Pastoral da Terra é premiada por recorde em denúncias de trabalho escravo

05/12/2006 - 17h55

Alessandra Bastos
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Com o slogan “Faz mais de 100 anos que a escravidão foi ‘abolida’. E faz mais de 100 anos que a gente tenta tirar as aspas desta frase”, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) receberá hoje (5), em Brasília, o Prêmio Combate ao Trabalho Escravo como instituição que se destacou na luta contra esse crime. A entrega do prêmio, inicialmente prevista para as 17h30, foi adiada para as 21 horas,  já que alguns dos que vão participar da solenidade não conseguiram chegar a Brasília por causa de atrasos nos vôos em São Paulo. “O trabalho extraordinário da CPT gerou um número recorde de denúncias ajuizadas no sul do Pará, região onde se encontra o maior conflito, além de práticas reiteradas de exploração do trabalho humano”, disse o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), José Nilton Pandelot. Segundo José Batista Afonso, da coordenação nacional da CPT, o prêmio é um reconhecimento do trabalho feito. "E todo recurso que vem para a campanha ajuda muito, porque os trabalhadores chegam nos escritórios procurando ajuda”, disse.Há mais de dez anos, a CPT combate o trabalho escravo. A campanha começou nos estados de Tocantins, Maranhão e Pará e hoje abrange todo o país. O trabalho consiste no acolhimento a vítimas do trabalho escravo, encaminhamento das denúncias ao Ministério Público para fiscalização e formação, por meio de cursos, cartazes e folhetos “para atingir o máximo de trabalhadores que são potenciais vítimas dessa condição de violência”, explicou José Batista.Três jornalistas vão receber o prêmio: Ricardo Mendonça e Ana Aranha, repórteres da revista Época, autores das melhores reportagens sobre o tema publicadas em 2005 e 2006, e Leonardo Sakamoto, também cientista político e escolhido como personalidade. Cada um dos vencedores receberá uma estatueta trabalhada e doada pelo artista plástico Elifas Andreato, além de R$ 5 mil. De acordo com o presidente da Anamatra, a iniciativa se explica porque o tema combate ao trabalho escravo não estava incluído no Prêmio de Direitos Humanos do governo federal. “Especialmente na edição deste ano, não contemplou nenhuma categoria relativa ao trabalho escravo. A Anamatra vai criar, em 2007, um prêmio próprio para direitos humanos”, adiantou Pandelot.Além da Anamatra, o prêmio é concedido por quatro entidades: Organização Internacional do Trabalho (OIT), Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Segundo a OIT, é "fundamental que entidades, militantes e instituições que lutam contra o trabalho escravo recebam reconhecimento público pelas importantes atividades que vêm desenvolvendo ao longo dos últimos anos”.A OIT lembra que o Brasil tem avançado na questão. “Os notáveis avanços que o Brasil vem conseguindo obter no combate a esse crime foram reconhecidos internacionalmente em 2005 pelo relatório da OIT Uma Aliança Global contra o Trabalho Forçado”. Para José Nilton Pandelot, “o governo passado foi o início. Fernando Henrique Cardoso reconheceu, pela primeira vez, a existência do trabalho escravo no Brasil. Neste governo, o número de inspeções multiplicou muito, e o de libertações, também. Mas ainda não são suficientes”.No último dia 29, as entidades integrantes da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) aprovaram moção pedindo que o governo brasileiro e demais nações da OIT destinassem recursos financeiros para  continuidade do Projeto de combate ao Trabalho Escravo, iniciado em 2002. O relatório "Direitos Humanos no Brasil 2006", divulgado, no dia seguinte (30), pela Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, traz críticas sobre a erradicação do trabalho escravo e diz que persistem problemas como a impunidade, a indefinição de competência para julgar aspectos criminais, e a não-aprovação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 438/2001, relativa à perda da propriedade nos casos de trabalho escravo. No último dia 21, no entanto, o combate ao trabalho escravo foi reforçado com a criação de um banco de dados desenvolvido em conjunto pelo Ministério do Trabalho, pela OIT e pelo Ministério Público do Trabalho. O sistema permite que os agentes públicos tenham informações mais precisas sobre o trabalho escravo. No dia 30, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que os casos de exploração de trabalho semelhante à escravidão sejam tratados na Justiça Federal.