Brasil trabalha para evitar a presença norte-americana na América do Sul, diz professor

18/01/2006 - 14h35

André Deak e Bianca Paiva
Da Agência Brasil

Brasília – A presença de militares norte-americanos na América do Sul pode causar instabilidade na região, o que não interessaria ao Brasil, afirma o estudioso Luiz Alberto Moniz Bandeira. No livro Formação do Império Americano, Bandeira desvenda a política externa norte-americana que envolve, muitas vezes, a desestabilização de países e a criação de conflitos através de agências de inteligência.

Moniz Bandeira tem os EUA como objeto de estudo há mais de 50 anos, e diz que o Brasil cumpre um papel "mediador" na região, entre os interesses de diversos países, como EUA e Venezuela. O professor aposentado da Universidade de Brasília que assumiu a função de adido cultural no Consulado Geral do Brasil em Frankfurt, na Alemanha, falou com à Agência Brasil sobre o papel do Brasil na política externa em relação aos EUA. Leia, abaixo, o principais trechos da entrevista:

Agência Brasil: Qual o interesse do Brasil na América do Sul?

Moniz Bandeira: Ao Brasil interessa a estabilidade da América do Sul. E também não interessa a presença americana na América do Sul.

ABr: Mas como é que se pode evitar isso?

Moniz Bandeira: Evitando a entrada das Farc [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia] aqui. O exército está preparado. Existe uma operação para prevenir uma eventual invasão da Amazônia pelos norte-americanos. Os norte-americanos precisam do Brasil, porque o Brasil é um país moderado, fator de moderação. E é claro que isso interessa ao Brasil, ser um fator de moderação na América do Sul, entre os EUA e a Venezuela, por exemplo.

ABr: Mas o Brasil não consegue evitar que países como o Paraguai, por exemplo, façam acordos bilaterais com o EUA.

Moniz Bandeira: Consegue. Se o acordo ferir o Mercosul, o Paraguai é expelido e o Brasil aplica sanções. Os países do Mercosul têm acordos que tem serem cumpridos. E eles não podem correr o risco de saírem do Mercosul, porque dependem do mercado brasileiro, que é mais certo do que o mercado norte-americano. O Uruguai vai vender carne para os Estados Unidos, ou arroz? É muito mais barato exportar para o Brasil do que para os EUA.

ABr: O Brasil teria como evitar a presença militar norte-americana em países que estão fora do Mercosul?

Moniz Bandeira: O Brasil não pode interferir na soberania dos outros países. O Brasil também não está competindo com os Estados Unidos, não é caso. No caso do Mercosul sim, aí é diferente porque há compromissos, tratados. Não pode fazer um acordo de livre comércio com o EUA e manter a tarifa dentro de uma união aduaneira em que há uma tarifa externa comum.

ABr: O presidente mexicano, Vicente Fox, já declarou ter interesse em levar seu país ao Mercosul. É possível?

Moniz Bandeira: É ridículo quando o presidente Fox diz que o México quer entrar no Mercosul. Essa é uma jogada a serviço do Estados Unidos, porque o México não pode compatibilizar a Alca [Área de Livre Comércio da América, proposta pelos EUA] com o Mercosul. Nem o Mercosul tem uma tarifa externa comum como o Nafta [sigla em inglês para o Acordo de Livre Comércio da América do Norte]. É um acordo entre Estados Unidos, México e Canadá, sem tarifas externas. É uma área de livre comércio pura e simplesmente, então não é possível compatibilizar os compromissos do Mercosul com os do Nafta. Conciliar o México com o Mercosul é impossível. Aliás, não é um país do sul, é um país do norte.