Relatório do Cimi indica que situação indígena piorou, apesar de queda no número de assassinatos

13/06/2012 - 10h59

Aex Rodrigues
Repórter Agência Brasil

Brasília - O número de índios assassinados em 2011 é o menor identificado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) desde 2005, quando foram registrados 43 casos, contra os 51 do ano passado. Desde 2008, o número se mantinha em 60 casos anuais.

Embora a quantidade de mortes tenha ficado abaixo inclusive da média anual (55,8) calculada para o período entre os anos de 2003 e 2011, quando, ao todo, foram mortos 503 índios; a organização indigenista ligada à Igreja Católica destaca que o resultado não significa uma melhora no quadro geral da violência contra os povos indígenas.

De acordo com o relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil, divulgado hoje (13) pelo Cimi, houve uma piora em vários outros aspectos, por exemplo, nas tentativas de assassinatos e no número de suicídios e de índios que morreram por falta de assistência à saúde.

Para o Cimi, os 30 casos de tentativa de assassinato contra 94 vítimas representam um “aumento assustador” se comparados às 18 ocorrências registradas em 2010. Entre os casos verificados no ano passado, 27 ocorreram em Mato Grosso do Sul, deixando um saldo de 85 vítimas. Pessoas que quase foram mortas em emboscadas ou ataques armados, como o ocorrido em junho de 2011 contra um ônibus escolar que transportava estudantes terena da Terra Indígena Cachoerinha, de Miranda (MS). De acordo com o Cimi, o veículo foi cercado e apedrejado. Em seguida, o ônibus foi incendiado. Ao menos quatro crianças sofreram queimaduras e uma delas teve que ser internada.

O Cimi também faz um alerta sobre os crescentes casos de suicídio. No total, o relatório identifica 26 casos de índios que tiraram a própria vida e mais oito que tentaram se matar. A maioria das vítimas é do sexo masculino, tem até 24 anos e usa cinto ou fio de náilon para se enforcar. Foi o caso de uma jovem mayoruna (cujo nome será preservado), de 15 anos, da Terra Indígena Vale do Javari, de Aldeia Flores (AM).

Para o Cimi, os suicídios são a expressão de desespero dos povos indígenas diante da omissão do Poder Público, simbolizada, entre outros fatores, pela morosidade na regularização de terras indígenas.

“A estratégia governamental aponta para uma marcante retração do ritmo da demarcação de terras indígenas. Em 2011, [a presidenta] Dilma Rousseff homologou apenas três terras indígenas, o Ministério da Justiça declarou como tradicionais somente seis terras indígenas, e apenas nove terras foram identificadas e delimitadas pela Fundação Nacional do Índio [Funai]. A retração, porém, parece crescer a cada ano”, cita o secretário executivo do Cimi, Cléber Buzatto, no relatório.

Segundo o documento, nos oito anos de governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, foram homologados 80 processos de demarcação de terras indígenas – número inferior ao verificado em todas as gestões do período pós-1988.

A entidade também destaca que o número de suicídios – identificados no relatório a partir de notícias da imprensa, dados oficiais e informações fornecidas pelos próprios missionários – não reflete a realidade. O relatório chega a mencionar números que atribui ao Distrito Sanitário Especial Indígena de Mato Grosso do Sul (Dsei/MS), segundo os quais, somente no estado, 45 índios teriam se suicidado durante o ano passado (número que está sujeito à revisão).

Outro problema abordado diz respeito aos serviços de assistência à saúde indígena, como a falta de profissionais, de medicamentos, equipamentos, transporte e de assistência constante. Registrados como casos de “desassistência na área de saúde”, as 53 ocorrências relatadas explicitam situações como a dos kaxinawá da Terra Indígena Alto Rio Purus, de Santa Rosa dos Purus (AC), onde, segundo o Cimi, diversas crianças apresentam sintomas do rotavírus, sem que as autoridades responsáveis tenham tomado as devidas providências para evitar que a doença se espalhasse.

Segundo a antropóloga Lúcia Helena Rangel, a falta de assistência à saúde indígena prejudicou mais de 35 mil pessoas de 15 unidades da Federação. A situação mais grave, segundo ela, foi verificada no Amazonas, particularmente no Vale do Javari.

Já o médico e membro da Pastoral Indigenista da Diocese de Roraima, Paulo Daniel Moraes, menciona que, embora a falta de medicamentos básicos, o sucateamento de equipamentos e a ausência de programas regulares de assistência à saúde indígena não sejam uma exceção há muito tempo, 2011 foi marcado pela omissão do Poder Público, “o que serviu para agravar ainda mais o cenário de caos”.

O relatório também menciona as agressões sofridas pelas comunidades que tentam retomar suas terras e que, em função do consequente conflito fundiário, são “atacadas por agressores que disparam tiros, indiscriminadamente”. Exemplo do que ocorreu em novembro do ano passado, na comunidade Guayviri, de Amambai (MS). No episódio, o cacique Nísio Gomes foi levado por pistoleiros que chegaram atirando. Gomes continua desaparecido até hoje.

Os indicadores referentes a danos ambientais em terras indígenas também pioraram. Enquanto em 2010 o Cimi relatou 33 casos de invasões de propriedades indígenas e de exploração ilegal de recursos naturais, no ano passado foram 42 casos.

Edição: Talita Cavalcante