Yanomami defende tradição para resistir no território e alerta sobre malária

30/03/2006 - 9h26

Janaina Rocha
Enviada especial

Rio Quente (GO) - David Kopenawa, do povo Yanomami, se prepara para ser pajé. "Você estuda para melhorar, não? Eu também faço isso, para saber mais. Ser mais preparado. Me dedicar ao meu povo. Saber mais da minha tradição. Para aprender mais e ter mais força para manter a gente na aldeia".

David é a liderança yanomami "que anda na cidade" e está entre os cerca de 15 indígenas de sua etnia que fala português. "Não é todo yanomami que quer falar português. Ele quer preservar sua língua. O professor nosso ensina yanomami", afirma David, um dos participantes da 4ª Conferência Nacional da Saúde Indígena.

Hoje, eles são cerca de 12 mil em Roraima e Acre, mas há Yanomamis na Venezuela. "Nossa terra é boa, tem os rios, tem tudo. Estamos preocupados agora porque a malária voltou", conta. "Não quero mais perder yanomamis como antes. Tem esse risco, não morreu ninguém ainda. A saúde que a Funasa está fazendo paralisou o trabalho preventivo e sete aldeias têm malária".

David narra que os principais surtos da malária ocorreram nos anos 70, quando houve a construção de um trecho da estrada Perimetral Norte (1973 a 1976) em Roraima que "abriu o caminho para a doença". Depois, segundo ele, se agravou a partir de 1986, quando "Romero Jucá, presidente da Funai do presidente José Sarney autorizou a entrada de mais de 30 mil garimpeiros".

"Mais de 4 mil yanomamis morreram de malária, tuberculose, de assassinato. E depois de muita luta, de denúncia para fora do Brasil, a terra foi homologada em 1992. A doença ficou, mas depois vieram as organizações, que por serem não-governamentais, trabalharam na saúde e conseguiram acabar com a doença".

David diz que não reivindica dinheiro, mas ações de saúde. "Você sabe que ela [saúde] não pode parar, atrasar, errar. E ela está se paralisando há três anos". Em 15 de setembro do ano passado, os yanomamis ocuparam o prédio da Funasa em Boa Vista, em protesto.

"Nós conseguimos que as equipes fossem para as aldeias fazer o trabalho. Mas a saúde não pode ser assim. O branco precisa do instrumento para trabalhar. É assim que ele trabalha, faz exames com lâminas, usa remédios. O pajé cura as doenças da floresta. Aprende a fazer isso. Mas não cura, e já tentamos, a doença que vem da cidade".