Ministro do STF diz que Poder Público é “cronicamente omisso” com presídios

11/06/2009 - 9h48

Marco Antonio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Como conhecimento de quem trabalhou por 20 anos no Ministério Público deSão Paulo, muitos deles na Corregedoria de Polícia Judiciária e depresídios, o ministro mais antigo do Supremo Tribunal Federal (STF),Celso de Mello, afirmou, em entrevista exclusiva à Agência Brasil, queas recentes denúncias de violações de direitos humanos em presídios deestados como o Espírito Santo e o Rio Grande do Sul evidenciam um quadrocrítico, de caráter nacional, persistente há décadas pela omissão do Poder Público.“Já,então, em meados da década de 70, eu fazia as mesmas denúncias quelamentavelmente são reiteradas hoje. A significar que o Poder Públicoage de maneira irresponsável e não tem qualquer interesse, salvoalgumas exceções, de superar as dificuldades de ordem material queculminam por gerar situações que ofendem a dignidade pessoal doscondenados”, criticou Mello.  “Infelizmente o Poder Público vem semantendo cronicamente omisso no cumprimento de seus deveres jurídicos”,acrescentou.  Segundo o ministro, as normas previstas na Lei de Execução Penal(LEP), em geral, não têm saído do papel.Garantias básicas e o objetivo de ressocialização são desconsiderados.“No Brasil, a prática da Lei de Execução Penal tornou-se um meroexercício de ficção, porque ela impõe obrigações que o Poder Públicosimplesmente não cumpre. O Poder Público tornou-se infrator crônico daLEP e compromete assim direitos básicos do sentenciado”, ressaltouMello. O ministro constatou que, na prática, muitos presosbrasileiros cumprem penas sem qualquer embasamento legal. “São impostaspenas sequer previstas na legislação, como a promiscuidade, a agressãofísica, e isso é extremamente grave. O fato de ser condenado e privadode liberdade pela prática de crimes, não o [o preso] exclui do roldaqueles que têm acesso a direitos básicos e garantias fundamentais”,assinalou. Mello lembrou ainda que o quadro crítico dedegradação das unidades prisionais coloca o país permanentementeexposto a sofrer interpelações de organismos internacionais. “Sinto queo descumprimento reiterado pelo Poder Público, de obrigações impostaspor legislação plenamente constitucional, gera uma situaçãoabsolutamente desconfortável para o Estado. A República Federativa doBrasil poderá, sim, ser acionada perante a Corte Interamericana deDireitos Humanos”, alertou.  Ao defender a urgente necessidadede uma mudança de postura do Estado em relação ao sistemapenitenciário, o ministro avaliou as inspeções e mutirões carceráriospromovidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), desde o anopassado, como um primeiro passo, ainda que insuficiente, para uma novarealidade. “Mais de 2 mil pessoas que estavam sendoindevidamente mantidas presas  foram soltas graças à atuação dosmutirões carcerários. Isso é importante, um grande exemplo ao Estadobrasileiro, mas é preciso mais”, concluiu Mello.  O ministro crê que oMinistério Público tem hoje melhores condições para cobrar com rigor absoluto a responsabilidade do Estado na questão prisional, oque, segundo ele, já foi demonstrado pela interdição de algumas unidades que abrigamdetentos.