Publicação chega às livrarias como libelo contra impunidade de grupos de extermínio

08/08/2009 - 10h34

Luiz Augusto Gollo
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O drama das vítimas da violência no Rio de Janeiro é tema de uma publicação que resultou da parceria do Centro de Estudos de Segurança e Cidadaniana Universidade Cândido Mendes com o Centro de Estudos Sociais daUniversidade de Coimbra e a Fundação Ford, no Projeto de Apoio aFamiliares de Vítimas de Chacinas.Há menos de um mês nas livrarias, o Auto da Resistência relata 19 histórias, quase todas sobre a mesma tragédia dessas pessoas, impotentes diante da impunidade.Os casos abordados são conhecidos da opinião pública do Rio de Janeiro e vários tiveram repercussão nacional e até mundial, como o da chacina de Vigário Geral em dezembro de2005. Denise Alves Tavares era mãe de Douglas Roberto, 16 anos,sequestrado com outros 12 jovens por policiais militares que tinhamrecebido R$ 50 mil para entregá-los aos traficantes de Parada deLucas.“Fui pra lá às seis da manhã e na escada da favela umrapaz do tráfico me abordou: ‘Tia, a senhora não é mãe de um dosmeninos que foi pego ontem?’ Eu disse: Sou, sou mãe do Douglas Roberto.‘O teu filho, as orelhas dele foram cortadas, os dedos dele foramcortados, e o nariz. Vai para o Juizado de Menores que ele está lá’.”Patrícia de Oliveira Silva é irmã de Wagner dos Santos, que aos 22 anos sobreviveu ao sequestro por PMs na noite de 23 de julho de93. Os policiais recolheram três rapazes que costumavam dormir perto daigreja da Candelária, no centro carioca. Levaram-nos para o Aterro doFlamengo e abriram fogo. Depois, voltaram à Candelária e atiraram contracerca de 50 crianças e adolescentes que dormiam. Oito morreram.Arepercussão internacional fez com que o governo do estado internasseWagner no Hospital do Corpo de Bombeiros, mas ele recebeu ameaças demorte. Recuperado, sofreu outro atentado em novembro de94, na estação Central do Brasil, e fugiu para a Suíça, onde vive.Quando vem ao Brasil, precisa de proteção da Polícia Federal.Emmuitas histórias, a cena se repete como num filme. Jovens saem de umafesta, são abordados pela PM e executados à queima-roupa no local ou emalguma área remota, uma fazenda abandonada. Quatro foram mortos porqueum era soldado do Exército e o capitão da PM deu a sentença sumáriapara evitar problemas com as Forças Armadas.Um grupo de 11jovens moradores de Acari saiu para um fim de semana num sítio emSuruí, no interior do estado, e foi retirado de lá por homens armados,desconhecidos até hoje, 19 anos depois. Nem os corpos das vítimasforam encontrados. A mãe de Rosana, 19 anos, Marilene Lima de Souza,resume a via crucis dos familiares junto às autoridades:“Apósmuita dificuldade, conseguimos ser recebidos pelo então secretário deSegurança, que arrolou o inquérito para a comissão especial que apuravaextermínios na Baixada Fluminense. Essa comissão cuidou do caso duranteum ano e foi extinta pelo governo seguinte. Foi instaurado um inquéritopara investigar policiais do 9º Batalhão da PM. O caso de Acari é uminquérito ainda até hoje, não é um processo. Isso traz muitadificuldade, pois é preciso provar que foram policiais que participaramdessa empreitada até mesmo para requerer pensão”.