém dá trabalho para ele? É o caso da reincidência”, afirma.Mesmo com todos os cursos que fez, a ex-presidiária Maria está desempregada. Ela diz que o preconceito em relação aos egressos do sistema prisional é grande, e defende que o governo ajude a recolocar quem sai da cadeia no mercado de trabalho. Mas, por enquanto, ela não tem perspectiva de dias melhores. “Eu trabalhei tanto na minha vida para ter um final de vida um pouco mais tranqüilo, e me vejo assim, sem perspectiva. Porque, por mais que eu seja qualificada, eu não tenho uma porta aberta de um hospital, que eu trabalhei tantos anos em hospital. Então, você não entende por que eu estou desempregada, se eu sou qualificada.”A ex-presidiária também defende que, se tivessem que trabalhar na cadeia, as pessoas pensariam duas vezes antes de cometer algum delito. “Acima de qualquer coisa, dentro do sistema penitenciário tem que ter trabalho para todo mundo. Trabalho, não é deixar 10 mil homens que passam o dia inteiro deitados, dentro de uma grade, isso não é castigo. Agora, se tivesse um local para trabalhar, para estudar, e quando chegar à noite tem que ficar trancado, eu duvido que tivesse mais algum presidiário. Se tivesse, era muito pouco. Ninguém gostaria de estar, além de preso, trabalhando.”O diretor executivo da Fundação de Amparo ao Presidiário (Funap), Brás Justino da Costa, também é a favor do trabalho na prisão. Para ele, o trabalho e o estudo para quem está preso não servem para punir, mas para garantir um futuro melhor.“O trabalho e a educação são imprescindíveis para a recuperação e a ressocialização para aqueles que cometeram algum tipo de crime e estão cumprindo pena ou que tenham cumprido. Sem profissionalizar, sem ter um caminho a seguir, que possa dar um norte para ele, que ele possa sobreviver do trabalho e do suor dele, dificilmente ele vai conseguir ficar na rua, vai chegar um momento que ele vai ficar desesperado e vai fazer uma besteira novamente”, avalia. Dos 7,6 mil presos do DFl, cerca de 1,5 mil estudam. Os cursos vão da alfabetização ao ensino médio. Quase 800 presos têm trabalho remunerado, por meio de convênios da Funap com ministérios, associações e empresas privadas. Para ajudar na ressocialização de ex-presidiários do Distrito Federal, a Universidade de Brasília desenvolveu, de 2003 a 2005, o projeto Reciclando Papéis e Vidas. Com a iniciativa, 25 ex-detentos, homens e mulheres, tiveram aulas de informática, manufatura artesanal de papéis, higienização de livros e documentos, encadernação e informática.A coordenadora do projeto, Thérèse Hofmann, conta que o mais difícil é, depois de capacitar, conseguir colocar os ex-presidiários no mercado de trabalho. “Se a gente der a qualificação aqui na universidade, mas depois as empresas ou o próprio governo não abrirem as portas, fica difícil. A gente faz a nossa parte, a gente qualifica, mas o mercado tem que absorver essa mão-de-obra também senão fica capenga, fica com uma perna só a história.”Recentemente, a Câmara Legislativa do Distrito Federal aprovou um projeto de lei que reserva vagas para ex-presidiários e presos em regime semi-aberto nas contratações de mão-de-obra para o governo. As vagas serão de no mínimo 2% e não serão preenchidas por concurso público. Na Câmara dos Deputados, também tramita uma proposta para dar incentivos ficais a empresas que contratarem presidiários.