Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – O gosto pela arqueologia começou cedo para o professor Pedro Paulo Abreu Funari. A escolha da profissão, ainda na adolescência, foi influenciada pelo livro Deuses, Túmulos e Sábios, do escritor alemão C. W. Ceram. A ausência de cursos de graduação na área, obrigou-o a cursar história, na Universidade de São Paulo (USP), no início da década de 1980, e somente na pós-graduação pôde especializar-se no que realmente gostava.
“Até o fim do século passado, a arqueologia era praticamente apenas uma pós-graduação”, disse, ao avaliar que até o ano 2000, o número de arqueólogos no Brasil tenha oscilado entre 300 e 500 profissionais “no máximo”. Hoje, pós-doutor em arqueologia e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ele avalia que “deve haver mais de 3 mil arqueólogos graduados no país”.
O arqueólogo Eduardo Neves, da Universidade de São Paulo (USP), disse que até a década de 1990 os arqueólogos no país praticamente pagavam para trabalhar. “Às vezes não havia dinheiro para ir na esquina”, brinca. “Hoje, em compensação, nunca houve tantas pessoas vivendo de arqueologia. O desafio agora é definir um bom padrão para os egressos dos cursos de graduação e garantir que as pesquisas sejam feitas realmente por arqueólogos”.
Com as leis ambientais implementadas na década de 1990, a arqueologia tornou-se um dos quesitos para o licenciamento ambiental de obras de impacto ambiental, exigindo a presença de uma equipe de arqueologia. Em 2002, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) estabeleceu critérios para a condução dessas pesquisas.
O novo contexto jurídico provocou um aumento da demanda por arqueólogos para trabalhar em obras, como rodovias, metrôs e estádios. Entretanto, a profissão não é regulamentada e, para a categoria, esse é um problema, sobretudo no momento atual, devido às grandes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que vêm possibilitando a descoberta de toneladas de artefatos arqueológicos no Brasil.
Para a professora e pesquisadora Madu Gaspar, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a regulamentação da profissão de arqueologia evitará que pessoas despreparadas lidem com o patrimônio cultural brasileiro. “Você deixaria uma pessoa que não tem experiência restaurar o Theatro Municipal ou a Capela Sistina?”, questiona a arqueóloga.
Segundo Madu, todo arqueólogo deve ter uma perspectiva teórica, estratégicas metodológicas para produzir conhecimento sobre hábitos e costumes de um povo. Desta forma, a regulamentação permite que um profissional “incompetente” perca o direito de exercer a profissão. “Os arqueólogos não catam caquinhos, não catam pedrinhas. As pessoas não podem sair por aí pensando em metro quadrado, em coletar caquinho”, comenta.
Pesquisador do Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro, o arqueólogo Cláudio Prado de Mello lamenta que a falta de regulamentação e de regras claras para a contratação de profissionais na área de arqueologia esteja provocando a destruição de sítios arqueológicos inteiros.
“Hoje a arqueologia está contaminada com profissionais de outras áreas sem comprometimento com a ciência. Há empresas que estão oferecendo orçamentos de projetos pela metade do preço cobrado por uma equipe de arqueólogos e acabam ganhando o trabalho, mas não fazem bem ou às vezes não fazem nada”, disse Mello.
Para a diretora do Centro Nacional de Arqueologia (CNA), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rosana Najjar, a regulamentação da profissão favorece critérios mais claros e evita análises subjetivas do currículo na hora da escolha do profissional para um projeto. “Os cronogramas das obras atrasam, pois os relatórios não são aprovados e os projetos acabam retornando”, diz Rosana, que considera a mobilização dos profissionais e da sociedade fundamentais para pressionar a regulamentação da profissão de arqueólogo urgentemente.
“Será bom para quem contrata, para os arqueólogos, para quem está se formando, e assim todos poderão se adaptar com regras claras. O Iphan estará sempre apoiando esse movimento”, completou.
Edição: Fábio Massalli
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