Para Stédile, aumento da concentração fundiária desmente tese de que governo faz reforma agrária

30/06/2007 - 18h43

Alana Gandra
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Para o economista João Pedro Stédile, um dos coordenadores nacionais do Movimento dos TrabalhadoresRurais Sem Terra(MST), números que mostram o aumento da concentração fundiária no Brasil desmentem o discurso do governo de que existe uma reforma agrária em curso no país.“Na prática, a concentração na propriedade daterra no Brasil continua aumentando. Ou seja,  está cada vez maisconcentrada na propriedade de menos gente. Isso significa que não háreforma agrária”, disse ele à Agência Brasil. Stédile participou esta semana do seminário “A Questão Agrária”, organizadopelo Centro de Estudos Celso Furtado, no Rio de Janeiro. De acordo com dados do Ministério do DesenvolvimentoAgrário(MDA), entre 2003 e 2006 foram assentadas mais de 380 milfamílias no Brasil. Stédile afirmou, ainda, que as ocupações de propriedades ruraisvão continuar no governo Lula. “Continuarão enquanto houver emqualquer região do Brasil um grande latifúndio improdutivo  e, de outrolado da cerca, um monte de pobre”, disse.O líder do MSTdisse que a realização  da verdadeira reforma agrária no Brasil passapela discussão do modelo agrícola como um todo e do processo de mudanças reais na estruturada propriedade. “Oque vem acontecendo no Brasil já há vários governos não é reformaagrária. É apenas uma política  de assentamento que se enquadra nosmanuais do Banco Mundial como compensação social", disse ele. "Para algunsagrupamentos de pobres que são teimosos, que lutam, que armamconflitos, o governo age e desapropria aqui e acolá, unicamente pararesolver um conflito social”, complementou Stédile. O economista afirmou ainda que o governo atual vem seguindo uma fórmula adotada já em outras administrações, para afirmar que está fazendo a reforma: o uso de terras públicas na Amazônia para assentar famílias que estão, na verdade, participando de projetos de colonização. “[Eles] descobriram ummétodo estatístico de se livrar das críticas, que  é fazer projetos decolonização na Amazônia. Então, transformaram projetos de colonizaçãocomo se fossem reforma agrária. E não é.”

Segundo Stédile, o modelo "clássico" de reforma agrária é inaplicável, hoje, no Brasil, porque estava ligado à idéia de desenvolvimento nacional. “O camponês vai passar a  comprar coisas da indústria nacional e vai vender para omercado interno. Isso ativa a economia”, exemplificou.

O problema é que, no Brasil, segundo Stédile, a burguesia abandonou o projeto nacional e optou pelo neoliberalismo internacionalista, o que se traduz no atual predomínio do agronegócio. Eleacredita, contudo, que não é impossível  voltarmos a ter no país umareforma agrária clássica, desde que haja força social capaz de resgataro processo de desenvolvimento econômico nacional. “Que é, inclusive, oque nós esperávamos do governo Lula”, disse.

Para o economista, uma reforma agrária "popular" consistiria em distribuir terras a partir da limitação do tamanho máximo da propriedade no país, mil hectares. “Começando pelas  propriedadesestrangeiras, vamos desapropriar todas, para estabelecer  justiçasocial”, propõe ele.

O projeto popular de reforma agrária pressupõe também, segundo Stédile, areorganização da produção agrícola voltada para o mercado interno e a combinação da reforma agrária com o desenvolvimento daagroindústria cooperativa. “É   assim que os camponeses e agricultoresvão poder se apropriar daquela renda a mais que o beneficiamento doproduto traz.”

Stédile destacou, ainda, a necessidade de mudança  namatriz tecnológica, introduzindo-se técnicas agrícolas da agroecologia,que respeitem o meio ambiente e produzam alimentos saudáveis, emsubstituição às tecnologias do agronegócio, que fazem “uso intensivode  máquina e veneno”, com  conseqüências negativas para os alimentose a saúde da população.

Oquinto elemento da reforma agrária popular está relacionado à educação.“Tão importante quanto dar um lote de  terra para um pobre é darescola, para que ele e seus filhos, através da escolarização, setransformem  em verdadeiros cidadãos”, finalizou.