Exposição do Médicos sem Fronteiras monta campo de refugiados em parque da zona sul do Rio

09/10/2013 - 17h25

Cristina Indio do Brasil
Repórter da Agência Brasil
 
Rio de janeiro - Uma área do Parque Lage, no Jardim Botânico, zona sul do Rio de Janeiro, foi transformada em um campo de refugiados pela organização Médicos sem Fronteiras (MSF). Até domingo (13) o público que visitar a exposição a céu aberto poderá receber informações sobre cuidados de saúde prestados a pessoas que são obrigadas a sair dos seus países devido a conflitos armados e perseguições por motivos políticos, raça, religião ou nacionalidade e passam a viver em acampamentos de refugiados. A exposição foi levada pela organização a outros países, mas é a primeira vez que é montada na América Latina.

Atualmente, de acordo com Médicos sem Fronteiras, baseado em dados do Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas  para Refugiados, cerca de 16,4 milhões de pessoas estão refugiadas em outros países e obtiveram status de refugiados ou aguardam decisão sobre solicitação de asilo.

Logo na entrada da exposição, o visitante recebe um cartão com o nome e a história de um refugiado. A ideia, segundo a diretora-geral do MSF do Brasil, Susana de Deus, é que o visitante assuma a identidade do refugiado e conheça os trabalhos feitos nos projetos. O público passa por réplicas das estruturas usadas nos campos do MSF para atendimento básico de saúde, vacinação, banheiros sem vasos sanitários, o sistema para distribuição de água, tratamento para crianças com desnutrição severa e o acolhimento feito pelos psicólogos.

“É para que o público se sinta na pele daquele refugiado e pelo que ele passou, podendo visualizar o tamanho da casa que uma família tem que ficar, o tipo de atendimento que recebe dentro de tendas, o tipo de banheiros que são fornecidos para cerca de 20 pessoas. Enfim saber o que acontece dentro de um campo e, ao mesmo tempo, poder escutar dos profissionais do Médicos sem Fronteiras o atendimento que a pessoa vai receber”, disse Suzana à Agência Brasil.
 
A bancária aposentada Rossana Sales aproveitou que a filha Luiza e a amigua dela de escola, Paloma Ferrara, não tinham aula e foi com as meninas de 11 anos à exposição. Ao levar as meninas, a ex-bancária queria que elas tivessem contato com uma realidade diferente do que costumam viver. “Crianças com um nível médio de vida às vezes reclamam de muita coisa. E por isso precisam ver o quanto outras pessoas sofrem por não ter nada”, disse.

Para Rossana também acabou sendo surpreendente. A personagem dela foi Fatuma Badel, uma mãe de 8 filhos que fugiu de Buale, na Somália, e foi viver no campo de Dadaab, no Quênia. O acampamento é o maior (abriga cerca de 407 mil refugiados) e mais antigo do mundo (completou 20 anos). Emocionada, ela disse que não conseguiu entrar na cabana improvisada com galhos de árvore que costuma ser usada temporariamente quando os refugiados chegam aos acampamentos e não há espaço nas tendas dos campos. “Como mãe eu vi uma pessoa que não conseguia dar nada para o filho comer e nem um teto. Não consegui entrar na cabana. É muito difícil e tem que improvisar enquanto não consegue ir para o acampamento e lá também ninguém sai porque não tem para onde ir”, comentou. 

Na visita Paloma lembrou que enfrentou um terremoto no Chile. Ela contou que muitos meses depois da experiência, apesar de estar em segurança em casa no Brasil, ainda tinha sensações de medo causadas pelas dificuldades que passou. “Depois do terremoto e de tudo balançando, começou a faltar comida. As pessoas invadiram os supermercados, não tinha água e a sopa era ruim, água com orégano. Era a única que tinha, aí tive que comer”, lembra.

Paloma disse que por ter passado por esta dificuldade entendeu as informações que recebeu na barraca de apoio psicológico. Nos campos, os refugiados passam por este trabalho com profissionais para superar traumas sofridos nos locais de onde fugiram.

A personagem que Luiza representou era uma criança da Mauritânia. A menina achou a experiência interessante, mas sentiu tristeza. “Eu gostei, mas achei muito triste. É uma situação que nunca passei na vida. Deve ser muito difícil viver assim, sem saúde, nada”, disse.

O administrador e empresário Marcos Leitão é um dos profissionais do MSF que dão informações ao público no acampamento no Parque Lage. Ele se interessou pelo trabalho da organização na época do terremoto do Haiti. Marcos divide o tempo durante o ano entre a empresa no interior de São Paulo e os projetos do MSF. O primeiro projeto que participou foi no Niger, na África.

“Já fui para oito deles [projetos] e quando volto cuido um pouco da saúde, porque às vezes ela está bem debilitada. A gente precisa de um tempo para  se cuidar e depois eu volto para o trabalho em um outro projeto”, explicou. 

A fisioterapeuta Letícia Pokorny também está na exposição. Ela chegou há pouco tempo de um acampamento na Síria. Durante seis semanas trabalhou com feridos por queimaduras provocadas por combustíveis usados para gerar energia. Letícia, que está no Médicos sem Fronteiras desde 2008, disse que apesar de ter passado por tantos projetos não deixa de se comover com algumas situações.

Com lágrimas nos olhos a fisioterapeuta lembrou da recuperação de um rapaz sírio, que tinha mais de 40% do corpo queimados e não fazia mais os movimentos da mão. Depois de muito exercício ele conseguiu começar a comer sozinho. A mãe, que no começo pediu para ter cuidado porque o filho sofria muitas dores, agradeceu quando viu o avanço do rapaz.

“Quando ela se deu conta de que ele estava conseguindo comer sozinho, sentar na cama e até caminhar, ela chorou de emoção. Primeiro ela chorou de tensão e medo e depois de emoção. E eu fui junto. Eu sempre choro”, disse emocionada. 

O Médicos sem Fronteiras, criada por médicos e jornalistas em 1971, é uma organização humanitária internacional que além de prestar cuidados de saúde, denuncia o sofrimento dos pacientes e os obstáculos que impedem as possibilidades de ajuda. Atualmente existem projetos em mais de 70 países com o envolvimento de cerca de 34 mil profissionais de todo o mundo. Entre outras áreas eles prestam assistência médica e participam de ações de logística, administrativa, finanças e comunicação.

Fábio Massalli

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