Familiares de usuários podem desenvolver distúrbios psicológicos

14/03/2009 - 10h33

Da Agência Brasil

Brasília - Os familiares precisam ser fortespara lidar com a dependência química de seus parentes.Muitas vezes, sentem-se culpados e têm medo. Entretanto, quandoagüentam tudo, do furto dentro da própria casa àspalavras e ações violentas, e abrem mão daprópria vida para cuidar do usuário de drogas, os paistambém podem desenvolver problemas psicológicos.Os dependentes químicos têma doença da adicção, termo em latim quesignifica “escravo de”. A família dos adictos, como sãochamados os usuários, podem desenvolver a co-dependência.De acordo com a psicóloga Neliane Figlie, o co-dependente nãotem controle sobre a própria atitude em relaçãoao parente dependente químico.“Éuma preocupação extrema com uma pessoa ou até umobjeto. Pode ser preocupação emocional ou social. Esseco-dependente pode, inclusive, desenvolver sintomas físicosmuito ligados à ansiedade e depressão”, afirma.Ilda, 51 anos, mãe de umusuário de 31 anos que começou a usar drogasaos 16 em Brasília, desenvolveu alguns sintomas físicosda co-dependência. “Eu tremia muito, não comiadireito. Minha irmã e minhas filhas me davam comida na boca.Dormia muito pouco. Ainda fico preocupada, tenho medo de que algumacoisa possa acontecer”, diz.Segundo ela, o filho jámendigou para sustentar o vício. “Ele já foi mendigo,dormiu na rua, mas, quando chegava em casa, gritava comigo, mandavacalar a boca. Dizia que eu era uma desgraça na vida dele, queera eu quem atrapalhava a vida dele porque não dava dinheiro.”A agressividade do rapaz, depoisde consumir a droga, era tão grande que ele chegou a provocarum aborto na ex-esposa. “Ele tinha muito ciúme dela. Um diaele chegou muito drogado, bateu nela que estava grávida ematou a criança”, afirma Ilda. Depois do episódio,ele ficou sem dar notícias à mãe por trêsanos.

Quandoo filho voltou a Brasília, enfrentou outro problema: opreconceito da família. “Os familiaresnão ajudam ninguém. Cheguei em casa um diadesses, e ele estava jogado na beira do muro, com febre, tremendo,vomitou. Se não fosse eu, naquela noite, ele tinha morrido”,lembra Ilda. “Foi nesse dia que ele pediu para sair da rua e irpara uma casa de recuperação.”Ilda não sabe se o filhoficará na clínica, pois ele já foi internadoquatro vezes e fugiu no meio do tratamento. “Ele pode entrar láhoje e sair amanhã, porque não é uma prisão.Ele vai de livre e espontânea vontade e pode sair de livre eespontânea vontade.”A internação é,para muitos pais, uma tentativa de resolver o problema. Porém,nem sempre é a saída para o dependente. JoséAntônio, 46 anos, e Daiane, 35, pais de um menino que seenvolveu com drogas aos 15 anos em Planaltina de Goiás, tambémenfrentaram essa situação.“Procuramosajuda, internamos numa clínica perto de Ceilândia[cidade-satélite do Distrito Federal]. Ele ficou unsdois meses e fugiu da clínica. Depois internamos em Goiânia.Ficou mais ou menos uns três meses. Fugiu também”,afirmou o pai.José Antônio acreditaque o filho, hoje com 18 anos, envolveu-se com o crack por causa dosamigos. “Creio que foi má companhia. Depois que ele entrounessa, eu soube que a maioria dos amigos dele mexia com isso”, diz.O sofrimento dos pais acaboulevando o adolescente a pedir ajuda. “Para uma mãe édifícil. Cinco noites sem dormir, do serviço para casa,sem comer. Não sabia onde ele estava, não sabia se eleestava bem, se estava dormindo, o que estava fazendo.”Ilda, José Antônio eDaiane frequentam grupos de ajuda a co-dependentes uma vez porsemana. Nas reuniões, compartilham histórias com outrosmembros e, assim, conseguem lidar com o problema da dependênciaquímica dos filhos. Para a psicóloga Neliana, tanto osgrupos, quanto a psicoterapia com profissionais especializados ajudamna recuperação dos familiares.

Osgrupos ajudam a pessoa a se desligar do dependente químico e apoder cuidar um pouco mais de si e muitas vezes da sua própriafamília”, diz.Márcia, 58 anos, mãede um ex-usuário de crack, é uma das coordenadoras doGrupo Amor Exigente em Brasília, que existe há 23 anos.Ela acredita que, para combater o avanço da droga, os paisdevem impor limites. “Nenhum pai e mãe recebe receita prontapara criar os filhos, mas é importante dar limites para osfilhos e para a gente mesmo”, afirma.