Estados ameaçam deixar de fazer repasses da Lei Kandir aos exportadores

01/04/2006 - 9h25

Paulo Montoia e Bruno Bocchini
Repórteres da Agência Brasil

São Paulo – Oito secretários estaduais de Finanças, integrantes do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), decidiram pressionar deputados e senadores para ampliar a verba dedicada à Lei Kandir. A lei isenta do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) empresas exportadoras e prevê que o governo federal ressarça os estados pela isenção. A informação foi divulgada em nota à imprensa pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que organizou reunião com os secretários do Confaz nesta semana.

A Comissão Mista de Orçamento da Câmara dos Deputados concluiu nessa quinta-feira (30) a votação do relatório final da proposta orçamentária para 2006, mas o texto ainda precisa ser votado pelo plenário do Congresso.

Segundo a nota da Fiesp, governadores e empresários querem que a quantia destinada aos repasses da Lei Kandir seja, pelo menos, equivalente à do orçamento do ano passado (R$ 5,2 bilhões). Caso não consigam a mudança, os estados ameaçam deixar de realizar a compensação do imposto aos exportadores, diz a nota. O governo federal previu a transferência de R$ 3,4 bilhões no orçamento deste ano.

O impasse entre as secretarias da Fazenda dos estados e o Ministério da Fazenda quanto à devolução de impostos pagos sobre produtos e serviços para exportação (subsídios) foi um dos temas de entrevista dada à Agência Brasil (ABr) pela coordenadora dos secretários do Confaz, Lina Maria Vieira, secretária da Tributação do Rio Grande do Norte, no início deste mês.

De acordo com a coordenadora, os secretários do Confaz estão atuando diretamente no Congresso para inserir montantes de devolução no orçamento da União.

Agência Brasil - O que está ocorrendo? O governo federal está ampliando o prazo de repasse ou está negando a legitimidade da Lei Kandir, da renúncia fiscal?

Lina Maria Vieira - Se ele colocou zero no orçamento é porque ele não quer repassar nada, a intenção é não repassar nada. Nós estamos agora no Congresso e já conseguimos, através do relator Carlito Merss (PT-SC), a inserção de R$ 3,4 bilhões no orçamento deste ano, quer dizer, R$ 1 bilhão e 800 milhões a menos do que foi colocado em 2005.

ABr - Você poderia nos recuperar a que se refere esse repasse da Lei Kandir?

Lina Maria Vieira - A Lei Complementar 87 colocou a retirada da tributação de 13% de ICMS que incidia na exportação. Os estados concordaram em não tributar as exportações e o governo federal ressarciria na integralidade as perdas pelos 13% que deixariam de ser cobrados e mais os créditos decorrentes dos insumos utilizados para a produção dessas mercadorias a serem exportadas; e ainda os créditos dos ativos, os bens de capital. E, na verdade, eles nunca foram transferidos para os estados na sua integralidade.

ABr - Esses créditos são os impostos pagos...

Lina Maria Vieira - Sim. A sistemática é a seguinte: eu exporto camarões. Para criar e exportar eu (o empresário) preciso comprar ração e eu compro em Pernambuco, pois eu não tenho ração aqui no Rio Grande do Norte. A lei diz o seguinte: eu pago imposto incidente em Pernambuco e depois vou pedir o ressarcimento no estado por onde eu exporto. Nos maquinários também: eu compro o maquinário todo em São Paulo, instalo no Rio Grande do Norte e peço a devolução desse imposto que eu paguei a São Paulo do governo do Rio Grande do Norte. E isso nunca aconteceu.

ABr - Como essa lei foi aprovada na época? Ela foi resultado de uma pressão dos governos estaduais sobre o governo federal ou o contrário?

Lina Maria Vieira - Foram muitas discussões e no final - para sair a chancela dos secretários de Fazenda - nós ficamos uma madrugada inteira com o Kandir. E houve nesse momento, e antes dele com os governadores, um compromisso do governo federal de que os estados não precisariam ter receio, poderiam apoiar e aprovar aquela medida porque estaria dando condições ao Brasil de ser competitivo, de desonerar as exportações, que é tudo o que se fazia no resto do mundo, e os estados seriam ressarcidos por estarem colaborando com o governo federal para o equilíbrio da balança comercial.

Nós estamos inclusive terminando os estudos, porque o secretário-executivo declarou outro dia na imprensa que os Estados não tinham do que reclamar porque já estavam sendo contemplados com um aumento do repasse dos fundos (Fundo de Participação dos Estados e Fundo de Participação dos Municípios), que tinham crescido 5.9%, além dos convênios na área de saúde. E assim como o governo federal está fazendo estudos, através de seus corpos técnicos, para que a sociedade compreenda o tamanho do que a União vem repassando para os estados, nós também estamos pegando argumentos técnicos que rebatem essa colocação. Não em relação ao crescimento, que efetivamente houve. Houve um crescimento de receitas, alardeado pela Receita Federal, de quebra de todas as metas de arrecadação e isso reflete nos fundos de participação, a despeito de vários beneficios que o governo federal vem concedendo, fazendo cortesia com o chapéu alheio - como é a redução do IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados). Esses repasses efetivamente aumentaram, mas aumentaram também os encargos dos estados e municípios e de toda a sociedade: aumento de energia, de combustíveis, de materiais de escritório.