Desde 1822, país só tem políticas emergenciais para segurança, diz estudo

20/09/2006 - 19h15

Marcela Rebelo
Repórter da Agência Brasil
Brasília - De 1822 até o ano passado, as políticas de segurança pública no Brasil são pensadas sempre em caráter de emergência. É o que revela um levantamento do Núcleo de Estudo da Violência da Universidade de São Paulo (USP), que pesquisou os debates sobre o tema desde o século 19.“São os problemas que acabam ditando as iniciativas governamentais”, afirma um dos coordenadores do estudo, Fernando Salla. “Essa é uma questão muito séria porque faz com que essa área nunca esteja à frente dos acontecimentos e não tenha uma amenização dos problemas futuro”.“Lembramos da segurança pública quando ocorrem alguns casos que chocam a opinião pública ou quando há ações específicas de determinadas modalidades do crime organizado”, concorda o sociólogo Benedito Mariano, um dos coordenadores do Plano Nacional de Segurança Pública.A falta de maturação do debate reflete-se, segundo Salla, no debate dos candidatos à Presidência da República. O pesquisador acredita que nenhum deles traz uma proposta consistente na área de segurança pública para o país. “Há muito discurso político em torno da crise. Mas infelizmente vai precisar haver muito mais investimento político”, avalia Salla.O presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone, Walter Maierovitch, também considera que as propostas apresentadas pelos candidatos não irão trazer mudanças significativas na área de segurança pública do país. “Não vejo nenhuma luz no fim do túnel. Tendo em vista até os próprios discursos dos novos políticos que vão ocupar os cargos”, diz. “Pelo que eu vi até agora, a insegurança aumenta a cada fala”, completa Maierovitch, que foi secretário nacional Antidrogas no governo de Fernando Henrique Cardoso.Na avaliação do pesquisador Fernando Salla, o que está sendo feito pelos governos federal e estaduais com relação à segurança público é “muito pouco”. “Vivemos uma situação extremamente grave na área da segurança e os fundamentos da crise não estão sendo atacados”, destaca.Salla diz que é preciso realizar mudanças no sistema judiciário. “As precariedades e a morosidade do sistema, as deficiências de acesso à justiça, tudo isso são ingredientes em torno do qual você na vê nenhuma ação consistente para se reverter esse quadro”, afirma. O pesquisador citou também ações que devem ser adotadas no sistema penitenciário. “Continuamos a ter um sistema penitenciário que submete os presos a uma situação absolutamente dantesca e não podemos dizer que esse quadro está sendo revertido. O trabalho policial também está muito aquém de um trabalho de boa qualidade, com inteligência, sem arbitrariedade, preventivo”, destaca. Na opinião do pesquisador, as instituições ligadas à área – como Ministério Público, poder judiciário e a polícia – estão “defasadas” por não se adequarem às novas demandas da sociedade. “Nem sempre o poder judiciário quer saber o que está ocorrendo com as instituições do poder executivo. Ou muitas vezes há uma total ausência de comunicação e de sintonia no trabalho das instituições ligadas ao poder executivo com relação às demais. O legislativo também é bastante omisso na geração de instrumentos legais que viabilizem um trabalho melhor dessas instituições”, avalia Salla.Salla destaca que as ações de segurança são pressionadas pela urgência. “Vem sempre a reboque”, diz o pesquisador. Outra característica apontada no estudo são os abusos de poder cometidos por agentes de segurança pública no país, o que ocorre durante o império, ditadura e regime liberal. “Constantemente, ao longo de toda a nossa história republicana, é impressionante os níveis de arbitrariedade praticados pelas instituições de segurança em relação ao cidadão, que vão desde abuso de autoridade até práticas de tortura, maus tratos, isso tanto nos regimes autoritários, quanto dos regimes democráticos”, destacou.