País se recuperou da crise de 2001, mas o crescimento precisa ser sustentável, diz conselheiro

24/10/2007 - 17h32

Ana Luiza Zenker
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Luis Castillo éconselheiro econômico da Embaixada da Argentina no Brasil. Nestaentrevista à Agência Brasil, ele comenta sobre quais fatoresmotivaram a recuperação econômica do país após acrise de 2001. Também fala dos desafios para ospróximos anos e das providências que vêm sendo tomadas para superar outra crise que afetou o país em 2007: afalta de energia.Agência Brasil: Depois de seis anos, aArgentina tem se recuperado da grave crise econômica queafetou o país ao final de 2001. Quais são os princiapisfatores que explicam essa retomada?Luis Castillo: Há mais ou menos quatro anos o país superou essa crise. Nesse período, a Argentina tem crescido quase 9% ao ano e se vê reflexosem todos os setores da economia, principalmente nas manufaturas,setor automotor, bens de consumo duráveis, químicos,papel, bens de capital e siderurgia. São setores queressurgiram depois da crise de 2001.O programaeconômico argentino se baseia basicamente em três pés.O primeiro é o câmbioreal competitivo, ou seja, quenão está incluído na inflação.Isso deu um grande impulso ao setor exportador. Há o que sechama de  setor substitutivo de importações, todos os que eu citei antes, que está sendo feito naArgentina. Porque sai muito caro importar, então, ademanda e a oferta desses bens aumentou muito.O segundo pé darecuperação é o que se chama de prudênciafiscal. A argentina tem um superávit fiscal de um pouco maisde 4% do PIB [Produto Interno Bruto, a soma de todas as riquezas produzidas em um país]. A Argentina, ao contrário do Brasil, depoisda negociação da dívida, tem gasto muito menos nopagamento de juros. Então, praticamente, o superávitfiscal se mantém. Isso tem sido uma constante nesses anos, etudo indica que vai ser nos anos que vêm.O terceiropé é o que podemos denominar de políticas dereceitas, que têm a ver com os preços e os salários. São feitas as negociações coletivas como sindicato para fixar salários. Os preços, ogoverno tem a política de acordar com os setores para verquais serão os aumentos de preços, basicamente dosbens mais importantes: as tarifas de transporte queestão subsidiadas e os alimentos. Se acorda com os setores e,por outro lado, o governo subsidia explicitamente o transporte e os alimentos para que o preço aoconsumidor não suba. Isso tem mantido mais ou menos oesquema, há de se considerar que viemos de uma recessãogrande.Também teve, como para o Brasil, um contextointernacional muito favorável, os preços decommodities e matérias-primas que a Argentina semprevendeu foram altos pela demanda da China e da Índia. Se passa a mesma coisa no Brasil. Assim, a Argentina temsuperávit comercial em conta corrente e estáexportando mais ou menos uns US$ 46 bilhões. Temos umareserva em torno de US$ 40 bilhões. Isso fez com que o país praticamente não sentisse a crise internacional,como a recente no mercado de hipotecas dos Estados Unidos. Isso nos impulsionou, nos últimosquatro anos, e esperamos que continue nos impulsando.ABr: Quais são asdesafios da economia argentina?Castillo: Existe o desafio de que esse crescimento sejasustentável no tempo. Issotem basicamente três pés. Que haja m crescimentosustentável das exportações, em que apolítica de câmbio competitivo é fundamental. Uma coisa que continua sendo um desafio importante é aumentaro investimento. O investimento, na Argentina, está mais oumenos em 20% do PIB e é importante aumentar. Um pouco da nossapolítica, por meio do Ministério das RelaçõesExteriores, e também nas viagens da candidata Cristina [deKirchner, candidata a Presidência nas eleições que ocorrem no dia 28 de outubro] vãonesse sentido: mostrar que a Argentina está fazendo ascoisas bem e tentar entusiasmar os investidores para que esse 20%passe a ser 25%, porque isso é importante. Que nãosejam só investimentos