Conferência traz Ribamar Ianomami para seu primeiro contato com a cidade dos brancos

29/11/2003 - 17h53

Ribamar Ianomâmi aparenta cerca de 30 anos de idade, mas não é possível saber exatamente quantos anos ele tem. Em toda a sua vida, o índio nunca tinha deixado a aldeia em que vive na reserva Ianomami, em algum lugar dos nove mil hectares entre o norte do Amazonas e o oeste de Roraima.

Ribamar foi o nome dado a ele pelos integrantes da Comissão Pró-Ianomami, que estuda os hábitos dos habitantes da região, por ter um som semelhante à forma como ele é chamado na língua Ianomami. Ao chegar a Brasília para participar da Conferência Nacional do Meio Ambiente, como um dos 912 delegados com direito a voto no evento, Ribamar ficou espantado com as construções e com o número de pessoas na cidade.

Ainda confuso, o índio não sabe dizer se os "naba" (nome dado pelos ianomâmi aos homens brancos) são inteligentes ou não. "Inteligentes porque constroem coisas para facilitar sua vida, mas burros porque fazem coisas que prejudicam sua gente", disse o índio na língua Ianomâmi, conforme a tradução feita pelo diretor da Comissão Pró-Ianomami, Maurice Tomioka Nilson.

Segundo Nilson, ao ver uma escada rolante, Ribamar disse que os "naba" eram muito inteligentes. O mesmo aconteceu quando ele entrou em um carro. Mas, quando viu lixo espalhado pela cidade e presenciou um acidente de trânsito, o índio mudou de idéia. "Como os naba constroem máquinas que são perigosas para eles?", questionou.

Foi a preocupação com o meio ambiente que trouxe Ribamar à capital federal. "Nós viemos para falar com os naba que eles deveriam fazer como a gente, que vive da floresta sem destruir", disse. Segundo o índio, os velhos da tribo ensinaram que eles não deveriam ter medo dos brancos, mas diziam que os "naba" poderiam chegar e derrubar as árvores, sujar os rios. Como na região em que vive os rios são pequenos, ele sabe do perigo de a água limpa acabar.

A construção de um quartel e de um aeroporto na serra do Surucucu, a cerca de três horas de caminhada da aldeia onde Ribamar mora, assustou os Ianomâmi. "Quando os soldados apareceram, nós ficamos com medo de a floresta acabar, nós vimos que nossa terra poderia não ser sempre daquele jeito", contou. "Na floresta, nós vivemos juntos. Nós defendemos a floresta, as caças que existem lá, os rios, porque é disso que nós vivemos, lá é a nossa terra e não tem outra se aquela ficar ruim".

A conscientização das pessoas sobre a importância de se preservar o meio ambiente, principal motivo da conferência, é cada vez mais uma preocupação ianomâmi. Se antes viviam longe dos brancos e com uma percepção de um mundo que era só floresta, hoje eles sentem que, se não preservarem suas terras e as riquezas naturais, terão problemas no futuro. "Nós apenas vivemos, comemos, fazemos festa. Não matamos nenhum animal nem derrubamos nenhuma árvore se não precisarmos, porque sabemos que, sem eles, não poderemos mais viver bem", afirma.

Ribamar teme que a cidade invada sua aldeia e que, com isso, seu povo seja destruído. "Se a aldeia se transformar em uma cidade as crianças vão morrer, porque é muita gente e muito perigo", disse. Mesmo impressionado com as construções feitas pelo homem branco, Ribamar acha que as crianças Ianomâmi não vão querer viver nas cidades. "Eu vou falar que a cidade é muito longe e que tem muita gente. As crianças não vão querer ir. Se quiserem, os velhos não vão deixar. As crianças vão ficar com muito medo e com muita saudade, porque uma criança fora de casa sente muita saudade".

Durante a entrevista à Agência Brasil, Ribamar não queria se deixar fotografar. Ele dizia que a luz do flash enfraquece o espírito. Depois de muita conversa, Freitas conseguiu bater duas fotos. Ao agradecer pela entrevista, Ribamar disse que, assim como a repórter havia escutado os "pensamentos" dele, ele gostaria de perguntar sobre algumas coisas para contar para o seu povo um pouco mais sobre como os naba pensam e vivem.