Indígenas dizem que só desocuparão sede da Funai em Manaus depois de conversa com novo administrador

22/01/2005 - 15h52

Spensy Pimentel
Enviado especial da Radiobrás a Manaus

Manaus – A determinação da Fundação Nacional do Índio (Funai) de enviar um funcionário a Manaus para investigar as denúncias de índios sobre má gestão na entidade no estado, estabelecendo um grupo de trabalho, não eliminou o impasse que, há 20 dias, mantém quase 100 índios ocupando a sede da fundação na capital amazonense (leia "Funai envia administrador substituto para Manaus). "Nos disseram que ele já chegou à cidade ontem à noite, mas diz que só vem aqui se desocuparmos o prédio. Mas nós só desocupamos depois que conversarmos com ele para sabermos de fato o que ele propõe como solução para os problemas que nós estamos apontando", afirma Jecinaldo Sateré-Mawé, principal líder da manifestação.

O presidente em exercício da Funai, Roberto Lustosa, rebateu as declarações dos índios. "Não houve nenhum entendimento sobre a ida de um funcionário. O único compromisso é que ele seria nomeado", diz. Lustosa completou que aguarda apenas a ação da Polícia Federal para cumprir o mandado de reintegração de posse.

Jecinaldo, que também é coordenador-geral da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), diz ainda que novas ocupações podem ocorrer: "Se não houver seriedade, as lideranças vão fazer mais ações como essa. Lula está esquecendo a questão indígena. Não está cumprindo o compromisso que assumiu com a gente, para criar uma Secretaria Especial para os Povos Indígenas, prefere continuar apostando na Funai, que está ultrapassada, tem uma filosofia integracionista, que não respeita o índio".

"A gente continua a ter esperança, mas, por enquanto, Lula está sendo um traidor", completou Jecinaldo, que também reclama do atual presidente da Funai, Mércio Gomes: "Ele não respeita as lideranças, não reconhece as organizações indígenas. Fica falando besteira da Coiab e das outras organizações". Segundo Jecinaldo, a Coiab congrega hoje 250 organizações indígenas de
165 diferentes povos, em 9 estados do Brasil.

A reportagem da Agência Brasil esteve na manhã de hoje no prédio da Funai que está ocupado. Alguns participantes do 4º Fórum Social Pan-Amazônico continuam no local, em solidariedade aos indígenas que, segundo Jecinaldo, são de dez diferentes etnias: Tikuna, Mura, Apurinã, Kulina, Tukano, Desano, Arapaso, Baniwa, Taliano e Sateré-Mawé. Há homens, mulheres e crianças, quase todos com os rostos pintados e usando enfeites de penas e palha. Ficam do lado de fora do prédio, e há avisos nas paredes: "Parentes, lembrem que lugar de lixo é na lixeira; "Parentes, não entrem nas salas e não mexam no patrimônio". A grade em frente do escritório está coberta por montes de pneus velhos. Há redes penduradas, grupos tocando música indígena e cabocla, além de mesas para venda de artesanato.

A principal reclamação dos indígenas, ainda segundo Jecinaldo, é em relação à demora na demarcação de terras dos Mura na região de Autazes (AM). Segundo o líder indígena, há suspeitas de que o administrador da Funai no estado que foi afastado ontem para as investigações, Benedito Rangel, seja amigo do prefeito desse município. "As terras indígenas sofrem uma pressão muito grande para serem diminuídas, para abrir espaço para as grandes fazendas".