Em São Paulo, escolas optam por valorizar história em aulas de religião

19/08/2011 - 9h36

Vinicius Konchinski
Repórter da Agência Brasil

São Paulo - Quinta-feira, às 16h40, é hora da aula de ensino religioso em uma das quatro turmas do 9º ano da Escola Estadual Doutor Alberto Cardoso de Mello Neto, na região norte da capital paulista. A escola é uma das poucas do estado que oferecem a disciplina aos seus alunos do último ano do ensino fundamental.

A professora Miriam de Oliveira é a responsável pela aula. Historiadora e psicóloga, ela trabalha no colégio há oito anos. Há três, dá aulas do que prefere chamar de “história das religiões”. Na primeira quinta-feira do mês de agosto (4), Miriam falou para cerca de 30 alunos sobre o cristianismo.

“Por volta do ano 300, o Império Romano adotou o cristianismo como sua religião oficial”, explicou aos alunos. “A partir daí, a religião se espalhou por outros cantos do mundo e acabou chegando ao Brasil, com os jesuítas. Hoje, quase todo mundo é cristão aqui no nosso país.”

O foco na história foi a solução encontrada por São Paulo para que as lições de ensino religioso constassem dos currículos da rede pública sem privilegiar qualquer crença, conforme determina a Constituição Federal. Apesar de só os alunos do 9o ano terem aulas específicas sobre religião – isso quando há demanda dos pais –, todas as escolas estaduais trabalham o conteúdo de forma transversal, em outras disciplinas. De acordo com a Secretaria Estadual de Educação, prevalece o aspecto histórico.

Uma lei estadual e uma resolução do Conselho Estadual de Educação de 2001 normatizaram o ensino religioso no estado. Elas garantiram o espaço para a disciplina nas escolas estaduais, mas também estabeleceram exigências na formação dos professores responsáveis pelas aulas e prioridade para a correlação do ensino sobre religião com a educação regular.

“Foi bom [criar regras]”, disse a presidenta do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Maria Izabel Noronha, que defendeu a adoção do modelo em reuniões com representantes do governo. “Sou favorável ao fortalecimento da formação humana, com conteúdo sobre história da religião, para que o aluno compreenda as diferenças entre as crenças”, justifica.

Essa fórmula, porém, não é unanimidade entre os educadores. Na opinião da coordenadora do programa de pós-graduação da Universidade Metodista e professora da Universidade de São Paulo (USP), Roseli Fischmann, o ensino religioso transversal delega responsabilidade demais aos docentes e expõe os alunos da rede pública a possíveis transgressões à Constituição.

“A Constituição diz que o Estado não pode defender nem discriminar crença nenhuma. Contudo, o professor, que representa o Estado na escola, é um ser humano”, pondera Roseli. “O ser humano tende, naturalmente, a defender sua crença.”

Para ela, o ensino religioso é um “risco que poderia ser evitado”. A professora acredita que os conceitos sobre diversidade e respeito, que são abordados nas aulas, poderiam ser repassados aos alunos em outras disciplinas que não a específica de religião.

Cecília Regina Bigatão, diretora da Escola Doutor Alberto Cardoso, discorda. Há mais de 20 anos à frente da escola, ela diz que é perceptível a diferença no comportamento dos alunos que já passaram pelas aulas de ensino religioso. “O que é a amizade, amor, está mais claro para eles.”

A diretora reconhece que é preciso ter atenção redobrada com o ensino religioso para que todas as crenças sejam respeitadas. Ela garante que esses cuidados são tomados na escola que dirige e, por isso, os resultados são muitos bons.

“Nunca tivemos uma reclamação de um pai sobre o conteúdo das aulas”, conta. “Não impomos nada às crianças. Todas são livres para ter sua religião”. Na antessala da diretoria, há um altar. Em cima dele, fica uma Bíblia aberta.

 

Edição: Juliana Andrade e Lílian Beraldo