em capital físico, mas tambémhumano. Nesse sentido, a Argentina está tratando tambémde adequar a oferta de educação à demanda dasempresas. Às vezes há um desemprego que não sepode eliminar porque o que a empresa precisa não é oque o trabalhador sabe fazer. Então, aí tem que serfeito um trabalho que é realmente no sistema de ensinopúblico, tratar dereadequar as capacitações da mão-de-obra. O terceiro pé é que é preciso umforte investimento em tecnologia para que a economia seja maiscompetitiva. Porque temos que nos preparar para quando as condiçõesda economia internacional não forem tão boas eos preços dos produtos primários e commodities que nósvendemos baixem. Ninguém diz que isso vai acontecer num futuropróximo, mas em algum momento isso pode acontecer, e temos que responder de uma outra forma. Inclusive, temosque ter um grande volume de investimentos e tecnologiapara que tenhamos produtos que possam ser vendidos e que nãosejam necessariamente commodities.ABr: Que alternativas aArgentina está buscando para enfrentar a crise energética?Castillo: O que acontece éum desajuste entre a oferta e a demanda de energia na Argentina e apolítica tem sido atacar em duas frentes. No caso da demanda,de contê-la, tanto a residencial como a dasempresas. As empresas têm sidoestimuladas a usar e produzir energia própria e as famílias,a não consumirem em determinados horários. O maisimportante é a oferta. Para expandir a oferta, temos medidas decurto e de longo prazo. Em curto prazo, basicamente comprar energia,eletricidade do Brasil, gás da Bolívia e tambémgasóleo, que também estamos estimulando as empresas a comprar, e a Argentina comprou algumas vezes gasóleo daVenezuela. Isso seria a curto prazo, para solucionar já. Nolongo prazo, Argentina está formulando um acordo de produçãode gás natual com a Bolívia por 20 anos. Tambémestão sendo construídas centrais térmicas, sechamam de ciclo combinado. As empresas são estimuladas a fazer investimentos em exploração, porquenão houve muita nos últimos anos, então asreservas são pequenas. A Argentina quer que asempresas invistam em exploração, para aumentar asreservas de gás e petróleo, que o negócio nãoseja tanto a distribuição do que já foiencontrado, a extração e a distribuição,mas a exploração. Porque o país temterrenos que poderiam ser ricos em pretróleo e gás.Estão sendo feitos investimentos, não tenho númerosde memória, mas isso é um pouco do programa de combate.Para a demanda e para a oferta, e a oferta de curto e longo prazo.ABr: Dentro das relaçõeseconômicas internacionais da Argentina, qual a importânciado mercado sul-americano?Castillo: Tenho alguns números interessantes de destacar. Em 2006, 17% de tudo o quea Argetnina exportou foi para o Brasil, 3% para o México, 2%para o Uruguai, 6% para a Comunidade Andina de Nações e 9% para oChile. Claramente, para a Argentina, os mercados da América sãoimportantes e muito mais para as manufaturas industriais. A Argetninapode vender commodities para a China e a Índia, masse queremos vender produtos com maior valor agregado, claramente aArgentina vai vender para o Brasil, Chile, ComunidadeAndina de Nações, Urugaui, México, etc. Automóveis, nós vendemos para o Brasil e para o México.É muito importante, não somente em termos de volume,mas em termos de qualidade. Não é a mesma coisa vendersoja e autmóveis. E os automóveis nós vendemosaqui, não na China. Nesse sentido, o esquema de relacionamento externo da Argentina vai sempre priorizar o aporte nomercado sul-americano, a possibilidade de teruma associação com todos os países da Américado Sul. Há um acordo entre o Mercosul e a Comunidade Andina, ea Argetnina tem acordos de comércio com o Chile e com aBolívia, que são países associados ao Mercosul.De maneira que a Argentina vende onde pode, mas bens com maior valoragregado, mais importantes, são vendidos basicamente na Américado Sul. A relação com os vizinhos para nós éfundamental, culturalmente e também pelos negócios.