Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – As recentes obras de infraestrutura impulsionadas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e grandes eventos esportivos têm gerado enormes oportunidades e também desafios para uma área antes restrita ao meio acadêmico: a arqueologia.
As leis ambientais criadas há cerca de 20 anos, obrigando a presença de arqueólogos em obras de impacto ambiental e as centenas de obras de infraestrutura, como rodovias e hidrelétricas, aumentram a demanda por arqueólogos. Ao mesmo tempo, a realidade exige das autoridades planejamento e investimento para garantir que os milhares de artefatos encontrados sejam estudados e armazenados de forma apropriada.
Para o arqueólogo e historiador Reinaldo Tavares, o país precisa se preparar para as futuras descobertas que podem chegar às toneladas. “Como hoje são poucas as pesquisas, ainda conseguimos manter um nível de preservação bom, mas com o aumento no número de obras será necessário criar espaços para guardar os artefatos arqueológicos”.
Somente no Rio de Janeiro, descobertas arqueológicas importantes para a história do país foram feitas nos últimos anos. Na semana passada, no centro da capital, foi anunciada a descoberta de mais de 200 mil peças dos séculos 17, 18 e 19, com relíquias da família imperial e recipientes intactos.
Em 2011, na Gamboa, região portuária, foram achados artefatos e ossadas dos primeiros índios brasileiros, datados de 3 a 4 mil anos atrás. A abertura do terreno para a construção de 72 quilômetros da Arco Rodoviário Metropolitano do Rio de Janeiro permitiu a descoberta de cerca de 40 sítios arqueológicos na Baixada Fluminense. Segundo o Instituto de Arqueologia Brasileira (IAB), dentre as descobertas estão um sambaqui de 6 mil anos e uma aldeia indígena de 2 mil anos, além de um porto que existiu há 300 anos no Rio Iguaçu.
Embora os bens sejam da União, os artefatos podem ficar em comodato, ou sob a guarda de uma instituição ou entidade pública ou não-governamental. “Toneladas de achados arqueológicos encontrados pelo Brasil em obras de infraestrutura acabam em sua maioria em reservas técnicas de alguma instituição, sem ser estudada e muitas vezes até mal armazenada”, declarou Funari. A Agência Brasil entrou em contato com o Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, responsável pela guarda desses artefatos, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.
É o caso das milhares de peças encontradas no Cais do Valongo, também na zona portuária, onde sete contêineres guardavam centenas de milhares de artefatos entre louças, cachimbos, conchas, ossos e restos de metal pertencentes a negros escravos que chegaram aqui durante a primeira metade do século 19.
A pesquisadora que coordenou a primeira fase do estudo do Cais do Valongo, Tania Andrade Lima, disse que o problema do armazenamento adequado é discutido há pelo menos 20 anos em congressos de arqueologia e está se agravando, sobretudo no Rio, que virou um verdadeiro canteiro de obras por conta dos grandes eventos. “Isso é um problema para o Estado brasileiro, que precisa parar e refletir sobre o que fazer com esse material. Os bens arqueológicos pertencem à União, então é ela que tem que dar a solução para essa questão”.
Para o professor Funari, a solução é deixar a guarda das peças com a comunidade onde elas foram encontradas. “Com uma associação dos moradores, ou seja, tentar fazer com que o material arqueológico não fique muito distante da comunidade e que esteja em um local público acessível”, comentou.
Edição: Denise Griesinger
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